VI – COLAPSO E HARAPPIANA FINAL
Em
torno de 1800 AC, sinais de um declínio gradual começaram a surgir e cerca de
1700 AC, a maioria das cidades foi abandonada. A escrita começou a desaparecer,
pesos e medidas padronizadas, usadas no comércio e para fins de taxação caíram
em desuso e a conexão com o Oriente Médio foi interrompida. As razões para tal declínio
não são totalmente claras.
Localização das Montanhas Hindu Kush, entrada dos "arianos" |
Em
1953 surgiu a teoria de que o declínio da CVI fora causado pela invasão de uma
tribo Indo-Europeia da Ásia Central, os “arianos”, criadores de gado, iniciada
cerca de 1500 AC. Os arianos teriam atravessado as montanhas Hindu Kush –
cadeia de montanhas do Paquistão com 800 km de comprimento entre o Afeganistão
Central e o norte do Paquistão - e entrado em contato com a civilização do Vale do Indo, numa grande migração,
vista como uma invasão, razão maior para o seu colapso. Como evidência, foi
citado um grupo de 37 esqueletos encontrados em várias partes de Mohenjo-Daro,
e passagens nos Vedas que fazem referência a batalhas e fortes. Contudo,
estudiosos logo começaram a rejeitar tal teoria, já que os esqueletos
pertenciam a um período posterior ao abandono das cidades e nenhum foi achado
próximo da cidadela. Além disso, as marcas nos crânios foram causadas por erosão
e não por agressão violenta.
Uma
mudança climática pode ter causado um declínio da CVI, também indicado para as
áreas vizinhas do Oriente Médio. O clima do vale do Indo esfriou e secou
significativamente a partir de 1800 AC, por um enfraquecimento geral das
monções àquela época. Alternativamente, um fator crucial pode ter sido o
desaparecimento de porções substanciais do sistema fluvial do rio Ghaggar
Hakra. Um evento tectônico pode também ter desviado as fontes do sistema para a
Planície do Ganges, embora a total incerteza quanto à data desse acontecimento,
pois a maioria dos povoamentos nos leitos do rio Ghaggar Hakra não foi ainda
datada. Hoje a maioria dos estudiosos acredita que o colapso da CVI foi causada
pela seca e declínio do comércio com o Egito e a Mesopotâmia, bem como pela
migração de outros povos, desmatamento, cheias e alterações no curso do rio.
Finalmente, a última razão para o declínio da Civilização do Vale do Indo pode
ter sido uma combinação de todos os fatores antes apontados.
Qualquer
que tenha sido a razão, a CVI chegou a um fim. Durante vários séculos os
arianos gradualmente se estabeleceram e implantaram a agricultura. Sua
linguagem ganhou a supremacia sobre as línguas locais. A origem das línguas
mais faladas hoje, no sul da Ásia, retroage aos arianos, que introduziram as
línguas Indo-Europeia no subcontinente indiano. Outras características da
moderna sociedade indiana, como práticas religiosas e divisão em castas, podem
ser rastreadas até o tempo das migrações arianas e ainda antes delas.
Anteriormente,
acreditava-se que o declínio da Civilização Harappiana tivesse conduzido a uma
interrupção na vida urbana do subcontinente indiano. Contudo, a CVI não
desapareceu subitamente e muitos dos seus elementos podem ser encontrados em
culturas posteriores, como por exemplo, pelo menos parte da religião védica.
Dados
arqueológicos atuais sugerem que a cultura classificada como Harappiana Final
pode ter persistido até pelo menos 1000 a 900 AC e foi parcialmente
contemporânea com a cultura da “Cerâmica Pintada Cinza”. Arqueólogos de Harvard
apontam para Pirak, povoamento do “Harappiano Final”, que floresceu
continuamente, de 1800 AC até a invasão de Alexandre, o Grande, em 325 AC. Recentes escavações arqueológicas
indicam que o declínio de Harappa impeliu o povo para leste. Após 1900 AC, o
número de locais investigados na Índia cresceu de 211 para 853. Escavações na
Planície do Ganges mostram que os aglomerados urbanos começaram cerca de 1200
AC, somente poucos séculos após o declínio de Harappa e muito antes do que
previamente esperado. Os arqueólogos têm enfatizado que, como na maioria das
áreas mundiais, houve uma série de desenvolvimentos culturais, que ligam as
duas maiores fases de urbanização do sul da Ásia.
Como
consequência do colapso da Civilização do Indo, culturas regionais emergiram,
em graus variáveis, mostrando a influência daquela civilização. Na antiga
grande cidade de Harappa, foram encontrados sepultamentos que correspondem a
uma cultura regional chamada “Cemitério H”. Ao mesmo tempo, a “Cultura da
Cerâmica Pintada Ocre” expandiu-se de Rajasthan para a Planície do Ganges.
VII – A CIVILIZAÇÃO DO VALE DO INDO NO CONTEXTO MUNDIAL
A
CVI tem sido às vezes identificada com a toponímia Meluhha, conhecida dos
registros sumérios, que chamavam seus habitantes de meluhhaitas. Ela tem sido comparada, em particular, com as civilizações
do Elam e com a Creta Minoana, por paralelos culturais isolados. A fase
Harappiana Madura da CVI é contemporânea à Idade do Bronze Média no antigo
Oriente Próximo, em particular com o período Elamita Antigo, o Dinástico
Inicial ao Ur III da Mesopotâmia, o pré-palaciano da Creta Minoana e do Antigo
Reino ao Primeiro Período Intermediário do Egito.
Após
a descoberta da CVI, na década de 1920, ela foi imediatamente associada aos
indígenas de Dasyu, inimigos das tribos Rigvédicas, mencionadas nos numerosos
hinos do Rigveda[1]. A
presença de muitos corpos não enterrados encontrados nas montanhas de
Mohenjo-Daro, foi interpretada como de vítimas de uma guerra de conquista. A
associação da CVI com a cidade de Dasyus permanece tentadora porque o arcabouço
temporal admitido da primeira migração Indo-Ariana na Índia corresponde
claramente ao período de declínio da CVI, do registro arqueológico. A
descoberta da avançada e urbana CVI, contudo, alterou a visão do século XIX, de
uma migração Indo-Ariana primitiva como uma invasão de uma cultura avançada às
custas de uma população aborígene primitiva, para uma aculturação gradual de
bárbaros nômades sobre uma avançada civilização urbana, comparável às migrações
germânicas após a queda de Roma. Essa mudança de cenários simplistas de
invasões, paralela desenvolvimentos similares quando se fala de transferência
de linguagem e movimento de população em geral, como no caso da migração dos
primeiros falantes gregos para a Grécia, ou a Indo-Europeização da Europa
Ocidental.
VIII – CONCLUSÕES E DÚVIDAS
Como
já dissemos e repetimos, muitas dúvidas pairam sobre a Civilização do Vale do
Indo, a maior delas, certamente, referindo-se ao relativamente rápido colapso
de civilização tão importante.
Por
que esta civilização, considerado seu alto grau de sofisticação, não se
espalhou além do Vale do Indo? Em geral, a área onde as cidades do Vale do Indo
se desenvolveram, era árida e as pessoas podem conjeturar sobre as razões que
motivaram um desenvolvimento urbano ao longo de um rio que escoava através de
um virtual deserto. Os povos da área não desenvolveram a agricultura de larga
escala e, consequentemente, não tiveram necessidade de desmatar grandes áreas
de florestas. Nem possuíam tecnologia para tanto, visto que estavam restritos
ao uso de implementos de pedra ou bronze.
Um
outro ponto de debate repousa sobre a natureza das relações entre as cidades
mais importantes. Não se sabe ainda se elas eram cidades-estados independentes
ou parte de um reino maior. Houve alguma vez um Império Indo? Um império é um
grande país ou grupo de países, com povos diferentes, governados por um rei ou
imperador. A Civilização do Indo era enorme, mas não sabemos se ela tinha reis
e nada parece ter mudado muito por centenas de anos. Novas casas eram
construídas sobre as antigas e os planos urbanos das cidades permaneciam
inalterados, com a vida prosseguindo por gerações. Isso podia significar que os
governantes Indo controlavam tudo ou apenas que as pessoas eram felizes do
jeito que a vida fluía. O que parece ser uma coroa, foi encontrada em um local
chamado Kunal. Será que essa coroa pertencia a um rei Indo? Será que cada
cidade teria o seu próprio rei?
As
cidades do Vale do Indo possuíam fortes muralhas, possivelmente para manter
afastados os seus inimigos. Como castelos, possuíam torres e pesados portões,
mas não há indícios de que tenham possuído soldados. Funcionários da cidade
podiam fiscalizar comerciantes entrando e saindo e talvez houvesse também
guardas, em caso de problemas mais sérios. Outras civilizações antigas, como o
Egito, possuíam grandes exércitos que os reis usavam para travar batalhas
contra os seus inimigos. Os povos do Indo, entretanto, parecem ter vivido em
paz pela maior parte da sua história.
"Swastika" antiga, sinal de bondade |
Apenas
a título de curiosidade, gostaríamos de fazer menção
à famosa cruz suástica que todos tão bem conhecem.
Essa cruz de dois braços curvados em ângulos retos, ou no sentido horário ou
anti-horário, na cor negra tornou-se, no século XX, o odiado símbolo nazista da
Alemanha de Hitler. Entretanto, a suástica (swastika) é, de fato, um antigo
símbolo de bondade e aparece em selos encontrados nas cidades do Vale do Indo.
O nome “swastika” vem de uma antiga língua, chamada “Sânscrito”, e significa
“bem para ser”. Era um sinal de boa sorte para os hindus e para o Budismo
significa “renascimento”. Antigas cruzes suásticas têm sido encontradas na
arquitetura hindu, moedas da Mesopotâmia, nas ruínas da cidade de Troia
(Turquia) e em outras culturas da Ásia, Europa e até mesmo na América Nativa.
Mais
significativamente, sob que circunstâncias as cidades do Vale do Indo entraram
em declínio? Os primeiros ataques em povoamentos mais afastados, pelos arianos,
parecem ter ocorrido cerca de 2000 AC, próximo de Baluchistan e, entre as
cidades mais importantes, pelo menos Harappa foi, muito provavelmente,
destruída pelos arianos. No “Rigveda” há menção de um deus da guerra védico,
Indra, destruindo alguns fortes e cidadelas, que podem ter incluído Harappa e
algumas outras cidades do Vale do Indo. Falou-se, também, de uma calamidade
cataclísmica que teria atingido a CVI, cerca de 1600 AC, mas isso não explica
porque povoamentos localizados várias centenas de quilômetros, uns dos outros, foram
totalmente erradicados.
O
grande presente do povo do Vale do Indo ao mundo, foi a demonstração de como
viver pacificamente em cidades. Seu modo de vida foi baseado no comércio, sem a
figura do dinheiro. Com poucos inimigos, não possuíam grandes exércitos.
Certamente nem todos eram ricos, mas mesmo os pobres possuíam o suficiente para
comer. Em suas cidades limpas e bem planejadas, o povo da CVI usufruiu de coisas
tão belas quanto úteis, construindo igualmente brinquedos, joias e sistemas de
drenagem.
Cerca de 1500 AC a Civilização do Vale do Indo
havia terminado. Os agricultores continuaram a viver em suas vilas, mas as
cidades acabaram em ruínas. Com o tempo, mesmo os tijolos de argila foram
carregados pelos ventos, chuvas e enchentes. Ela durou mais de mil anos e
manteve o seu auge durante 500 a 700 anos.
[1] Conforme vimos antes, o Rigveda é um dos quatro textos sagrados canônicos do Vedas. É um dos mais antigos textos existentes em qualquer língua indo-europeia, compostos na região noroeste do subcontinente indiano, mais provavelmente entre 1500 e 1200 AC. O Rigveda contém várias descrições poéticas e mitológicas da origem do mundo, hinos louvando aos deuses, e orações antigas para a vida, prosperidade etc...
Nenhum comentário:
Postar um comentário