Localização de Roma na península itálica e no mundo |
Roma era, inicialmente,
um pequeno povoado, ou grupo de povoados, situado no Palatino e nas colinas
vizinhas. Sua população girava em torno de
poucas centenas de habitantes que baseavam sua economia na agricultura (trigo, cevada,
ervilha, feijão), pecuária (cabras, porcos), pesca, caça e coleta; a manufatura
de artigos cerâmicos, roupas e outros artigos de uso doméstico, era realizada
pelas famílias para consumo interno; não havia estratificação social definida.
A partir de 770 AC sítios arqueológicos da região, em especial necrópoles,
começaram a demonstrar maior número de restos humanos, o que indica crescimento
humano, influências externas derivadas de contatos comerciais, em especial com
as colônias gregas da Campânia (região a sudoeste da Itália), maior
especialização artesanal (emprego de roda de oleiro), e o aparecimento de
classes sociais economicamente diferenciadas; tais processos intensificaram-se
entre o final do século VIII e o século VII AC.
Esquema das Sete Colinas e o Tibre |
Muitas
sepulturas do período, encontradas em diversos locais no Lácio, contêm
indivíduos com ornamentos que ressaltam sua riqueza, o que pode indicar
formação progressiva de uma aristocracia dominante, que controlou os meios de
produção, bem como os excedentes, adquirindo uma característica hereditária na
manutenção do poder. Nesse contexto, muitos assentamentos apresentam notório
crescimento, tornando-se núcleos de poder que foram fortificados com terraços e
fossas (restos de uma muralha datada de 730 AC foram encontrados). Roma, antes
um pequeno povoado no Palatino, abrangia em meados do século VII AC, o Vale do
Forum, o Quirinal, parte do Esquilino e o Célio. No final do século VII AC,
indícios arqueológicos apontam para um intenso processo de urbanização: cabanas
foram substituídas por casas mais sólidas (alicerces de pedra, estruturas de
madeira e cobertura de telhas); no Forum foi aberta uma praça pública; vestígios
de prédios públicos, santuários e templos foram detectados, juntamente com
telhas, terracotas (material constituído por argila cozida no forno, sem ser
vidrada, utilizada em cerâmica e construção) e frisos decorativos.
A base social
romana era constituída pelas gentes (singular: gens, clã),
associações de parentesco entre famílias que acreditavam descender de
ancestrais comuns que, de modo a expressar sua relação, utilizavam o mesmo
nome. Nestas condições, cada membro de um gens (o gentiles) possuía
dois nomes: um pessoal (praenomen; p. ex. Marco, Cneu, Tito) e um
gentilício (nomen; por exemplo Márcio, Névio, Tácio). Cada família que
compunha a gens era controlada por um respectivo pater familias
que exercia poder absoluto (in potestate) sobre sua propriedade,
animais, escravos, filhos e mulher; baseado em seu poder (patria potestas),
o pater famílias tinha o direito de matar ou vender qualquer membro de
sua família, a representava em suas relações com outras famílias e com a
comunidade e efetuava os ritos e sacrifícios em honra aos antepassados e
deuses. Desse modo, mesmo adultos, seus filhos não adquiriam autonomia legal
até a morte do pater familias, quando por direito próprio eram
considerados patres familiarum.
A partir do
termo pater surgiu o termo patrício, nome da camada social
dominante em Roma. Esta camada ostentava maior número de rebanhos, terras e
escravos, da mesma forma que a eles era legado o direito a exercer funções
públicas, militares, religiosas, jurídicas e administrativas. Abaixo dos
patrícios estava a clientela (singular: clientes), classe
constituída por plebeus, escravos libertos, estrangeiros ou filhos ilegítimos
que associavam-se aos patrícios prestando-lhes diversos serviços em troca de
auxílio econômico e proteção social. Esta relação entre patrícios e a clientela
baseava-se, principalmente, em conotações morais, ao invés de legais, uma vez
que o clientes gozava da "confiança" (fides) de seus
senhores. A clientela tinha, entre suas obrigações, o cultivo de parte
das terras dos patrícios, bem como prestações de serviços militares. Quanto
maior fosse o número de clientes sob proteção de um patrício, maior era seu
prestígio social e político.
Os plebeus (de plebs,
multidão) eram camponeses, pequenos agricultores, artesãos e comerciantes. No
período monárquico, os plebeus não possuíam direitos políticos, embora
estivessem sujeitos a cargas tributárias e a obrigações militares. Era proibido
o casamento entre plebeus e patrícios para evitar a mistura de classes sociais.
Na base da pirâmide social romana estavam os escravos que eram vencidos de
guerra ou plebeus endividados. No caso dos plebeus, a escravidão podia ocorrer
de duas formas. A primeira ocorria quando uma família empobrecida vendia os
seus próprios filhos, na condição de escravos. A segunda era uma forma de
pagamento de dívidas, ou seja, o devedor, impossibilitado de saldar suas
dividas, podia se tornar escravo do credor. Eram vistos como instrumentos de
trabalho, sendo considerados como propriedade de seu senhor, podendo ser
vendidos, trocados, alugados ou castigados. Como escravo, a pessoa não detinha
nenhum direito, como o de casar, deslocar-se de um lugar para outro, participar
das assembleias e tomar decisões.
As mulheres
romanas, as matronae, tinham direito de possuir propriedade, ser
educadas e participar mais ativamente de atividades sociais, como os banquetes
e campanhas eleitorais.
Considerando, portanto, que a fundação de Roma tenha
ocorrido em meados do século VIII A.C. (753 AC) e que Roma, como capital
única do império, tenha caído em 476 DC, quando passou a ser conhecido como
Império Bizantino, governado a partir de Constantinopla (calma aos leitores,
pois tudo isso será visto com muitos detalhes), costuma-se dizer que a civilização
romana teve uma duração de doze séculos.
III – O REINO DE ROMA
Reino de Roma, como já vimos, é a
expressão utilizada, convencionalmente, para definir o Estado monárquico romano
desde a sua origem, em 21
de abril de 75 3
AC, até a queda da realeza, em 509
A C. A documentação desse período é precária e suas
origens são imprecisas, mas parece claro que foi a primeira forma de governo da
cidade, um dado que a arqueologia e a linguística parecem confirmar. Até mesmo
os nomes dos reis são desconhecidos, citando-se apenas os reis lendários,
apresentados nas obras já citadas da história romana, que chegaram até a
atualidade, como Virgílio (Eneida), Tito Lívio (Ab Urbe condita libri),
Plutarco e Dionísio de Halicarnasso, entre outros. Segundo eles, nos primeiros
séculos da vida de Roma, em período monárquico, houve uma sucessão de sete reis
e a cada um deles foi atribuída uma inovação para a formação das instituições
romanas: Rômulo (753—717 AC) fundou a cidade e raptou as sabinas; Numa Pompílio
(717—673 AC) criou as instituições religiosas, os sacerdotes e os ritos; Túlio
Hostílio (673—642 AC) destruiu Alba Longa; Anco Márcio (640—616 AC) fundou a
colônia de Óstia; Tarquínio Prisco (616—579 AC) realizou grandes trabalhos de
construção em Roma; Sérvio Túlio (578—535 AC) dividiu a sociedade romana em
classes censitárias; e Tarquínio, o Soberbo (534—509 AC) representou o típico tirano
romano.
Durante esse
período o rei (rex) acumulava as funções executiva, judicial e religiosa,
embora seus poderes fossem limitados na área legislativa, já que o senado, ou
"conselho de anciãos", tinha o direito de veto e sanção das leis
apresentadas pelo rei. A ratificação dessas leis era feita pela assembleia ou
cúria, composta de todos os cidadãos em idade militar (até 45 anos).
À época da fundação de Roma, os itálicos — predominantemente
latinos (a oeste), sabinos (no vale superior do Tibre), úmbrios (no nordeste), samnitas
(no sul), oscos e outros — partilhavam a península itálica com outros grandes
grupos étnicos: os etruscos, ao norte, e os gregos, ao Sul. Crê-se, também, que
Roma teria estado sob forte influência etrusca durante quase um século quando, na
fase final da realeza, a partir do século VII AC, esteve sob controle de
três reis etruscos.
III – 1 Instituições Políticas nos Primeiros Anos de Roma
O termo latino senatus
é derivado de senex (os leitores hão de lembrar-se de “senil”?), que
significa "homem velho". Portanto, Senado significa, literalmente, "conselho de anciãos".
Sua origem possivelmente provém da estrutura tribal das comunidades do Lácio.
Estas comunidades muitas vezes incluíam um conselho aristocrático (aristocracia:
literalmente, poder dos melhores) de anciãos tribais, em geral, os pater
das principais gentes. Com o tempo, os pater reconheceram a
necessidade de um único líder e assim elegeram um rei romano (rex),
investindo nele o seu poder soberano; ao morrer um rei, o poder revertia, naturalmente,
aos pater que, durante este interregnum
(período entre a morte de um rei e a posse do seguinte), indicavam um novo rex. O senado possuía três
responsabilidades principais: era o repositório definitivo do poder executivo,
atuava como conselheiro do rei e funcionava como um corpo legislativo em
sintonia com o povo de Roma. Os senadores romanos reuniam-se em um templum
ou qualquer outro local que havia sido consagrado por um funcionário religioso
(áugure).
Durante os anos
da monarquia, a mais importante função do senado era selecionar os novos reis.
Quando um rei morria, um membro do senado (o interrex) indicava um
candidato para substituir o rei. Após o senado dar sua aprovação inicial ao
candidato, ele era, formalmente, eleito pelo povo e, em seguida, recebia a
aprovação final do senado. Assim, apesar do rei ser oficialmente eleito pelo
povo, efetivamente a decisão era do senado. O mais significativo papel do
senado, além das eleições reais, era o de consultor do rei, ao qual,
entretanto, ele não ficava limitado. Tecnicamente, o senado poderia fazer leis;
entretanto, apenas o rei poderia decretar novas leis, embora envolvesse, muitas
vezes, tanto o senado como a assembleia curial (assembleia popular) no
processo. No entanto, o rei era livre para ignorar qualquer decisão que o
senado tivesse aprovado.
Assembleias legislativas foram instituições do
Reino de Roma e pelo menos duas delas são dignas de nota. A “assembleia curiata”
(comitia curiata) foi a única assembleia popular com algum significado
político durante o período do Reino de Roma e, embora tivesse alguns poderes
legislativos, apenas ratificava, simbolicamente, decretos emitidos pelo rei
romano, embora a sua rejeição não evitasse a sua promulgação. O rei presidia a
assembleia e submetia decretos para a sua ratificação. Um interrex presidia
a assembleia durante um interregnum.
Após a seleção do novo rei e a aprovação inicial do senado ser concretizada, o interrex
realizava a eleição formal antes da assembleia curiata. Nas Kalendae[1] (Calendas) e nos Nonae (Nonas), esta assembleia se
reunia para ouvir anúncios. Apelações ouvidas pela curiata muitas vezes
tratavam de questões relativas ao direito de família romano. Durante dois dias
fixos na primavera, a assembleia era agendada para testemunhar vontades e
adorações. Todas as outras reuniões não tinham datas pré-fixadas e eram
realizadas conforme necessário. A assembleia também tinha jurisdição sobre a
admissão de novas famílias para uma cúria (logo a seguir o seu conceito), a
transferência de família entre duas cúrias, bem como a transferência de
indivíduos plebeus para o estado patrício (ou vice-versa), ou a restauração da cidadania
a um indivíduo. A assembleia geralmente decidia tais questões sob a presidência
de um pontifex maximus (literalmente, o “maior construtor de pontes”;
posteriormente utilizado como título papal).
A "assembleia calata" (comitia
calata) foi a mais antiga assembleia romana e possuía atribuições puramente
religiosas. Durante os anos do reino, todo o povo de Roma foi distribuído por
um total de 30 (trinta) cúrias, as unidades básicas de divisão nas duas
assembleias populares. Os membros de cada cúria votavam e a maioria determinava
como a cúria votaria, antes da assembleia. Reunia-se no Capitólio (Monte
Capitolino) e era convocada pelas assembleias curiata e/ou centuriata,
com a função de empossar o rex sacrorum (sacerdote rei das coisas
sagradas) ou qualquer flamen (sacerdote romano) ou vestal (sacerdotisa
romana). Ocasionalmente o povo era convocado para as reuniões que tratavam, por
exemplo, de situações onde um indivíduo renunciava às praticas religiosas de seu gens e adotava as
práticas de seu novo gens.
(Segue com a PARTE 3)
[1] Os romanos tinham nomes especiais para três dias de cada mês:
· Kalendae – primeiro dia de cada mês, de onde se originou a palavra Calendário;
· Nonae – dependendo do mês, o seu 5º ou 7º dia, correspondendo ao quarto crescente;
· Idus – 13º ou 15º dia dependendo do mês, correspondendo ao dia de lua cheia.
A expressão “calendas gregas”, já existente ao tempo dos romanos, em latim, representa um dia que jamais chegará, pois inexistia no calendário grego. Dos idus é que provém a expressão “nos idos de setembro”, para representar uma data na segunda quinzena do mês.
· Kalendae – primeiro dia de cada mês, de onde se originou a palavra Calendário;
· Nonae – dependendo do mês, o seu 5º ou 7º dia, correspondendo ao quarto crescente;
· Idus – 13º ou 15º dia dependendo do mês, correspondendo ao dia de lua cheia.
A expressão “calendas gregas”, já existente ao tempo dos romanos, em latim, representa um dia que jamais chegará, pois inexistia no calendário grego. Dos idus é que provém a expressão “nos idos de setembro”, para representar uma data na segunda quinzena do mês.
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