Homenagem ao lendário herói ancestral dos ingleses que deu título a um dos considerados "Cem Maiores Livros do Mundo" e tido como o mais antigo escrito em "Old English".

segunda-feira, 9 de julho de 2012

THE GREAT AMERICAN SONGBOOK


INTRODUÇÃO

Recentemente, realizando uma pequena pesquisa sobre uma antiga melodia americana, deparei-me com a expressão “The Great American Songbook”. Já havia visto esse nome antes, várias vezes, e, intuitivamente, vislumbrado o seu significado, mas nunca me havia dado ao trabalho de buscar o seu real conceito ou expressão. Decidi então sair atrás do seu real significado e encontrei muito mais do que isso. Uma longínqua reminiscência, mansamente, começou a apoderar-se de mim e entendi muito da razão porque eu sempre senti uma espécie de saudade de uma vida que eu nunca vivi. Comecei a entender porque eu não conseguia ouvir certas músicas antigas americanas sem me lembrar de um dos locais onde morei, quando ainda criança, pelos idos de 1947: uma pequena “Pensão Viaduto”, localizada no centro da cidade de Porto Alegre, ao pé do Viaduto Otávio Rocha, na esquina da Avenida Borges de Medeiros com a rua Jerônimo Coelho. Se subíssemos a rua Jerônimo Coelho, dessa esquina, em direção à Praça da Matriz e Teatro São Pedro, passando ambos, encontraríamos o antigo Auditório Araújo Viana, palco de concertos sem fim, interpretados por bandas de todos os tipos e grandezas e franqueado a todos os que apreciavam a boa música.
Pois bem, numa época em que nem sequer se cogitava da ideia de um “mundo globalizado” e muito menos de um “You Tube”, as músicas vindas dos Estados Unidos demandavam um enorme tempo para chegar até nós e, muito possivelmente, cairiam no nosso conhecimento através da execução por orquestras ou bandas, antes de serem escutadas em discos de vinil de 78 r.p.m. Assim, no Auditório Araújo Viana, apesar de minha tenra idade, podia apreciar a execução daquelas maravilhosas canções americanas das décadas de 1930 e posteriores, tão apreciadas dos meus pais. E foi assim que, meio sem querer e sem saber, travei conhecimento com aquilo que viria a ser chamado, anos depois, “The Great American Songbook”. Mas vamos começar a história pelo seu início ...

O CONCEITO

Os anos que vão de 1920 a 1960 representaram um período único na história da música popular americana. Foi um período que viu o advento de um novo tipo de composição, totalmente original em alguns aspectos, mas enraizado nas estruturas simples da era “Tin Pan Alley”[1], que o havia precedido, e fortemente influenciado pela forma musical nascente conhecida como “Jazz” (e pelos precursores do jazz, “ragtime” e “blues”). Mormente composta para shows da Broadway e musicais de Hollywood, eleita e interpretada por cantores e músicos de todas as espécies, gravada em disco e transmitida pelo rádio, esse estilo de composição rapidamente ganhou as boas graças da maioria da audiência ouvinte. Essa era se encerraria com a chegada do “rock’n’roll” ao final da década de 1950 e com a “beatlemania”, poucos anos depois.
O “Great American Songbook” - em português, o “Grande Livro Americano de Canções”, que seguiremos chamando pelo seu título original, em inglês -, também conhecido por “Clássicos Populares”, é um conceito hipotético que busca representar as melhores canções americanas do período que vai de 1920 a 1960, principalmente dos teatros e palcos da Broadway e cenários dos musicais de Hollywood, que incluem um grande número de músicas de permanente popularidade. Tornou-se, e permanece até hoje, uma parte vital do repertório de músicos de “jazz”, que descrevem tais canções, simplesmente, como “padrões ou clássicos do jazz”.
Em um estudo do catálogo “American Popular Song: The Great Innovators, 1900-1950”, de 1972, o compositor e crítico Alec Wilder criou uma lista de artistas que ele cria pertencer ao “Great American Song Book”, bem como a sua classificação sobre o trabalho relativo deles. Ele próprio um compositor, a ênfase primária de Wilder recaiu sobre a análise dos compositores e seus esforços criativos.
Alec Wilder, iniciador do "Great American Songbook"
 Assim, Wilder devota capítulos inteiros a somente seis artistas: Jerome Kern, Irving Berlin, George Gershwin, Richard Rodgers, Cole Porter e Harold Arlen. Vincent Youmans e Arthur Schwartz repartem outro capítulo; Burton Lane, Hugh Martin e Vernon Duke compartilham outro. Wilder produz um capítulo que cobre os compositores que ele creu serem “Os Grandes Artífices”: Hoagy Camichael, Walter Donaldson, Harry Warren, Isham Jones, Jimmy McHugh, Duke Ellington, Fred Ahlert, Richard A. Whiting, Ray Noble, John Green, Rube Bloom and Jimmy Van Heusen. E conclui com um capítulo tipo caixa, de 67 páginas, intitulado “Relevantes Canções Inviduais: 1920 a 1950”, que inclui outras canções individuais por ele consideradas memoráveis.
O “Great American Songbook”, é um corpo “sui generis” de trabalhos musicais que, coletivamente, representam um dos reais tesouros culturais da América e ilustram o que há de melhor na composição popular, com letras vívidas e cultas, harmonias elusivas e melodias suntuosas, que surgiram para ocupar um lugar de destaque na cultura americana e ao redor do mundo.
A maioria das composições do “Great American Songbook” foi escrita para locais específicos em shows, filmes, atos peculiares ou revistas. Foram produto de compositores e letristas profissionais trabalhando em seus ofícios. Quando um roteiro chamava por uma exposição de certos humores ou sentimentos, os compositores atendiam. Nas mãos de um cantor competente como Billie Holiday ou Frank Sinatra, ou um músico como Louis Armstrong ou Miles Davis, os Clássicos servem como uma espécie de tesauro do espectro das emoções humanas, ainda provocando profunda e verdadeira reação até os dias de hoje.
É difícil dizer se compositores da segunda metade do século XX se ajustariam ao Great American Songbook. Para muitos, a sua era teria terminado com o advento do “rock-and-roll; Wider a encerra com o ano de 1950.

[1] Tin Pan Alley (Beco Tin Pan) é o nome dado ao agrupamento de compositores e editores de música de New York, que dominavam a música popular dos EUA, entre o final do século XIX e o início do século XX. Originalmente, o nome referia-se a um local específico: West 28th Street, entre a Quinta e a Sexta Avenidas, em Manhattan.

COMPOSITORES E CANÇÕES

Não existe uma lista definitiva de músicos e letristas cujos trabalhos constituem “The Great American Songbook”, nem é minha intenção aqui arrolar todos os que foram considerados. Apenas gostaria, como uma homenagem de reconhecimento, listar alguns dos compositores mais conhecidos, com suas canções mais ouvidas em todo mundo, para dar o devido crédito aos responsáveis por composições de cerca de um século atrás, que continuam sendo tocadas e admiradas, enquanto seus autores, na maior parte dos casos, permanecem no mais completo anonimato. Quem não ouviu ou cantarolou, incluindo gente das gerações mais jovens, algumas ou todas as melodias que seguem, com os seus respectivos autores e letristas, basta clicar para seguir o “link”, pois realmente vale à pena. E deliciem-se!

The Way You Look Tonight” (Jerome Kern & Dorothy Fields); “Long Ago and Far Away” (Jerome Kern & Ira Gershwin); “All the Things You Are” e “The Song Is You” (Jerome Kern & Oscar Hammerstein II); “Smoke Gets in Your Eyes” (Jerome Kern & Otto Harbach).
Jerome Kern, autor de "Smoke Gets in Your Eyes"


“Someone to Watch Over Me”, “’S Wonderful”, “Summertime”, “But Not ForMe”, “Embraceable You”, “The Man I Love”, “They Can't Take That Away from Me” (George Gershwin & Ira Gershwin).

“Younger than Springtime”, “If I Loved You”, “Some Enchanted Evening”, “My Favorite Things”, “Something Wonderful”, “Climb Every Mountain”, “Edelweiss”, “The Sound Of Music”, “A Wonderful Guy” (Richard Rodgers & Oscar Hammerstein).

Bewitched, Bothered and Bewildered”, “With A Song In My Heart”, “My Funny Valentine”, “Blue Moon”, “Manhattan”, “The Lady Is a Tramp”, “Lover”, “Isn't It Romantic?” (Richard Rodgers & Lorenz Hart).

Night and Day”, “I've Got You Under My Skin”, “Begin the Beguine”, “Let's Do It, Let's Fall in Love (Let's Do It)”, “Just One of Those Things”, “I Get a Kick Out of You”, “Ev'ry Time We Say Goodbye”, “In the Still of the Night”, “I Concentrate on You”, “You Do Something to Me” (Cole Porter).
George Gershwin morto em 1937 aos 38 anos

"How Deep Is the Ocean", "White Christmas", "Always", "Blue Skies", "Cheek to Cheek" (Irving Berlin).

Tea For Two” (Vincent Youmans & Irving Caesar).

Dancing in the Dark” (Arthur Schwartz and Howard Dietz).

Stardust” (Hoagy Carmichael & Mitchell Parish), “Georgia on My Mind” (Hoagy Carmichael & Stuart Gorrell), “The Nearness of You” (Hoagy Carmichael & Ned Washington).

My Blue Heaven” (Walter Donaldson & George A. Whiting), “Love Me Or Leave Me” (Walter Donaldson & Gus Kahn).

“At Last”, “The More I See You”, “You'll Never Know” (Harry Warren & Mack Gordon), “An Affair To Remember” (Harry Warren, Leo McCarey & Harold Adamson), “I Only Have Eyes For You” (Harry Warren & Al Dubin), “That's Amore” (Harry Warren & Jack Brooks).
Ira Gershwin, irmão parceiro de George

“It Had to Be You”, “I'll See You in My Dreams(Isham Jones & Gus Kahn).

“I'm in the Mood for Love”, “On the Sunny Side of the Street” (Jimmy McHugh & Dorothy Fields).

Beyond the Blue Horizon” (Richard A. Whiting, W. F. Harling & Leo Robin).

All the Way”, “Love Is The Tender Trap”, (Jimmy Van Heusen & Sammy Cahn), “Swinging on a Star”, (Jimmy Van Heusen & Johnny Burke).

Over the Rainbow” (Harold Arlen & E.Y. Harburg), “Stormy Weather”, “I've Got the World on a String”, “Let's Fall in Love” (Harold Arlen & Ted Koehler); “That Old Black Magic” (Harold Arlen & Johnny Mercer).
Richard Rodgers: "Ao Sul do Pacífico"

Paradise” (Nacio Herb Brown & Gordon Clifford), “Singin' in the Rain”, “Temptation” (Nacio Herb Brown & Arthur Freed).

I'll Be Seeing You” (Sammy Fain & Irving Kahal), “Love Is a Many-Splendored Thing”, “April Love”, “Tender is the Night” (Sammy Fain & P. F. Webster).

Bye Bye Blackbird” (Ray Henderson & Mort Dixon).




Who's Sorry Now?” (Ted Snyder, Harry Ruby & Bert Kalmar), “A Kiss to Build a Dream On” (Harry Ruby, Bert Kalmar & Oscar Hammerstein II).
Cole Porter: "Night and Day" e "Begin the Beguine"

“Let It Snow! Let It Snow! Let It Snow!” (Jule Styne & Sammy Cahn), “People” (Jule Styne & Bob Merrill).

“Happy Days Are Here Again” (Milton Ager & Jack Yellen).

Stella by Starlight”, “Love Letters”, “My Foolish Heart” (Victor Young & Ned Washington), “When I Fall in Love” (Victor Young & Edward Heyman), “Around theWorld” (Victor Young).

“Something's Gotta Give” (Johnny Mercer), “Moon River”, “Days of Wine and Roses” (Johnny Mercer & Henry Mancini), “Laura” (David Raksin & Johnny Mercer).

INTÉRPRETES

Desde a década de 1930, vários cantores têm gravado ou interpretado grandes partes do “Great American Songbook”. Lee Wiley esteve entre os primeiros a gravar coleções de um compositor ou equipe de composição específicos, começando por George Gershwin e Ira Gershwin (1939), seguido por Cole Porter (1940), Richard Rodgers e Lorenz Hart (1940), Harold Arlen (1943), Irving Berlin (1951) e Vincent Youmans (1951).
Irving Berlin: a imortal "White Christmas"
A popular e influente série “Songbook” de Ella Fitzgerald, editada pela Verve, nas décadas de 1950 e 1960, reuniu 252 canções do “Songbook”. Essas oito coleções prestaram tributo a Cole Porter (1956), Richard Rodgers e Lorenz Hart (1956), Duke Ellington (1957), Irving Berlin (1958), George Gershwin e Ira Gershwin (1959), Harold Arlen (1961), Jerome Kern (1963) e Johnny Mercer (1964).
Outros intérpretes influentes do “Great American Songbook”, mais antigos, incluem Fred Astaire, Tony Bennett, Rosemary Clooney, Nat King Cole, Perry Como, Bing Crosby, Vic Damone, Bobby Darin, Sammy Davis Jr., Doris Day, Billy Eckstine, Helen Forrest, Judy Garland, Eydie Gorme, Billie Holiday, Louis Armstrong, Lena Horne, Al Jolson, Frankie Laine, Julie London, Dean Martin, Johnny Mathis, Dinah Shore, Frank Sinatra, Jo Stafford, Barbra Streisand, Sarah Vaughan, Dinah Washington, Andy Williams e Nancy Wilson.
Pelas várias últimas décadas, tem havido um reflorescimento do “Songbook” por artistas contemporâneos. Em 1970, Ringo Starr lançou “Sentimental Journey”, um álbum de 12 clássicos arranjados por vários músicos. Em 1973, o cantor e compositor Harry Nilsson, vencedor do Grammy, lançou um álbum de 12 clássicos, muito bem recebido pela crítica, “A Little Touch of Schmilsson in the Night”, arranjado por Gordon Jenkins. O álbum foi reeditado em CD, em 1988, com um total de 18 clássicos cantados por Nilsson. No mesmo ano de 1973, Bryan Ferry, da famosa Roxy Music, lançou “These Foolish Things” e, subsequentemente, gravou vários álbuns do mesmo tipo. Em 1978, o cantor “country” Willie Nelson lançou uma coleção de clássicos populares compostos por notáveis como Hoagy Carmichael, George Gershwin e Irving Berlin, intitulado “Stardust”. Foi um lançamento considerado muito arriscado, à época, mas mostrou-se, talvez, seu álbum mais duradouro.
Victor Young: "Volta ao Mundo em 80 Dias"
Em 1983, a popular vocalista de rock, Linda Ronstadt lançou “What’s New”, o seu primeiro de uma trilogia de álbuns de clássicos. Sobre ele, escreveu Stephen Holden, do New York Times:
What’s New” não é o primeiro álbum de um cantor de rock a prestar tributo à idade de ouro do pop, mas é ... a melhor e mais séria tentativa para reabilitar uma ideia de pop que a Beatlemania e o marketing de massa dos LP’s de rock para teenagers desfizeram durante os anos 1960. Durante a década anterior à Beatlemania, a maioria dos grandes cantores de bandas e “crooners” das décadas de 1940 e 1950 codificaram meio século de clássicos do pop americano em um sem número de álbuns, muitos dos quais permanecem agora esgotados.”
Em 1991, Natalie Cole lançou um álbum de enorme sucesso chamado “Unforgettable ... with Love”, que desovou o “Top 40” sucesso “Unforgettable”, num dueto virtual com seu pai Nat King Cole. Os álbuns que se seguiram, como “Take a Look”, também tiveram muito sucesso.
Desde meados da década de 1980, vocalistas como Diana Krall, Michael Bublé, Michael Feinstein e outros menos conhecidos no Brasil, tornaram-se notáveis intérpretes do “Songbook” através de suas carreiras, particularmente o último, que tornou-se um dedicado patrocinador, arquivista, propagador e preservador do material, desde os últimos anos da década de 1970. Iniciando em 2002, Rod Stewart, de cujas interpretações sou particular admirador, tem devotado uma série de álbuns de estúdio a intérpretes do “Songbook”, tendo mesmo usado, explicitamente, o nome “Great American Singbook”.
Outros artistas, pop e de rock, que têm utilizado o trabalho, incluem Carly Simon, Betty Midler, Barry Manilow, Caetano Veloso, Queen Latifah e Robbie Williams. E, em 2012, Paul McCartney juntou-se a essa lista, com o álbum “Kisses of the Bottom".
Atualmente, o objetivo da Sociedade de Preservação do “Great American Songbook” é manter vivas essas canções na consciência pública, executando-as em todo o país e no mundo, com a mais alta integridade e interpretação musical de um elenco de cantores e músicos altamente capacitados, como embaixadores da música americana. Realmente, o mundo precisa muito desse tipo de música!

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