I - INTRODUÇÃO
A fonte histórica mais segura para acompanhar a saga do povo
hebreu é, sem dúvida, o Antigo Testamento da Bíblia, ou o Tora, para os judeus.
E aqui aproveito a oportunidade para apresentar o significado de algumas
palavras básicas relacionadas.
O Tora (que em hebreu significa “instrução” ou “ensino”), ao qual muitas vezes nos referimos como “Pentateuco”, é o conceito central na tradição religiosa Judaica. Possui uma grande quantidade de significados: pode significar os primeiros cinco livros (Gêneses, Êxodos, Levíticos, Números e Deuteronômio) dos vinte e quatro livros do Tanakh (conjunto dos livros da Bíblia Hebreia), em geral incluindo os comentários rabínicos. O Tora pode significar também “instrução”, oferecendo uma forma de vida para aqueles que o seguem. Ele pode significar a narrativa continuada do Gêneses ao final do Tanakh. Pode até mesmo significar a totalidade do ensinamento, cultura e prática judeus. Comum a todos esses significados, o Tora consiste na narrativa fundamental do povo judeu: seu chamamento por Deus, suas provações e atribulações e seu pacto com seu Deus, que envolve seguir uma forma de vida personificada num conjunto de obrigações e leis civis morais e religiosas.
O Talmud
(significando “instrução” ou “aprendizado”, é um texto central do Judaísmo
Rabínico. O termo “Talmud” em geral se refere ao Talmud Babilônico, embora haja
uma coleção anterior conhecida como o Talmud de Jerusalém. O Talmud tem dois
componentes. A primeira parte é o Mishnah (cerca de 200 DC), o compêndio
escrito do Tora Oral do Judaísmo Rabínico. A segunda parte é o Gemara (cerca de
500 DC), uma elucidação do Mishna e dos escritos Tanáticos relacionados, que
muitas vezes se aventuram por outros assuntos e expõe amplamente a Bíblia
Hebreia. O Talmud pode ser usado para significar apenas o Gemara ou o Gemara e
o Mishna impressos juntos. O Talmud completo consiste de 63 tratados e, em
impressão normal, possui mais de 6.200 páginas e é escrito em hebreu e
aramaico. O Talmud contém os ensinamentos e opiniões de milhares de rabis sobre
uma variedade de assuntos, incluindo o Halakha (conjunto das leis
religiosas judias derivadas do Tora escrito e oral), a ética, filosofia,
costumes e história Judia, além de muitos outros tópicos.
Entretanto, mesmo este fantástico documento, torna-se bem
difícil de ser acompanhado - ao menos pelos leigos ou pouco conhecedores do
assunto – a partir do momento em que o Estado Judeu é invadido pela Babilônia,
Jerusalém é devastada, o Templo destruído e grande parte da sua população
levada cativa para as longínquas terras da Mesopotâmia. Há muito as doze tribos
de Israel já se haviam separado, chegara a época dos profetas e muito do Antigo
Testamento passa para o plano figurativo e religioso, tornando a leitura
difícil de ser acompanhada e entendida. A história dos Hebreus só volta a ser
novamente narrada e entendida após o nascimento de Cristo, através dos
Evangelhos (Novo Testamento da Bíblia); nesse caso, segundo o ponto de vista
dos primeiros cristãos e de cunho eminentemente religioso, com ênfase em sua
figura central, Jesus Cristo.
Certamente existem historiadores contemporâneos (Flavius
Josephus – “Josephus” -, Gaius Plinius Secundus – “Plínio, o Velho” – e Philo
Jadaeus – “Philo de Alexandria”) que escreveram a sua história à época e,
posteriormente, uma grande quantidade de historiadores modernos, usando essas
fontes, apresentaram as suas respectivas versões.
O objetivo desta publicação é exatamente tentar preencher
essa lacuna. O período que vai da invasão de Israel pela Babilônia e exílio dos
hebreus em cativeiro, até a revolta dos judeus contra o império romano, que
acabou com a destruição do Templo, pela segunda vez, e a definitiva difusão dos
hebreus por todo o mundo; visto pelo prisma exclusivamente histórico.
Como esse assunto vai envolver a participação de vários
impérios, já quero deixar claro que não é objetivo deste trabalho o
detalhamento individual das suas histórias, mas apenas mostrar as suas relações
com a história do povo hebreu durante o período mencionado. Muitos dos impérios
que serão mencionados, já foram motivo de outras postagens do pesquisador e
podem ser examinados, quando necessário.
II – CONQUISTA DO REINO DE JUDÁ PELA
BABILÔNIA
Antes do exílio, Judá era uma monarquia que havia mantido as
tradições de Israel, a comunidade tribal uma vez unida sob o Rei Davi. Havia
absorvido muito das tradições pan-israelitas, mas ainda era uma comunidade, uma
entidade política sem outra finalidade que a de existir, sobreviver e prosperar
como uma entidade política.
Entre as principais instituições da Judá pré-exílica,
estavam:
- Os reis davídicos, uma dinastia que reivindicava investidura divina;
- O templo Salomônico que, com as reformas de curta duração introduzidas por Ezequiel e Josias, abrigou vários cultos;
- Adivinhos proféticos ao serviço dos reis e
também profetas críticos dos reis, advogando somente a adoração de Javé.
Nabucodonosor II da Babilônia
O cativeiro babilônico ou exílio babilônico foi o período da
história judaica durante o qual um grande número de judeus do antigo reino de
Judá permaneceu cativo na Babilônia. Em 605 AC, Nabucodonosor II, rei da
Babilônia, sitiou Jerusalém que não lhe pode defrontar, o que ocasionou a
criação de um tributo a ser pago pelo rei hebreu Eliaquim (ou Jeoiaquim). No
quarto ano de Nabucodonosor II, Eliaquim recusou-se a pagar o tributo, o que motivou
um novo sítio da cidade no sétimo ano do rei babilônico (597 AC), que culminou
com a morte do rei de Judá e o exílio de seu sucessor Joaquim (ou Jeconias) - que
reinou por apenas três meses -, sua corte e muitos outros, para a Babilônia.
Seu sucessor, Zedequias (ou Sedecias ou Matanias), e outros, foram exilados no
décimo oitavo ano de Nabucodonosor II (587 AC); uma deportação posterior ainda
ocorreu no vigésimo terceiro ano de Nabucodonosor II (582 AC).
Império Babilônico Nabucodonosor II |
A completa conquista do reino de Judá pela Babilônia,
concretizou-se, portanto, em 587 AC, quando o rei de Judá era Zedequias. Os
babilônios destruíram Jerusalém e seu Templo, expurgando os membros da elite da
sua população para a Babilônia, aí incluindo Zedequias - cujos filhos foram
mortos em sua frente e ele cego e jogado na prisão até a sua morte. Esse
período ficou sendo conhecido como “Cativeiro da Babilônia”. A despeito da
perda do Templo, o Judaísmo não morreu como religião, embora o culto e o
sacrifício no Templo fossem impossíveis. Os judeus se consolidaram em torno dos
seus documentos sagrados e o Tora tomou o lugar do Templo como um centro
sagrado. O judaísmo tornou-se uma religião de livro, com um foco sagrado
portátil. O exílio babilônico dos judeus tornou-se proverbial. Durante e após o
exílio, eles desenvolveram uma energia criativa sem precedentes, do que
resultou a edição definitiva do Pentateuco, dos livros de Samuel e Reis, de
muitos dos livros proféticos e também na composição de uma nova literatura que
refletia as preocupações dos que retornaram da Babilônia, muitas vezes mais
diretamente, do que a antiga literatura. Durante este período eles editaram
suas histórias e escritos sagrados com a visão de que os profetas estavam
certos: as desditas das “crianças de Israel” eram devidas à sua desobediência
ao pacto, o que resultou na edição definitiva do Tora. O estudo do Tora
tornou-se o foco da prática, com encontros semanais em casas de estudo
públicas. A ênfase foi colocada nas determinações do Tora que podiam ser
seguidas longe do templo, tais como a circuncisão, a observância do Sabá, as
leis da pureza e as prescrições de dieta.
Mapa da deportação do povo de Judá |
Em 539 AC, o
persa Ciro, o Grande, conquistou a Babilônia e por um seu decreto Judá retornou
do exílio em 539 AC e foi politicamente reconstruído como uma província
administrativa semiautônoma da Pérsia. Passou a ser governada por uma elite
sacerdotal cujos pontos de vista e atitudes foram moldados pelos projetos
religiosos para reconstrução delineados no exílio. Estavam em desacordo com a
população, rigorosamente forçaram a separação da população heterogênea de Judá
e governaram à base do Tora. Em 428 AC, Ezra trouxe, da Babilônia para
Jerusalém, e promulgou, o Tora, que serviu como o ideal legal de um estado
teocrático (governado por sacerdotes ao invés de reis), efetivamente marcando o
início da moderna religião judaica. Ezra foi o sacerdote que reorganizou o
estado Israelita politicamente e organizou o novo sistema religioso que incluía
o estudo do Tora, ficando conhecido como o “Pai do Judaísmo”. Neemias, um
funcionário da corte na Pérsia, retornou pouco mais tarde para reconstruir as
muralhas da cidade e o templo de Jerusalém, isto é, o Segundo Templo, já que o
primeiro havia sido construído por Salomão. A partir daí, a religião passou a
ser conhecida como o “Judaísmo do Segundo Templo”.
Ciro o Grande, Pérsia |
A influência persa tornou-se notável na literatura
apocalítica judia (simbolismo do bem contra o mal, angelologia, figura do
demônio como ano caído e o mal personificado). A língua administrativa de Judá
passou a ser o aramaico, língua do império persa, ao invés do hebreu. Uma
importante nova instituição foi o uso dos Levitas como sacerdotes auxiliares.
O pouco que sabemos sobre a história do “Judaísmo do Segundo
Templo”, de outras fontes, é aumentado por fragmentos de cartas escritas em
papiro encontradas por modernos arqueólogos, em Elefantina, escavadas quando a
barragem de Assuam, no Egito, foi construída durante a década de 1960.
III – A HELENIZAÇÃO DO ORIENTE MÉDIO E A
REVOLTA DOS MACABEUS
Alexandre da Macedônia |
Alexandre da Macedônia foi um dos grandes estrategistas militares
do mundo e nunca perdeu uma batalha. Suas campanhas foram, basicamente, uma
tentativa de vingança pelo fato da Pérsia ter invadido a Grécia em 490 e 480
AC. Cerca de 332 AC, Alexandre havia conquistado o Império Persa (ao qual Judá
estava subordinado e praticamente sem expressão como potência militar, após ter
retornado do Exílio Babilônico) e dela recuperado o Império do Egito, a costa
grega da Ásia Menor ocidental e Tiro, seguindo rapidamente para o leste, até o
Paquistão. Alexandre teria passado perto, mas provavelmente nunca visitado
Jerusalém.
Após a morte precoce de Alexandre, em 323 AC, com a idade de
33 anos, seus vários generais lutaram entre si até 306-305 AC, quando os
vencedores repartiram o Império de Alexandre em três, assim permanecendo até a
conquista da região pelos romanos: a Ptolomeu I coube o Egito; a Antigonus I
coube a Grécia e a Macedônia; e a Seleucos I coube a Ásia Menor.
Seleucos I Nicator |
Estes acontecimentos encerraram o tempo do poder persa e
introduziram a helenização de todo o Oriente Médio. Os judeus continuaram
falando aramaico e praticando a religião durante os tempos persas. Mas o
período helenístico conduziu a conflitos culturais e políticos muito violentos,
finalmente conduzindo à revolta contra o Império Romano (66 DC) durante a qual
Judá, Jerusalém e o Templo (símbolo de independência político-religiosa) foram
destruídos pela segunda vez.
Entre 332 e 167 AC, após a conquista de Alexandre, Israel
foi primeiro governado pelo Egito e então pela Ásia Menor. Isso ocorreu quando Antíoco
IV “Epifânio” (“um manifesto de Deus”), um rei selêucida (da dinastia
Selêucida, grega, fundada por Seleucos I), invadiu o reino ptolomaico do Egito
em 168 AC, aparentemente sem o apoio judeu. É preciso que se tenha em mente
que, nessa época, o reino de Judá possuía mínima expressão política em todo o
Oriente Próximo, apenas tratando de sobreviver entre o Egito, de um lado, e o
império Selêucida, do outro, enquanto fazendo alianças ora com um, ora com
outro e sofrendo as consequências de tais alianças.
Antíoco IV Epifânio |
Tudo começou quando o Alto Sacerdote Simão II morreu, em 175
AC, e o conflito irrompeu entre os simpatizantes de seu filho Onias III (que se
opunha à helenização e apoiava os Ptolomeus) e seu filho Jason (que apoiava a
helenização e os Selêucidas). Seguiu-se um período de intriga política com
sacerdotes como Menelaus subornando o rei para conquistar o Alto Sacerdócio e
acusações de assassinato de disputantes ao título. O resultado foi uma breve
guerra civil durante a qual os Tobias, um grupo de filosofia helenística,
conseguiram colocar Jason na posição de Alto Sacerdote. Em 175 AC a crise
chegou ao clímax quando Jason estabeleceu uma arena para jogos públicos próxima
do Templo, segundo estudiosos “convertendo Jerusalém numa cidade grega com
ginásios e efebos.
Simão II Macabeu |
Em 167 AC, Antíoco IV respondeu à guerra civil em Jerusalém atacando a
cidade e ignorando a pressão da República Romana para se retirar. Ele colocou
como fora da lei a prática da religião dos judeus, prometendo a morte a todos
os que circuncisassem seus filhos, mantivessem as leis da alimentação “kashrut”
(conjunto das leis religiosas judias sobre a alimentação) ou mantivessem o
Sabá. Ele realizou o que, na profecia de Daniel, foi denominada a “abominação
da desolação”: a profanação do Templo, em Jerusalém, com o sacrifício de um
porco ao deus grego Zeus.
Na próxima postagem, continuação da HISTÓRIA DO POVO HEBREU .... com a PARTE 2.
Na próxima postagem, continuação da HISTÓRIA DO POVO HEBREU .... com a PARTE 2.
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