INTRODUÇÃO
Esta postagem é uma singela homenagem que faço à minha tia Ione, irmã de minha mãe, Mariazinha. A tia Ione foi a penúltima dos oito filhos da minha avó materna, Julieta, de quem herdou, certamente, os seus maravilhosos dotes musicais. Minha avó tocava oito instrumentos musicais; minha tia Ione dedicou-se, de corpo e alma, ao piano, mas como o absorveu! Apresentou o seu primeiro concerto aos seis anos de idade e para que pudesse corretamente alcançar as teclas do piano, colocaram-lhe uma pequena caixa de laranjas sobre a banqueta. E executou Chopin! E dele adquiriu a arte de enriquecer as peças executadas às custas da sua maravilhosa mão esquerda.
Esta postagem é uma singela homenagem que faço à minha tia Ione, irmã de minha mãe, Mariazinha. A tia Ione foi a penúltima dos oito filhos da minha avó materna, Julieta, de quem herdou, certamente, os seus maravilhosos dotes musicais. Minha avó tocava oito instrumentos musicais; minha tia Ione dedicou-se, de corpo e alma, ao piano, mas como o absorveu! Apresentou o seu primeiro concerto aos seis anos de idade e para que pudesse corretamente alcançar as teclas do piano, colocaram-lhe uma pequena caixa de laranjas sobre a banqueta. E executou Chopin! E dele adquiriu a arte de enriquecer as peças executadas às custas da sua maravilhosa mão esquerda.
Tia Ione amava, além de sua mãe a quem tanto se dedicou, seus sobrinhos, a quem tanto deu, seus irmãos com quem muitas alegrias repartiu, e muitas outras coisas, o piano, a Argentina, os argentinos e seus tangos maravilhosos. Viveu algum tempo no país platino, casou-se com argentino e conheceu e executou, como participante das mais famosas orquestras de tangos da Buenos Aires dos maravilhosos tempos, mais de 4.000 (quatro mil) tangos argentinos e não.
Mas esta postagem não é sobre a minha querida tia Ione, a quem eu dedicaria mais de um livro e não apenas essas poucas linhas, mas sobre um tango que, como milhões, amava, e executava como muito poucos. E é uma homenagem que lhe presto para que saiba, onde estiver, que entre as muitas coisas que ela me ensinou, também isso aprendi com ela.
A CONTROVÉRSIA DA AUTORIA DE "LA CUMPARSITA"
E sem mais delongas, para não causar muito suspense, vamos direto ao ponto: “La Cumparsita”, o mais famoso tango do mundo, não é argentino!
Mas esta postagem não é sobre a minha querida tia Ione, a quem eu dedicaria mais de um livro e não apenas essas poucas linhas, mas sobre um tango que, como milhões, amava, e executava como muito poucos. E é uma homenagem que lhe presto para que saiba, onde estiver, que entre as muitas coisas que ela me ensinou, também isso aprendi com ela.
A CONTROVÉRSIA DA AUTORIA DE "LA CUMPARSITA"
E sem mais delongas, para não causar muito suspense, vamos direto ao ponto: “La Cumparsita”, o mais famoso tango do mundo, não é argentino!
Gerardo M. Rodriguez, ciador de "La Cumparsita" |
O famoso tango "La Cumparsita" foi criado pelo músico uruguaio Gerardo Matos Rodriguez (1897–1948), apelidado “Becho”, no ano de 1917, no café "La Giralda", em Montevidéu, Uruguai. Seu pai era Emilio Matos, proprietário do clube noturno “Moulin Rouge”, de Montevidéu. Segundo o que se conta, Gerardo tomava conta do Clube e lá adquiriu a sua inclinação pela música. Gerardo tinha apenas 17 anos de idade à época e, naquele momento, não podia imaginar que estava criando uma das mais famosas composições da História do Tango. "La Cumparsita" é considerado o tango mais difundido pelo mundo – incluída a Argentina - e é uma das dez músicas mais executadas mundialmente, junto com “Garota de Ipanema” e outras. Por decreto presidencial de 2 de fevereiro de 1998, "La Cumparsita" é o Hino popular e cultural do Uruguai.
A partitura de "La Cumparsita" |
Sete anos após compor o tango, Gerardo morava em Paris e lá conheceu o famoso maestro e compositor argentino Francisco Canaro, recém chegado com sua orquestra descobrindo, por ele, que o seu tango era um sucesso tão grande em Paris quanto em Buenos Aires. Mas soube também que os letristas argentinos Enrique Maroni e Pascual Contursi haviam escrito letras para o tango e o renomeado para "Si Supieras" (Se soubesses). A Buenos Aires inteira escutava, dançava e exigia a letra do tango que, aparentemente, aparecia em todos os shows, gravações e transmissões pelas rádios. De Paris, "La Cumparsita" espalhou-se pelos quatro cantos do mundo tornando-se, daí para a frente, um sinônimo de Tango
Entretanto, Gerardo passaria os próximos vinte anos de sua vida entre salas de tribunal, tentando a restituição dos seus direitos como o autor de "La Cumparsita", o tango mais famoso do mundo. O primeiro julgamento ocorreu entre o compositor e as editoras Breyer e Ricordi, uma vez que a primeira havia vendido à segunda os direitos autorais. Após uma longa batalha jurídica, a Ricordi concordou em pagar os direitos de exploração a Gerardo. A segunda ação judicial foi contra Maroni e Contursi, que haviam adicionado, sem autorização do compositor, letra à melodia original. Gerardo também saiu vencedor nesta ação, baseado no fato de que ele teria cedido seus direitos da música quando ainda era menor, numa clara manobra legal, mas dura lex, sed lex. Em 1942 uma terceira ação judicial foi estabelecida para interromper a venda da gravação feita por Carlos Gardel. Esta, evidentemente, engendrou uma quarta ação, desta vez movida pelas viúvas de Maroni e Contursi, por perdas e danos e buscando o seu direito como autores da letra usada. As ações finalmente chegaram a um termo, graças à intervenção do Maestro Canaro que, como presidente da Sociedade Argentina de Autores e Compositores (SADAYC), foi solicitado pelos litigantes a resolver a questão. A 10 de setembro de 1948, Canaro emitiu um documento de compromisso legal contendo 8 pontos, os mais significativo dos quais eram os três primeiros que estabeleciam, o primeiro deles, que daquela data para a frente, os herdeiros de Contursi e Maroni receberiam 20% dos royalties devidos pelos direitos de execução. O segundo ponto estabelecia que os royalties de gravações e filmes seriam divididos de acordo com as regras da SADAYC, excetuados os casos em que somente a música fosse executado, quando seria aplicada a regra dos 20%. O terceiro ponto estabelecia que qualquer nova impressão da partitura da música incluiria as duas letras e nenhuma outra. Os demais pontos tinham a ver com as custas do julgamento, royalties recebidos até o início da ação, que a SADAYC se encarregaria de recolher os royalties, além de outras providências. E com isso, "La Cumparsita" livrou-se dos tribunais.
Não existe um consenso sobre quem foi o primeiro a gravar "La Cumparsita", mas é certo que o mais celebrado tango da história foi gravado pela primeira vez como o lado “B” de um disco. Uma das mais celebradas orquestras de tango da Argentina, em 1917, era a Orquestra de Alonso Minotto, que gravava para a Victor uma série de novos discos. O acordo previa pares de tangos, um em cada lado do disco; faltava um tango para um lado “B” e alguém sugeriu "La Cumparsita" como complemento. Assim, Alberto Alonso ao piano, Minotto Di Cicco ao bandônio, Juan Trocolli e Juan Jose Castellano nos violinos, registraram-se na história com tal orquestra. Claro que, como tudo o mais que ocorre na história do tango, há desacordo sobre essa versão. Outras fontes dizem que o próprio Roberto Firpo, pianista e compositor argentino, foi o primeiro a gravar "La Cumparsita" com a sua orquestra de tangos. De fato, no CD “La Cumparsita – Veinte Veces Inmortal”, o crédito é dado a Firpo como o primeiro a gravá-la. Segundo essa versão, a primeira gravação teria ocorrido nos estúdios de Max Glücksmann, em Buenos Aires, em novembro de 1916, com os seguintes components:
• Violinos: Agesilao Ferrazzano, Cayetano Puglisi
• Bandoneón: Juan Bautista Deambrogio (Bachicha)
• Piano e diração: Roberto Firpo
• Flauta: Alexander Michetti
Para os saudosistas que quiserem ouvir a gravação considerada como original de "La Cumparsita", de 1917, com a orquestra de tangos de Roberto Firpo, embora a reconhecida, mas justificada, má qualidade da gravação, basta seguir o link.
De qualquer forma, Minotto e Firpo parecem ter colaborado num novo arranjo que teriam posteriormente gravado juntos.
Considerando-se que o autor de "La Cumparsita" era apenas um pianista amador, os méritos técnicos da melodia têm sempre sido questionados. Gerardo havia composto apenas as duas primeiras partes e a primeira delas omitia um compasso claro. O próprio Firpo teve que adicionar uma terceira parte e a harmonia à primeira. Contudo, a composição teve uma trajetória tão formidável que aqueles que a criticam o fazem ao seu próprio risco. Julio de Caro, famoso maestro, compositor e líder de orquestra de tangos argentino, disse dela: “É uma bandeira que transcendeu fronteiras em todo o mundo, avançando de sua porta dourada para erigir-se como um dos símbolos da nossa música-dança”.
Entretanto, Gerardo passaria os próximos vinte anos de sua vida entre salas de tribunal, tentando a restituição dos seus direitos como o autor de "La Cumparsita", o tango mais famoso do mundo. O primeiro julgamento ocorreu entre o compositor e as editoras Breyer e Ricordi, uma vez que a primeira havia vendido à segunda os direitos autorais. Após uma longa batalha jurídica, a Ricordi concordou em pagar os direitos de exploração a Gerardo. A segunda ação judicial foi contra Maroni e Contursi, que haviam adicionado, sem autorização do compositor, letra à melodia original. Gerardo também saiu vencedor nesta ação, baseado no fato de que ele teria cedido seus direitos da música quando ainda era menor, numa clara manobra legal, mas dura lex, sed lex. Em 1942 uma terceira ação judicial foi estabelecida para interromper a venda da gravação feita por Carlos Gardel. Esta, evidentemente, engendrou uma quarta ação, desta vez movida pelas viúvas de Maroni e Contursi, por perdas e danos e buscando o seu direito como autores da letra usada. As ações finalmente chegaram a um termo, graças à intervenção do Maestro Canaro que, como presidente da Sociedade Argentina de Autores e Compositores (SADAYC), foi solicitado pelos litigantes a resolver a questão. A 10 de setembro de 1948, Canaro emitiu um documento de compromisso legal contendo 8 pontos, os mais significativo dos quais eram os três primeiros que estabeleciam, o primeiro deles, que daquela data para a frente, os herdeiros de Contursi e Maroni receberiam 20% dos royalties devidos pelos direitos de execução. O segundo ponto estabelecia que os royalties de gravações e filmes seriam divididos de acordo com as regras da SADAYC, excetuados os casos em que somente a música fosse executado, quando seria aplicada a regra dos 20%. O terceiro ponto estabelecia que qualquer nova impressão da partitura da música incluiria as duas letras e nenhuma outra. Os demais pontos tinham a ver com as custas do julgamento, royalties recebidos até o início da ação, que a SADAYC se encarregaria de recolher os royalties, além de outras providências. E com isso, "La Cumparsita" livrou-se dos tribunais.
Não existe um consenso sobre quem foi o primeiro a gravar "La Cumparsita", mas é certo que o mais celebrado tango da história foi gravado pela primeira vez como o lado “B” de um disco. Uma das mais celebradas orquestras de tango da Argentina, em 1917, era a Orquestra de Alonso Minotto, que gravava para a Victor uma série de novos discos. O acordo previa pares de tangos, um em cada lado do disco; faltava um tango para um lado “B” e alguém sugeriu "La Cumparsita" como complemento. Assim, Alberto Alonso ao piano, Minotto Di Cicco ao bandônio, Juan Trocolli e Juan Jose Castellano nos violinos, registraram-se na história com tal orquestra. Claro que, como tudo o mais que ocorre na história do tango, há desacordo sobre essa versão. Outras fontes dizem que o próprio Roberto Firpo, pianista e compositor argentino, foi o primeiro a gravar "La Cumparsita" com a sua orquestra de tangos. De fato, no CD “La Cumparsita – Veinte Veces Inmortal”, o crédito é dado a Firpo como o primeiro a gravá-la. Segundo essa versão, a primeira gravação teria ocorrido nos estúdios de Max Glücksmann, em Buenos Aires, em novembro de 1916, com os seguintes components:
• Violinos: Agesilao Ferrazzano, Cayetano Puglisi
• Bandoneón: Juan Bautista Deambrogio (Bachicha)
• Piano e diração: Roberto Firpo
• Flauta: Alexander Michetti
Para os saudosistas que quiserem ouvir a gravação considerada como original de "La Cumparsita", de 1917, com a orquestra de tangos de Roberto Firpo, embora a reconhecida, mas justificada, má qualidade da gravação, basta seguir o link.
De qualquer forma, Minotto e Firpo parecem ter colaborado num novo arranjo que teriam posteriormente gravado juntos.
Considerando-se que o autor de "La Cumparsita" era apenas um pianista amador, os méritos técnicos da melodia têm sempre sido questionados. Gerardo havia composto apenas as duas primeiras partes e a primeira delas omitia um compasso claro. O próprio Firpo teve que adicionar uma terceira parte e a harmonia à primeira. Contudo, a composição teve uma trajetória tão formidável que aqueles que a criticam o fazem ao seu próprio risco. Julio de Caro, famoso maestro, compositor e líder de orquestra de tangos argentino, disse dela: “É uma bandeira que transcendeu fronteiras em todo o mundo, avançando de sua porta dourada para erigir-se como um dos símbolos da nossa música-dança”.
Astor Piazzola, na época componente da orquestra do argentino Aníbal Troilo, foi mais incisivo: “É a coisinha mais assustadora deste mundo (referindo-se aos banais acordes Ré-Dó-Lá-Fá)! Contudo, se você adicionar uma nota baixa para enriquecê-la e derramar sobre ela a melodia, pode-se criar um contraponto que elevará a melodia convencional. É como uma pessoa feia que se veste bem, melhora sua aparência. É assim que "La Cumparsita" é melhorada, com boas roupas”.
Francisco Canaro possuía opinião diversa e dizia: '“La Cumparsita" tem a virtude peculiar de que sua estrutura musical se presta maravilhosamente bem para ser embelezada por orquestrações de alto nível, tudo se lhe ajustando muito bem: contra-melodias para violinos, variações para bandoneóns e outros instrumentos importantes, além de outros efeitos musicais atrativos que arranjadores e diretores de orquestras usam com vantagem para exibir seus próprios equipamentos. Cada líder de uma orquestra de tangos tem seu próprio arranjo, sua própria interpretação do celebrado tango.' Para escutar a famosa gravação de "La Cumparsita", por Francisco Canaro e sua grande Orquestra, e apreciar o famoso tango dançado, basta seguir o link para o clip.
Francisco Canaro possuía opinião diversa e dizia: '“La Cumparsita" tem a virtude peculiar de que sua estrutura musical se presta maravilhosamente bem para ser embelezada por orquestrações de alto nível, tudo se lhe ajustando muito bem: contra-melodias para violinos, variações para bandoneóns e outros instrumentos importantes, além de outros efeitos musicais atrativos que arranjadores e diretores de orquestras usam com vantagem para exibir seus próprios equipamentos. Cada líder de uma orquestra de tangos tem seu próprio arranjo, sua própria interpretação do celebrado tango.' Para escutar a famosa gravação de "La Cumparsita", por Francisco Canaro e sua grande Orquestra, e apreciar o famoso tango dançado, basta seguir o link para o clip.
Na segunda e última parte dessa postagem, "A História de 'La Cumparsita'".
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