O Que Nos Conta Gildas
Por volta de 540 DC, um angustiado e obstinado monge bretão, de nome Gildas (se quiser saber um pouco de Gildas, clique no link), decidiu relatar os trágicos acontecimentos ocorridos alguns anos antes em sua ilha. A invasão de anglos e saxões havia praticamente destruído o pouco que restara da dominação romana naquela que se chamaria mais tarde England. Seu opúsculo, ‘De Excidio et Conquestu Britanniae’ – Sobre a Destruição e Conquista da Britain -, escrito na primeira metade do século VI, tornar-se-ia o único registro desse conturbado século, naquela região.
São Gildas nasceu por volta de 516 DC, possivelmente nas encostas do rio Clyde (atual Escócia). Seu pai, um nobre bretão de nome Cau (ou Nau), o enviou, ainda jovem, a um mosteiro em Glamorganshire, Walles, onde foi instruído por São Iltut. Gildas também é conhecido pelo cognome Badonicus, pois como ele mesmo disse em sua narrativa, nasceu no mesmo ano da famosa batalha do monte Badon, atualmente Bannesdown, próximo a Bath, Somersetshire.
Com o fim do império romano no início do século V DC, os Britons passaram a sofrer, com maior intensidade, o ataque de outros povos que pretendiam conquistar a ilha: Scots (Ireland), Picts (Scotland) e Anglo-Saxons (para conhecer algo sobre os Picts, Scots ou os Britons, clique nos links). Nesse momento, os bretões passaram a difundir histórias sobre a existência de um perfeito rei, Arthur, que retornaria da ilha de Avalon e retomaria o controle da Britain, expulsando os invasores. Assim surgiu o mito Arthuriano. A existência de Arthur não é atestada pela historiografia e, se de fato existiu, teria sido um chefe guerreiro – dux bellorum – vencedor de várias batalhas contra os saxões, a mais importante delas sendo a batalha do Monte Badon, já no século VI DC. Com a invasão normanda sobre a Britain, houve uma apropriação do mito Arthuriano, com os conquistadores criando uma nova interpretação sobre Arthur, como se descendentes fossem do rei bretão.
Arthur, então transformado em modelo de rei cristão, era agora portador de uma ambiguidade: possuía a espada Excalibur, forjada no Outro Mundo e o escudo com a imagem da Virgem Maria, símbolo da religião cristã. Num segundo momento, a figura de Arthur continuou como um mito, pois transformou em modelo de rei perfeito, espelho dos reis medievais, um rei que nunca existira.
As invasões na Bretanha foram realizadas por três ramos das tribos germânicas, com dialetos estreitamente similares. Os Anglos, provenientes do atual Slesvig, dominaram as áreas próximas ao Tâmisa (Nortúmbria, Mércia e Ânglia do Leste); os Saxões, que compunham o grupo proveniente da antiga Saxônia, do Elba e do Weser, dominaram a maior parte do sul da Inglaterra (Essex, Wessex, Sussex e Midlessex, respectivamente, Saxões do Leste, do Oeste, do Sul e do Centro); por fim, os Jutes, pequena tribo provavelmente originária da Jutlândia, do norte da Dinamarca, da Frísia e do baixo Reno, conquistaram o Kent, a ilha de Wight e a região do Hampshire (em torno do estuário do Solent). Em alguns casos, os grupos de invasores eram formados por membros mistos de tribos distintas, entre os Anglos, os Saxões e os Jutes.
São Gildas nasceu por volta de 516 DC, possivelmente nas encostas do rio Clyde (atual Escócia). Seu pai, um nobre bretão de nome Cau (ou Nau), o enviou, ainda jovem, a um mosteiro em Glamorganshire, Walles, onde foi instruído por São Iltut. Gildas também é conhecido pelo cognome Badonicus, pois como ele mesmo disse em sua narrativa, nasceu no mesmo ano da famosa batalha do monte Badon, atualmente Bannesdown, próximo a Bath, Somersetshire.
Com o fim do império romano no início do século V DC, os Britons passaram a sofrer, com maior intensidade, o ataque de outros povos que pretendiam conquistar a ilha: Scots (Ireland), Picts (Scotland) e Anglo-Saxons (para conhecer algo sobre os Picts, Scots ou os Britons, clique nos links). Nesse momento, os bretões passaram a difundir histórias sobre a existência de um perfeito rei, Arthur, que retornaria da ilha de Avalon e retomaria o controle da Britain, expulsando os invasores. Assim surgiu o mito Arthuriano. A existência de Arthur não é atestada pela historiografia e, se de fato existiu, teria sido um chefe guerreiro – dux bellorum – vencedor de várias batalhas contra os saxões, a mais importante delas sendo a batalha do Monte Badon, já no século VI DC. Com a invasão normanda sobre a Britain, houve uma apropriação do mito Arthuriano, com os conquistadores criando uma nova interpretação sobre Arthur, como se descendentes fossem do rei bretão.
Arthur, então transformado em modelo de rei cristão, era agora portador de uma ambiguidade: possuía a espada Excalibur, forjada no Outro Mundo e o escudo com a imagem da Virgem Maria, símbolo da religião cristã. Num segundo momento, a figura de Arthur continuou como um mito, pois transformou em modelo de rei perfeito, espelho dos reis medievais, um rei que nunca existira.
As invasões na Bretanha foram realizadas por três ramos das tribos germânicas, com dialetos estreitamente similares. Os Anglos, provenientes do atual Slesvig, dominaram as áreas próximas ao Tâmisa (Nortúmbria, Mércia e Ânglia do Leste); os Saxões, que compunham o grupo proveniente da antiga Saxônia, do Elba e do Weser, dominaram a maior parte do sul da Inglaterra (Essex, Wessex, Sussex e Midlessex, respectivamente, Saxões do Leste, do Oeste, do Sul e do Centro); por fim, os Jutes, pequena tribo provavelmente originária da Jutlândia, do norte da Dinamarca, da Frísia e do baixo Reno, conquistaram o Kent, a ilha de Wight e a região do Hampshire (em torno do estuário do Solent). Em alguns casos, os grupos de invasores eram formados por membros mistos de tribos distintas, entre os Anglos, os Saxões e os Jutes.
Pino Verde: origem dos Anglos. Pinos amarelos: origem dos Saxons. Pinos vermelhos: origem dos Jutes |
Como rotas para a invasão foram usados, principalmente, três estuários: o do Thames, do Wash e do Humber. Pelo Thames deu-se a invasão ligada ao nome do herói juto Hengist, que teria sido convidado pelo chefe bretão Vortigern para auxiliar os bretões a expulsar uma invasão de Picts e Scots. Este monarca lendário, usurpador do trono, teria reinado entre 425 e 450 e sido, segundo Gildas, um tirano e traidor dos bretões.
Rotas da Invasão Anglo-Saxon |
Os primeiros quarenta anos do século V viram os bretões romanizados entregues à própria sorte pelo Império Romano. Nesta nova conjuntura, anglos e saxões foram o principal instrumento da destruição da England romana. Durante os séculos V e VI, a ilha provavelmente foi um caos de tribos e reinos em constante pé de guerra, pois assistiu a uma segunda fase de conquista. Bretões e Celtas provavelmente não aceitaram a ocupação anglo-saxã. Parte dos bretões migrou para a Armórica, no continente, que passou a chamar-se Bretanha (norte da França). Os que permaneceram na ilha fugiram para o norte, para as montanhas do País de Gales, Cornualha, Escócia e Irlanda. Sua cultura praticamente retornou ao “barbarismo céltico” (para conhecer um pouco mais dos Celtas, clique nos links). No final do século V, a urbanização, a língua latina e o cristianismo estavam em franco declínio com a instalação dos saxões. Gildas nos conta que um grande ataque federado saxão teria ocorrido no século V, e que teria arruinado de vez as cidades romanas e devastado toda a região. Tal invasão é associada ao nome do saxão Aelle, senhor das terras ao sul do Humber, que Bede considera o primeiro Bretwalda (soberano da Inglaterra). O mesmo Aelle é associado ao senhor do Sussex (centro-sul), onde fundou um reino entre o bosque deserto da Anderida e o mar, entre os anos de 477 e 491.
Na luta contra os invasores, os bretões encontram um chefe originário da antiga população romanizada, Aurelius Ambrosius (falaremos mais sobre esse personagem, a seguir). Ele teria estabelecido uma brava resistência, que culminou com a famosa batalha no Monte Badon, por volta do ano 500, que teria sido vencida pelo semi-lendário Arthur (Artorius). Gildas descreve Aurelius como o vencedor da batalha do Monte Badon, sem sequer mencionar Arthur.
Já Nennius, em sua obra ‘História dos Bretões’, o apresenta como o principal herói do combate por ser um dux bellorum (chefe guerreiro) cristão. Arthur teria vencido sozinho novecentos e sessenta homens. Nessa narrativa, escrita pelo monge Nennius, há o acréscimo da imagem da Virgem Maria, sendo carregada sobre os ombros do Arthur: “A décima segunda batalha foi noMonte Badon, no qual caíram em um dia novecentos e sessenta homens de uma investida de Artur e ninguém os golpeou exceto o próprio Artur, e em todas as batalhas ele saiu como vencedor”.
Após tal luta teriam transcorrido quarenta e quatro anos de relativa paz. Durante esse período os bretões dividiram-se em cinco ou mais reinos tribais na região ocidental. Enquanto isso, os reinos e a instabilidade aumentavam entre os anglo-saxões do leste e os jutes, a partir de Kent, tomavam a ilha de Wight.
Conclusão Sobre o Advento Anglo-Saxon
É indefinido o número de colonizadores que de fato atravessaram o North Sea para a Britain, embora seja claro que eles acabaram por se juntar a substanciais populações indígenas sobreviventes que, em muitas áreas, aparentemente, formavam a maioria.
Da mesma forma que com a adoção dos traços culturais ‘celtic’ na Idade do Ferro e então a civilização greco-romana, o desenvolvimento da England anglo-saxon marca a adoção de uma cultura politicamente ascendente: a dos ‘bárbaros germânicos’.
Talvez a mudança tenha sido mais profunda do que nos casos precedentes, uma vez que a proporção dos intrusos foi provavelmente maior do que na Idade do Ferro ou nos tempos romanos e, crucialmente, a cultura e estruturas do poder romano-british parece ter passado por um colapso catastrófico – através do isolamento de Roma e do suporte dos exércitos imperiais – pouco tempo antes de uma substancial presença de ‘anglo-saxons’.
Em contraste com a Gaul, onde os francos se fundiram com uma sociedade gallo-romana intacta para criar uma cultura francesa baseada na latina, os novos reinos anglo-saxon na Britain, embora fundidos por populações indígenas e imigrantes, não representaram qualquer continuidade cultural; eles extraíram sua inspiração cultural e sua língua dominante, quase que inteiramente através do North Sea. Imigrantes e nativos misturados tornaram-se English.
Contrariamente à ideia tradicional de que a Britain possuía, originariamente, uma uniformidade ‘celtic’, que primeiro os Romanos e então os Saxon e outros invasores fenderam, na realidade a Britain sempre foi o lar de múltiplos povos. Embora sua população tenha mostrado uma forte continuidade biológica por milênios, as identidades que os ilhéus adotaram passaram por alterações profundas, muitas delas devido a contatos e conflitos através dos mares, não apenas como resultado de ocasionais, mas frequentemente, muito modestos aportes de recém-chegados.
Na luta contra os invasores, os bretões encontram um chefe originário da antiga população romanizada, Aurelius Ambrosius (falaremos mais sobre esse personagem, a seguir). Ele teria estabelecido uma brava resistência, que culminou com a famosa batalha no Monte Badon, por volta do ano 500, que teria sido vencida pelo semi-lendário Arthur (Artorius). Gildas descreve Aurelius como o vencedor da batalha do Monte Badon, sem sequer mencionar Arthur.
Já Nennius, em sua obra ‘História dos Bretões’, o apresenta como o principal herói do combate por ser um dux bellorum (chefe guerreiro) cristão. Arthur teria vencido sozinho novecentos e sessenta homens. Nessa narrativa, escrita pelo monge Nennius, há o acréscimo da imagem da Virgem Maria, sendo carregada sobre os ombros do Arthur: “A décima segunda batalha foi noMonte Badon, no qual caíram em um dia novecentos e sessenta homens de uma investida de Artur e ninguém os golpeou exceto o próprio Artur, e em todas as batalhas ele saiu como vencedor”.
Após tal luta teriam transcorrido quarenta e quatro anos de relativa paz. Durante esse período os bretões dividiram-se em cinco ou mais reinos tribais na região ocidental. Enquanto isso, os reinos e a instabilidade aumentavam entre os anglo-saxões do leste e os jutes, a partir de Kent, tomavam a ilha de Wight.
Conclusão Sobre o Advento Anglo-Saxon
É indefinido o número de colonizadores que de fato atravessaram o North Sea para a Britain, embora seja claro que eles acabaram por se juntar a substanciais populações indígenas sobreviventes que, em muitas áreas, aparentemente, formavam a maioria.
Da mesma forma que com a adoção dos traços culturais ‘celtic’ na Idade do Ferro e então a civilização greco-romana, o desenvolvimento da England anglo-saxon marca a adoção de uma cultura politicamente ascendente: a dos ‘bárbaros germânicos’.
Talvez a mudança tenha sido mais profunda do que nos casos precedentes, uma vez que a proporção dos intrusos foi provavelmente maior do que na Idade do Ferro ou nos tempos romanos e, crucialmente, a cultura e estruturas do poder romano-british parece ter passado por um colapso catastrófico – através do isolamento de Roma e do suporte dos exércitos imperiais – pouco tempo antes de uma substancial presença de ‘anglo-saxons’.
Em contraste com a Gaul, onde os francos se fundiram com uma sociedade gallo-romana intacta para criar uma cultura francesa baseada na latina, os novos reinos anglo-saxon na Britain, embora fundidos por populações indígenas e imigrantes, não representaram qualquer continuidade cultural; eles extraíram sua inspiração cultural e sua língua dominante, quase que inteiramente através do North Sea. Imigrantes e nativos misturados tornaram-se English.
Contrariamente à ideia tradicional de que a Britain possuía, originariamente, uma uniformidade ‘celtic’, que primeiro os Romanos e então os Saxon e outros invasores fenderam, na realidade a Britain sempre foi o lar de múltiplos povos. Embora sua população tenha mostrado uma forte continuidade biológica por milênios, as identidades que os ilhéus adotaram passaram por alterações profundas, muitas delas devido a contatos e conflitos através dos mares, não apenas como resultado de ocasionais, mas frequentemente, muito modestos aportes de recém-chegados.
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