Homenagem ao lendário herói ancestral dos ingleses que deu título a um dos considerados "Cem Maiores Livros do Mundo" e tido como o mais antigo escrito em "Old English".

terça-feira, 8 de setembro de 2015

ROMA APÓS A QUEDA DO IMPÉRIO ROMANO (PARTE 2)



III – A ORIGEM DAS TRIBOS GERMÂNICAS

Os povos germânicos ou germanos são um grupo etno-linguístico indo-europeu originário do norte da Europa e identificado pelo uso das línguas indo-europeias germânicas que se diversificaram do proto-germânico durante a Idade do Ferro pré-românica (Recorrer ao quadro já apresentado com a descrição sucinta das principais tribos germânicas).
Originados há cerca de 1800 AC, a partir do horizonte arqueológico da “Cultura da Cerâmica Cordada”[1], na planície norte alemã, entre o Elba e o Oder[2], os povos germânicos expandiram-se para o sul da Escandinávia e para o rio Vístula[3] durante a Idade do Bronze Nórdica, atingindo o baixo Danúbio[4], em 200 AC.
No século II AC, os teutos e cimbros entraram em confronto com Roma. Na época de Júlio César, um grupo de germânicos liderados pelo chefe suevo Ariovisto expandiu-se para a Gália (empurrando os residentes celtas para o oeste, ao Reno[5]), até ser detido por César, nos Vosges (cadeia de montanhas na Europa centro-ocidental, estendendo-se ao longo da margem oeste do Vale do Reno, na direção nornordeste, da Basileia a Mainz, por cerca de 250 km), em 58 AC. Uma onda posterior de tribos germânicas migrou para o leste e para o sul, da Escandinávia para a costa oposta do Mar Báltico, movendo-se até o rio Vístula, próximo dos Cárpatos. Incluíram tribos menos conhecidas, mas por um período em que estiveram federados, e através de casamentos inter-relacionados, resultaram em grupos familiares muito conhecidos, como os alamanos, francos, saxões, frísios e turíngios. As tentativas subsequentes do imperador Augusto de anexar territórios a leste do rio Reno foram abandonadas, depois que o príncipe querusco Armínio aniquilou três legiões romanas na Batalha da Floresta de Teutoburgo, no ano 9 DC.
Posteriormente, os soldados germânicos foram maciçamente recrutados para o exército romano, principalmente para formar a guarda pessoal do imperador romano. No leste, as tribos que haviam migrado da Escandinávia para a parte inferior do Vístula, foram em direção ao sul, pressionando os marcomanos a invadir a Itália em 166 DC. 
As invasões germânicas entre os séculos II e V DC
Por volta do século III DC, os godos governaram uma vasta área ao norte do mar Negro, de onde cruzaram o baixo Danúbio ou viajaram pelo mar, invadindo a península Balcânica e a Anatólia, na altura de Chipre. Enquanto isso, as crescentes confederações de francos e alamanos romperam as fronteiras e se estabeleceram ao longo da fronteira do rio Reno, de forma contínua infiltrando-se na Gália e na Itália, enquanto os piratas saxões devastaram as costas da Europa Ocidental.
O período de migração pode ser dividido em duas fases. A primeira, que ocorreu entre 300 e 500 DC, é parcialmente documentada por historiadores gregos e latinos, mas difícil de verificação arqueológica. Ela coloca os povos germânicos em controle de grande parte das áreas até então pertencentes ao Império Romano do Ocidente. Os tervíngios penetraram em território romano (após um conflito com os hunos) em 376 DC.
Visigodos saqueiam Roma em 410
 Depois que os hunos, no século IV, invadiram os territórios do rei godo, Hermenerico, que em seu auge estendiam-se entre o rio Danúbio e o Volga
[6] e do mar Negro ao mar Báltico, milhares de godos fugiram para os Balcãs, onde infligiram uma grande derrota aos romanos na Batalha de Adrianópolis e saquearam Roma, em 410, sob a liderança de Alarico I, antes de se estabelecerem na Ibéria (antiga Península Ibérica) e fundarem um reino que durou 300 anos. No território romano, foram seguidos pelos ostrogodos, conduzidos por Teodorico, o Grande, que se estabeleceram na Itália. Enquanto isso, várias tribos germânicas se converteram ao cristianismo ariano através do missionário Úlfilas, que inventou um alfabeto para traduzir a Bíblia para a língua gótica.
Na Gália, os francos gradualmente penetraram terras romanas durante o século V e após consolidarem seu poder sob Childeric e a vitória decisiva de seu filho Clóvis sobre Syagrius, em 486, estabeleceram-se como governantes da Gália Romana norte. Defendendo-se de desafios dos alamanos, burgúndios e visigodos, o reino franco tornou-se o núcleo da futura França e Alemanha.
O estabelecimento inicial dos anglo-saxões na Bretanha ocorreu ao final do século V, quando o controle romano naquela área chegou a um fim. 
A ocupação da Europa no ano 476 DC
Após a morte de Átila, rei dos hunos, derrotados nos Campos Cataláunicos (norte da França, 451) e em Nedau, em 453, os hérulos, em 454, se separaram dos hunos e constituíram um forte reino em torno de Brno (Morávia meridional) e Viena, submetendo as populações vizinhas, entre as quais os lombardos. Em 476, os hérulos, liderados por Odoacro, invadiram a Itália e depuseram Rômulo Augusto, o último soberano do Império Romano do Ocidente que, na verdade, governava apenas algumas regiões da Itália, já que naquela época não havia mais um império unificado no ocidente. 
Odoacro, rei dos hérulos e primeiro
germânico no Império Romano

IV - OS GERMÂNICOS E O IMPÉRIO ROMANO DO OCIDENTE

Não muito depois de Teodorico tornar-se rei dos ostrogodos, ele e Zenão I (imperador romano do Oriente à época), concluíram um acordo que beneficiava a ambos. Os ostrogodos precisavam de um lugar para viver, e Zenão I estava tendo sérios problemas com Odoacro. Ainda que, formalmente, apenas um vice-rei do imperador Zenão I, Odoacro ameaçava territórios bizantinos e não respeitava os direitos dos cidadãos romanos na Itália. Com o encorajamento de Zenão I, Teodorico invadiu o reino de Odoacro, chegando com seu exército à península itálica em 488 e vencendo várias batalhas até 493, quando ambos assinaram um acordo que garantia a supremacia de ambos. Um banquete foi organizado para celebrar o tratado e nele Teodorico matou Odoacro com as próprias mãos. 
Romulo Augusto entrega o Império
Romano do Ocidente a Odoacro
Como Odoacro, Teodorico era formalmente apenas um vice-rei para o imperador romano em Constantinopla. Na realidade, ele agia com independência, e o relacionamento entre o imperador e Teodorico era de iguais. Contudo, diferentemente de Odoacro, Teodorico respeitava o acordo que tinha feito e permitia que os cidadãos romanos dentro do seu reino fossem submetidos à lei romana e ao sistema judicial romano. Os ostrogodos, por enquanto, viviam sob suas leis e costumes.
Teodorico foi um governante hábil, que soube conservar o equilíbrio entre as instituições imperiais e as tradições bárbaras. Homem culto, educado na corte de Constantinopla, capital do Império Romano do Oriente, conseguiu ganhar a simpatia da aristocracia romana, cujos privilégios anteriores respeitou, e do povo, que assistia satisfeito à realização de obras públicas para a reconstrução e modernização de Roma. 
O ostrogodo Teodorico, continuador
do Império Romano do Ocidente
Embora legitimado no papel e formalmente reconhecido pelo Império Romano, Teodorico sabia que necessitava mais que isso para estabelecer-se seguramente no trono. Havia enviado uma de suas filhas, Teodegota, para casar-se com o rei dos visigodos, Alarico II, em 494, e outra, Ostrogota, como esposa de Sigismundo, dos burgúndios, em 496. Ele próprio se havia casado com Autofleda, irmã do rei Clovis I, dos francos, logo após sua vitória sobre Odoacro. Com essas alianças esperava formar um reino em que todos os povos conhecidos dos romanos como “bárbaros”, pudessem viver juntos pacificamente. Orgulhoso de sua origem gótica, Teodorico acreditava poder reconciliar os interesses romanos e germânicos, fazendo do seu reino uma continuação do Império Romano.
Embora todo o seu sucesso, Teodorico sofreu desafios e reveses. Em 507, o franco Clovis I derrotou seu aliado, Alarico II, matando-o; logo os francos recusaram intervir quando os burgúndios, que também haviam sido aliados, iniciaram incursões na costa italiana, contidas, com vantagens territoriais para Teodorico. Continuamente negociava com seus supostos aliados tentando manter a paz ao mesmo tempo que reconhecia a necessidade de satisfazer o Império do Leste. Incapaz de produzir um herdeiro, nomeou seu neto, Atalarico, filho de sua filha Amalasunta e do príncipe visigodo Eutarico, como seu sucessor. Com isso, ele trouxe o reino visigodo ao seu comando, pois seu príncipe (seu pai havia morrido cedo) era agora herdeiro do seu trono. 
Mausoléu de Teodorico, em Ravenna
Enquanto isso, a maior parte das províncias do oeste foi conquistada por ondas de invasões germânicas, muitas delas politicamente desconectadas do leste como um todo e prosseguindo num lento declínio. Importante dizer que, embora a autoridade política romana no oeste tenha terminado, a cultura romana ainda continuaria em suas províncias pelo século VI e posteriores.
Aqui, um pequeno parênteses para mencionar a segunda fase da migração germânica que, para os objetivos da nossa postagem, apresenta importância secundária. Essa segunda fase teve lugar entre 500 e 700 e viu as tribos eslavas (Ucrânia, Romênia, Bielo Rússia e outros países da atualidade se estabelecendo na Europa Central e Oriental, particularmente na Grande Germânia Oriental (limitada, a oeste, pelo rio Reno, ao sul pelo rio Danúbio, ao norte pelo mar Báltico e ao leste pelo rio Vístula), gradualmente transformando-a em predominantemente eslávica. Adicionalmente, tribos turcas (conjunto de grupos étnicos que viviam no norte, leste, centro e oeste da Ásia, noroeste da China e partes da Europa oriental), como os avaros, foram envolvidos nessa fase.
Voltando à Itália, após sua morte em Ravena (então a capital do Império), em 526, após 33 anos de reinado, Teodorico foi sucedido pelo seu neto Atalarico, inicialmente representado por sua mãe, Amalasunta, atuando como rainha regente de 526 a 534.
Não suportando a regência de uma mulher, a educação romana ministrada ao rapaz, o tratamento obsequioso de Amalasunta em relação ao Bizâncio, nem tampouco seu espírito conciliador com os romanos, a nobreza gótica decide tirar-lhe o filho e educá-lo segundo os costumes de seu povo. O jovem, no entanto, não resistiu a isso e morreu em 534 sem assumir o império. Visando a manutenção do Império, Amalasunta desposa Teodato, um dos chefes ostrogodos. Este exila a esposa e ordena sua morte em 535. Seu assassinato foi usado pelo imperador bizantino Justiniano I para não reconhecer a legitimidade do reinado de Teodato e invadir a Itália numa guerra de reconquista pelo Império Bizantino (Guerra Gótica), que levaria quase duas décadas e seria mais destruidora que as invasões bárbaras dos dois séculos anteriores.
Finalmente, em 553, na Batalha de Mons Lactarius, ao sul de Nápoles, o Império Romano do Oriente saiu vencedor e os sobreviventes do exército ostrogodo foram reduzidos à escravidão. Com a captura do último nobre, em 562, os ostrogodos caíram na obscuridade. Ao final do conflito, a Itália estava devastada e consideravelmente despovoada. Como consequência, os vitoriosos bizantinos (Império Romano do Oriente) não conseguiram resistir à invasão dos lombardos, em 568, resultando na perda de grandes regiões da península italiana. Os lombardos, chefiados por Alboíno, invadiram a Itália e fundaram um reino lombardo independente, chamado de Reino Itálico, que durou até 774, quando foi derrubado pelo franco Carlos Magno, coroado imperador dos romanos em 800. A influência dos lombardos na geografia política italiana ficou evidente na denominação regional da Lombardia, onde se falava um idioma germânico extinto do qual restam poucas evidências, o lombardo.

[1] A cultura da cerâmica cordada, alternativamente conhecida como cultura do machado de batalha ou cultura de túmulo individual, é um enorme horizonte arqueológico europeu que inicia ao final do Neolítico (Idade da Pedra), floresce através da Idade do Cobre e culmina com o início da Idade do Bronze. É o maior grupo cultural do norte e centro europeu na Idade do Cobre, indo da Holanda e Suíça, ao oeste, através da Escandinávia e Europa Central, para o leste, até o Volga superior e o médio Dnieper. Recebeu o nome “cerâmica cordada” a partir da decoração de sua cerâmica característica.
[2] O rio Elba, um dos maiores da Europa Central, nasce nas montanhas Krkonoše, ao norte da República Tcheca, antes de atravessar uma boa parte da Bohemia e da Alemanha, escoando então no Mar do Norte, em Cuxhaven.
O Oder ou Óder é um rio da Europa central que nasce na República Checa (maciço da Bohemia). Corre no rumo geral de noroeste, atravessando a planície da Silesia (Polônia), onde recebe o nome de Odra, e a extensa planície germano-polonesa, já com o nome de Oder. Serve de fronteira entre a Alemanha e a Polônia. Após percorrer 885 km, atinge o mar Báltico, ainda em terras polonesas, formando largo estuário e penetrando na Stettiner Haff, laguna que se comunica com aquele mar.
[3] O Vístula é o mais longo rio da Polônia. Tem 1.047 km e sua bacia hidrográfica banha cerca de 192 mil km², ou quase dois terços da superfície da Polônia. Ele nasce nos Beskides ocidentais, na alta Silesia (sudeste da Polônia), a 1.106 metros de altitude e percorre 1.047 km através da Polônia antes de desembocar no Mar Báltico, perto de Gdansk.
[4] O Danúbio é o segundo rio mais longo da Europa (depois do Volga), com cerca de 2900 quilômetros de extensão, atravessando o continente de oeste a leste, desde sua nascente na Floresta Negra (Alemanha), até desaguar no mar Negro (Romênia). O rio passa por diversas capitais da Europa e constitui a fronteira natural de dez nações. As mais importantes cidades nas suas margens são Ulm, Ingolstadt, Ratisbona, Linz, Viena, Bratislava, Budapeste, Vukovar, Novi Sad, Belgrado, Ruse, Brăila e Galati.
[5] O Reno é um rio com 1.233 km de comprimento que, nascendo nos Alpes, no leste da Suíça, cantão de Grisões, a montante de Coira, é o resultado da confluência de dois rios, o Reno Anterior e o Reno posterior. Atravessa a Europa de sul a norte, desaguando no mar do Norte, no grande delta do Reno e Mosa. Junto com o Danúbio, o Reno constituía a maior parte da fronteira setentrional do Império Romano, que o chamava de Rhenus. Desde essa época o Reno é um curso de água muito usado para o transporte e o comércio.
[6] O rio Volga é, com os seus 3688 km, o mais longo rio da Europa e também o maior do continente em vazão e área de bacia hidrográfica. Nasce no planalto de Valdai, no norte da Rússia, corre pela planície russa e deságua no mar Cáspio.

A seguir, encerramento com a PARTE 3.

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