Homenagem ao lendário herói ancestral dos ingleses que deu título a um dos considerados "Cem Maiores Livros do Mundo" e tido como o mais antigo escrito em "Old English".

domingo, 3 de fevereiro de 2019

MINHA PEQUENA HOMENAGEM A MICHEL LEGRAND



O Mundo da música encontra-se novamente de luto: morreu em Paris, no dia 26 de janeiro de 2019, aos 86 anos de idade, o fantástico compositor Michel Legrand. Mais um insubstituível músico que nos abandona, deixando mais vazio o mundo da música, sem qualquer chance de substituição. 
Michel Legrand, com 84 anos no Festival de Cannes de 2017
Michel Legrand nascido em 24 de fevereiro de 1932, em Paris, no bairro de Ménilmontant, cantado por Charles Trenet, autor de “La Mer”, foi um músico, compositor, cantor, produtor e arranjador francês, cuja carreira de compositor para o cinema, por mais de meio século, granjeou-lhe três Oscars, cinco Grammys, duas Palmas de Ouro, um Bafta (British Academy of Film and Television Arts, entidade independente que apoia, desenvolve e promove as formas artísticas de imagem no Reino Unido) e um Globo de Ouro.
Seus pais, o compositor Raymond Legrand (1908-1974) e Marcelle Der Mikaëlian (irmã do orquestrador Jacques Hélian, de origem armênia) se divorciaram quando Michel tinha três anos. Estudou piano e composição no “Conservatoire de Paris” de 1942 a 1949, principalmente nas classes de Lucette Descaves, Henri Challan e Nadia Boulanger. Apaixonou-se pelo jazz após assistir, em 1947, a um concerto de Dizzy Gillespie (trompetista, compositor-letrista-intérprete e orquestrador de jazz americano, considerado, com Miles Davis e Louis Armstrong, um dos mais importantes trompetistas da história do jazz), com o qual iria colaborar alguns anos mais tarde escrevendo, em 1952, os arranjos para a orquestra de cordas que acompanhava o trompetista em seus concertos europeus.
Em 1951, com apenas 19 anos, escreve os arranjos para a orquestra de seu pai, que o introduz no universo da canção de variedades e começa uma carreira de acompanhador e arranjador para Jacqueline François, Henry Salvador, Catherine Sauvage e Zizi Jeanmaire. Maurice Chevalier o contrata como diretor musical.
Em 1954, por demanda da empresa americana Columbia e graças a Jacques Canetti, produtor musical da Philips, que passou um acordo com esta firma, ele oferece releituras jazzísticas de músicas simples francesas. O álbum “I Love Paris” é um enorme sucesso com oito milhões de exemplares vendidos e o reconhecimento de Legrand se faz internacional. Influenciado por Stan Kenton, ele leva a bom termo uma breve carreira de jazzman como líder: “Holiday in Rome”, em 1955, “Michel Legrand Plays Cole Porter”, em 1957, “Legrand in Rio”, em 1958. Para “Legrand Jazz”, ele grava em New York, em 1958, com Miles Davis, John Coltrane e Bill Evans, tornando-se um dos primeiros europeus a trabalhar com os mestres do jazz moderno. 
O jovem Legrand e seu amor pelo jazz.
Em 1966 faz os arranjos da canção internacional “C’est ci bon”, de Henri Betti e André Hornez, para o álbum de Barbra Streisand “Color me Barbra”.
Algumas composições de Michel Legrand como “La Valse des Lilas” (em inglês “Once upon a Summer Time”), a “Chanson de Maxence” (“You must believe in Spring”), ou ainda o tema principal da trilha sonora original do filme “Un été 42” (“Verão de 42”) (“The Summer Knows”), são resultado de padrões de jazz.
A par de sua paixão pela música de jazz, a virada dos anos 1960 e o surgimento da nouvelle vague vão definitivamente ancorar Michel Legrand no mundo da música de filmes. Ele trabalha para Agnès Varda (“Cléo de 5 a 7”, em 1962), Jean-Luc Godard (“Une femme est une femme”, em 1961, “Vivre sa vie”, em 1962 e “Bande à part”, em 1964) e sobretudo Jacques Demy (“Lola”, em 1961, “Les parapluies de Cherbourg”, em 1964, “Les demoiselles de Rochefort”, em 1967, “Peau d’âne”, em 1970) com o qual ele inventa a comédia musical à francesa. Dessa forma, “Les Parapluies de Cherbourg” é um filme cantado continuamente, onde os diálogos são inspirados pela música, totalmente inovador para a época. 
Michel Legrand compondo.
Em 1966, após ter sido indicado para dois Oscars por seu trabalho em “Les Parapluies de Cherbourg”, ele decide tentar sua sorte em Hollywood, instalando-se em Los Angeles. Sua amizade com Quincy Jones e Henry Mancini o ajuda muito a fazer um lugar no meio altamente concorrido e lhe permite encontrar os letristas Alan e Marilyn Bergman. Em 1968 ele compõe a trilha sonora original de “L’Affaire Thomas Crown”, de Norman Jewison e, particularmente, a canção “The Windmills of your Mind” (“Les Moulins de Mon Coeur”), para a qual lhe será entregue, no ano seguinte, o Oscar de melhor canção original.
Em 1969, Legrand escreve a trilha sonora para o filme “The Happy Ending”. Sua principal canção, “What are you doing for the rest of your life”, com letra de Alan e Marilyn Bergman e interpretada por Michael Dees, foi indicada para o Oscar da Academia como melhor canção original, sendo derrotada por “Raindrops keep falling on my head”. Com a mesma música, Legrand venceu o Grammy Award de 1972 para melhor arranjo instrumental no acompanhamento de vocalista, para uma versão interpretada por Sarah Vaughan. Além da versão recebedora de prêmios, a canção foi interpretada por vários artistas, destacando-se a execução de Barbra Streisand, Johnny Mathis, Shirley Bassey e Frank Sinatra.
Dois anos mais tarde, ele recebe o Oscar de melhor música de filme pelo filme “Un Été 42” (“Verão de 1942”), de Robert Mulligan (1971), cuja canção “The Summer Knows”, por Barbra Streisand, alcança o sucesso. Entre 1971 e 1975, nomeado vinte e sete vezes ao “Grammy Award”, ele conquista cinco prêmios. Em 1982, Michele Legrand compôs “How do you keep the music playing?”, com letra de Alan e Marilyn Bergman, para a trilha sonora do filme “Best Friends”, quando ela foi introduzida por James Ingram e Patti Austin. O filme foi estrelado por Burt Reynolds e Goldie Hawn e a música foi uma das três com letra de Alan e Marilyn Bergman indicadas para o Oscar de melhor canção original da 55ª realização da Academy Awards. Obtém um terceiro Oscar por “Yentl”, de Barbra Streisand, em 1983. No mesmo ano ele compõe a trilha sonora de “Jamais plus Jamais”, de Irvin Kershner, último James Bond com Sean Connery, cuja canção título (“Never Say Never Again”) é escrita por Alan e Marilyn Bergman. Ao todo, Michele Legrand compôs mais de duzentas músicas para o cinema e a televisão. 
A descontração de Michel Legrand
Gravou com várias personagens da canção em gêneros variados: Catherine Sauvage, Henri Salvador, Charles Aznavour, Zizi Jeanmarie, Frank Sinatra, Sarah Vaughan, Jack Jones, Ella Fitzgerald, Perry Como, Lena Horne, Kiri Te Kanawa, James Ingram, Johnny Mathis, Barbra Streisand, Frankie Laine, Nana Mouskouri e Mireille Mathieu, para citar alguns.
Foi casado com Christine Bouchard e depois com Isabelle Rondon. Separado de sua última companhia, a harpista Catherine Michel, em 2013, desposou, em 16 de setembro de 2014, a comediante Macha Méril, com quem já tinha tido uma ligação quarenta anos antes. Foi pai de Dominique Rageys (nascida em 1952), fundadora, com seu marido, do rallye “Marrocos Clássico”, de Hervé Legrand (1959), pianista e compositor, de Benjamin Legrand (1962), cantor, de Eugénie Angot (1970), cavalheiro de nível internacional.
Em 5 de dezembro de 2007, a faculdade de música da Universidade de Montréal, Quebec, lhe outorgou um doutorado honorífico para sublinhar o caráter excepcional de sua carreira. Em 2009, ao completar cinquenta anos de carreira, a “Cinémathèque Française”, em Paris, lhe rendeu uma homenagem, com a projeção da maior parte dos filmes com trilha sonora escrita por Michel Legrand. Na mesma ocasião, deu três concertos na sala Plevel e múltiplas entrevistas à rádio e televisão.
Em 2013 co-escreveu, com Stéphane Lerouge, especialista de música para cinema, sua primeira autobiografia “Nada é grave nos agudos”, onde ele evoca de maneira livre e sem cronologia, sua formação, encontros, escolhas de percurso, seu gosto pela música ao plural.
2014 viu Michel Legrand ainda realizando 60 concertos por todo o globo. Seu novo balé, coreografado por John Neumeier, do Hamburg Ballet, abriu para um fenomenal sucesso em Costa Mesa, California, como um prelúdio para um giro pelos Estados Unidos. Seu novo concerto para harpa iniciou na Filadélfia, em fevereiro de 2014 e sua nova ópera, “Dreyfus” iniciou na Ópera de Nice em maio de 2014. Para coincidir com o 50º aniversário de “Les Parapluies de Cherbourg”, Michel Legrand conduziu sua versão para oratório no teatro Châtelet. Foram cinco excepcionais apresentações a preceder uma excursão pelo mundo.
Em março de 2014 Legrand escreveu uma maravilhosa trilha sonora para o novo filme de Xavier Beauvois “Love is a Perfect Crime”. O filme foi apresentado no Festival de Cannes em maio de 2014 e indicado para dois outros dois festivais. Durante 2014 ele realizou mais de 50 concertos na França, Irlanda, Japão, Argentina, Brasil, Rússia, EUA, Dinamarca, Holanda e Bélgica.
2015 foi um ano bastante ocupado, com concertos ao redor do mundo, incluindo um giro pela América do Sul com o soprano Natalie Dessay e a gravação de um novo álbum “Michel com Amigos” lançado em novembro daquele ano. Em janeiro de 2016 Legrand fez uma importante apresentação com uma Orquestra e os amigos tenor Vincent Niclo, sopranos Natalie Dessay e Maurane, no Palais de Congrès, Paris, no concerto intitulado “Michel Legrand convida Vincent Niclo”. Em maio de 2016 Legrand esteve em Kalamazoo, Michigan, para receber um doutorado honorário da Western Michigan University, como parte de sua primeira visita ao Irving Saint Gilmore International Keyboard Festival. Ainda em Kalamazoo, Legrand realizou uma Première Mundial Oficial, Concerto para Piano e Orquestra com a Kalamazoo Symphony Orchestra.
O verão de 2016 foi preenchido com Festivais na Argentina e França; o ano continuaria extremamente ocupado com concertos por toda a Europa. O ano de 2017 foi rico, com a excursão do aniversário de 85 anos de Michel Legrand ao redor do mundo e o lançamento de dois preciosos álbuns. 
O maduro Legrand em toda a sua jovialidade.
Michel Legrand é o único compositor europeu com uma filmografia que inclui nomes como Orson Welles, Marcel Carné, Clint Eastwood, Norman Jewison, Louis Malle, Andrzej Wajda, Richard Lester, Claude Lelouch, para nomear alguns poucos.

“Desde que era um menino, minha ambição sempre foi viver completamente cercado pela música. Meu sonho é não perder nada. É por isso que nunca me assentei numa única disciplina musical. Adoro executar, conduzir, cantar e escrever, em todos os estilos. Assim, ponho minha mão em tudo – não apenas um pouco de tudo. Muito pelo contrário. Faço todas essas atividades de uma vez, seriamente, sinceramente e com profunda dedicação.”

Era assim que Michel Legrand descrevia seu status, como um músico atípico e compulsivo que não podia ser confinado; ou antes, seus vários status como compositor, maestro, pianista, cantor, escritor e produtor. Derrubando as barreiras entre o jazz, música clássica e música mais leve, ele sentia-se em casa em qualquer situação musical.

“Eu queria ter mais percepção daquilo que eu posso fazer, mesmo que isso signifique ir longe demais. Se eu quero que meu navio continue singrando as ondas, devo tentar novas velas e ver onde elas me levarão”

É difícil selecionar músicas de um compositor que criou trilhas sonoras para mais de duzentos filmes! Muito mais se considerarmos o espaço físico de uma postagem. Por isso, fio-me em meu gosto pessoal (e os leitores, que se sujeitem a ele), para colocar uma pequeníssima amostra, em ordem cronológica, do que produziu o grande Michel Legrand.
Iniciamos, portanto, com “Les Parapluies de Cherbourg” (“I will wait for you”), uma das canções da trilha sonora do filme musical romântico dramático de mesmo nome (no Brasil, com o nome de “Os Guarda-Chuvas do Amor”), de 1964, com a minha musa do cinema francesa, Catherine Deneuve e Nino Castelnuovo. Esta música, transformou-se num padrão popular mundial, principalmente devido à adaptação para o inglês por Norman Gimbel (“I will wait for you”), que foi inicialmente gravada por Nana Mouskouri e, posteriormente, por cantores famosos, entre eles Frank Sinatra, Tony Bennett, Louis Armstrong, Liza Minelli e Connie Francis, além de várias gravações instrumentais. Vamos apresentar a gravação em que, no filme, os dois atores principais cantam dublados por Danielle Licari e José Bartel.
A seguir, apresentamos “Les Moulins de Mon Coeur”, uma das canções da trilha sonora do filme “L’Affaire Thomas Crown”, posteriormente vertido para o inglês, com o nome “The Windmills of you Mind”, com o qual conquistou um Oscar da Academia. E para interpretá-la, nada mais, nada menos do que o seu autor, Michel Legrand.
A seguir uma das minhas preferidas de Michel Legrand, “What are you doing the rest of your life”, cantada pelo meu intérprete masculino favorito, Johnny Mathis, numa interpretação notável. A letra do casal Bergman é extraordinária e por essa razão me permito aqui introduzi-la para que meus leitores possam apreciá-la, com a sua tradução em português.
E chegamos à minha grande favorita das composições de Michel Legrand, “The Summer Knows” que, conforme comentado acima, é a melodia principal da trilha sonora para o filme “Un Été 42” (“Verão de 1942”), em inglês “Summer of ‘42”, de 1971, pela qual foi agraciado com mais um Oscar da Academia. As escolhas para o intérprete são, novamente, inúmeras, mas como ainda não apresentei a minha preferida feminina, eu faço questão de trazer aos meus leitores a fantástica Barbra Streisand, interpretando “The Summer Knows”. A letra de Alan e Marilyn Bergman é novamente primorosa e me permito também apresentá-la aos meus leitores para que com eles possam acompanhar a interpretação da melodia. E posto que no filme, a melodia é executada instrumentalmente, abuso da paciência dos meus leitores, trazendo para essa maravilha uma interpretação instrumental com a orquestra do compositor e com o piano maravilhoso do próprio Michel Legrand
“A melodia é uma senhora à qual eu sempre serei fiel!”
E para encerrar, de 1982, “How do you keep the music playing?” que, além de ter sido indicada para o Oscar da Academia, teve vida própria como um sucesso popular mundial, interpretada por luminares como Johnny Mathis, Tony Bennett, Frank Sinatra, Barbra Streisand, Celine Dion e Shirley Bassey, entre muitos outros. Mas, em respeito ao próprio compositor, vou apresentá-la na interpretação dos que a introduziram no filme para o qual ela foi composta: James Ingram e Patti Austin.
Espero que com a curtíssima amostra, os meus leitores possam ter uma tênue ideia de quem foi Michel Legrand, mais um gênio da música, que nos abandona agora, para prosseguir com seus concertos, a partir de então, à plateia celeste. E com isso eu me despeço dele ...

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