Homenagem ao lendário herói ancestral dos ingleses que deu título a um dos considerados "Cem Maiores Livros do Mundo" e tido como o mais antigo escrito em "Old English".

Mostrando postagens com marcador Niceia. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador Niceia. Mostrar todas as postagens

segunda-feira, 29 de julho de 2013

BREVE HISTÓRIA DO IMPÉRIO ROMANO - PARTE 10

V.3.3 – O Império Romano do Oriente
De forma análoga como fiz na Parte 9 desta História sobre o Império Romano, lembro aos leitores do interesse e da necessidade de recorrerem, desta feita, ao "Anexo III – Imperadores do Império Romano do Oriente", que apresenta a relação completa dos Imperadores mencionados nesta e nas subsequentes publicações.
Em geral, a expressão “queda do Império Romano” refere-se ao fim do Império Romano do Ocidente, conforme vimos, ocorrido em 476 DC, com a tomada de Roma pelos hérulos. O Império Romano do Oriente, que posteriormente os historiadores denominariam Império Bizantino, continuou a existir por quase mil anos, até 1453, quando ocorreu a morte de Constantino XI e a queda de Constantinopla para os turcos otomanos. Embora o Império Bizantino tenha sido uma extensão real do Império Romano, por sua origem, civilização, cultura e língua, ao longo de sua própria evolução tornou-se um mundo totalmente diverso do que havia sido o Império Romano. Em vista disso, apenas brevemente caracterizaremos a sua formação e o seu término, dando com isso fecho ao nosso trabalho. 
Constantinopla (A) entre o Mar Negro e o Mar Egeu
O Bizâncio, brevemente Nova Roma, a duradoura Constantinopla e hoje Istambul foi, originalmente, um estado grego fundado, segundo a lenda grega, pelo Rei Bizas, que naquele local se instalou pela existência da faixa de água (Estreito de Bósforo) que ligava a Ásia à Europa e o mar negro ao Mediterrâneo, através do Mar de Mármara e do Mar Egeu. Bizas, filho do rei Nisos, era um colonizador grego da cidade dórica de Megara que consultou o oráculo de Apolo, em Delfos, que o instruiu a se estabelecer em frente à “Terra dos Cegos”. Conduzindo um grupo de colonizadores Megarianos, Bizas encontrou um local onde o Chifre Dourado, um grande porto natural, encontra o Bósforo e escoa no mar de Marmara, de fronte a Chalcedo, (atual Kadiköy). Ele decidiu que os Chalcedonianos deveriam ter sido cegos por não reconhecer as vantagens que a terra do lado europeu do Bósforo tinha sobre o lado asiático. Do lado europeu havia apenas dois povoados de pescadores: Lygos e Semistra. Em 667 AC ele fundou Bizâncio, onde eles se encontravam, assim cumprindo a busca do oráculo.
O Império Bizantino, inicialmente conhecido como Império Romano do Oriente ou Reinado Romano do Oriente, sucedeu ao Império Romano (cerca de 395 DC) como o império e reinado dominante do Mar Mediterrâneo, embora o Império Romano do Ocidente continuasse a existir com sua capital em Roma, com todas as dificuldades já relatadas.
Como vimos, o embrião do Império Bizantino surgiu quando o imperador romano Constantino I decidiu construir sobre a antiga cidade grega de Bizâncio uma nova capital para o Império Romano, mais próxima às rotas comerciais que ligavam o Mar Mediterrâneo ao Mar Negro, e a Europa à Ásia. Além disso, já havia algum tempo que Roma era preterida por seus imperadores que optavam por outras sedes de governo, em especial cidades mais próximas das fronteiras ou onde a pressão política fosse menor. Em geral, eles tendiam a escolher Milão, mas as fronteiras que estavam em perigo na época de Constantino eram as da Pérsia, ao leste, e as do Danúbio, ao norte, muito mais próximas da região dos Estreitos Turcos. A nova capital, batizada de Constantinopla em homenagem ao imperador, unia a organização urbana de Roma à arquitetura e arte gregas, com claras influências orientais. Era uma cidade estrategicamente muito bem localizada e sua resistência a dezenas de cercos provou a boa escolha de Constantino. Em pouco tempo, a cidade renovada tornar-se-ia uma das mais movimentadas e cosmopolitas de sua época.
Sua religião, língua e cultura, eram essencialmente gregas, e não romanas, mas para os bizantinos a palavra "grego" significava, de maneira injuriosa, "pagão". Os persas e os árabes também chamavam os bizantinos de "romanos". Preferiram chamar a si mesmos, em grego, de romioi (povo grego cristão com cidadania romana), ao mesmo tempo em que desenvolveram uma consciência nacional como residentes da Romania, como chamavam o estado bizantino e seu mundo à época.
O Império Bizantino pode ser definido como um império formado por várias nações da Eurásia que emergiu como império cristão e terminou seus mais de mil anos de história em 1453 como um estado grego ortodoxo: o império se tornou nação. Ainda que os antigos gregos não fossem cristãos, os bizantinos os reclamavam como seus ancestrais.
A dissolução do estado bizantino no século XV não desfez imediatamente a sociedade bizantina. Durante a ocupação otomana, os gregos continuaram identificando-se como romanos e helenos, identificação que sobreviveu até princípios do século XX e que ainda persiste na moderna Grécia.
O termo bizantino começou a ser utilizado por historiadores do século XVII para se criar uma distinção entre o Império da Idade Média e o da Antiguidade. Tradicionalmente, era conhecido apenas como Império Romano do Oriente (devido à divisão do Império feita pelo imperador romano Teodósio I, no século IV da Era Cristã).
Teodósio. divisor do Império Romano
O último imperador do Império Romano unificado, Teodósio, dividiu o império em duas partes dando a parte Ocidental para seu filho Honório e a parte Oriental para seu outro filho Arcádio, que tornou-se o primeiro imperador independente do Império Romano do Oriente.
O sucessor de Arcádio foi Teodósio II. De fraco caráter, deixou-se influenciar por aqueles que o rodeavam, nomeadamente a sua irmã e a sua esposa. Desenvolveu uma política externa pouco brilhante e deixou os monofisitas triunfarem no Concílio de Éfeso(1). Após o papa Celestino I ter excomungado, em 430, Nestório, o patriarca de Constantinopla, cujas teses foram derrotadas no Concílio de Éfeso, Teodósio ordenou que toda a vasta obra do patriarca fosse queimada. O seu reinado foi marcado pelo alargamento das fronteiras do Império (apesar de algumas derrotas pesadas, como contra as forças hunas de Átila) e pela controvérsia religiosa. Mandou redigir o Código Teodosiano. 
Imperadores Marciano e Pulquéria
Com a morte de Teodósio II (lembrar sempre do "Anexo III - Imperadores do Império Romano do Oriente), Marciano foi escolhido para consorte pela irmã e sucessora de Teodósio, Pulquéria, e incumbido de governar um Império humilhado e empobrecido pelas incursões dos hunos. Ao tornar-se imperador, Marciano repudiou os constrangedores pagamentos de tributo a Átila, o Huno, que este costumava receber de Teodósio em troca de não atacar o Império do Oriente. Ciente de que jamais conseguiria tomar Constantinopla, Átila voltou-se para o ocidente e liderou as suas famosas campanhas na Gália em 451 e na Itália em 452, sem molestar o território bizantino.
Marciano reformou as finanças, controlou as extravagâncias e recolonizou os distritos devastados. Repeliu ataques da Síria e do Egito (452) e reprimiu distúrbios na fronteira com a Armênia (456). O fato marcante de seu reinado é o Concílio de Calcedônia (451), no qual Marciano procurou mediar os desentendimentos entre as escolas rivais de teologia. Marciano evitou envolver-se nos destinos do Império do Ocidente, nem mesmo com as incursões de Átila e o saque de Roma pelos vândalos (455). Em 453, pouco antes de morrer, Átila voltaria a entrar em conflito com Marciano, morrendo antes de iniciar uma guerra aberta. Marciano morreu em 457 de uma doença, possivelmente gangrena, contraída durante longa uma peregrinação religiosa. Apesar de seu reinado breve e de sua aversão a envolver-se com o ocidente, Marciano é considerado um dos melhores dentre os primeiros imperadores bizantinos A Igreja Ortodoxa considera-o e a sua mulher Pulquéria como santos, celebrados em 17 de fevereiro.
Marciano, sem ter um varão para sucedê-lo no trono, tornou-o vago; entretanto, o general Aspar encarregou-se de colocar no trono alguém que lhe favorecesse: o militar Leão, assim iniciando a dinastia Leônica (457 a 518 DC), em que sobressaiu-se o imperador Zenão I. Foi nessa época que, numa tentativa de recuperação da península Itálica, enviou o rei gótico Teodorico para depor Odoacro. Teodorico assassinou-o em 493 tornando-se o primeiro governante da Itália, livrando o império Oriental de um subordinado indisciplinado e mantendo uma forma nominal de supremacia de suas terras. 
Imperatriz Teodora
Imperador Justiniano I
Na dinastia Justiniana (518 a 610 DC), que a sucedeu, destacou-se o reinado do Imperador Justiniano I, que reinou com sua esposa Teodora, durante cujo reinado foi construída a Basílica de Santa Sofia, um dos principais monumentos da arquitetura bizantina.
Heráclio deu início à dinastia Heracliana (610 a 717 DC), que se envolveu em batalhas desastrosas contra o império Sassânida (último império Persa pré-islâmico), tendo saído vencedor em 629, mas totalmente enfraquecidos e vulneráveis ambos às forças árabes muçulmanas que surgiram nos anos seguintes; a partir de 649 o império começou a sofre ataques navais dos árabes. Durante este período, a cidade de Constantinopla reduziu consideravelmente o seu tamanho, caindo sua população de cerca de 500.000 para apenas algo como 60.000 habitantes. A dinastia Heracliana chegou ao fim em 717, poucos anos após a segunda deposição de Justiniano II. 
Basílica de Santa Sofia, de pura arquitetura bizantina
A dinastia Isauriana ou Isáurica (717 a 802) iniciou-se com o reinado de Leão III, o Isáurico e encerrou-se com Irene, primeira imperatriz do Império Romano do Oriente, o que teria levado o Papa Leão III a coroar Carlos Magno como imperador do Ocidente; durante esse período foram travados inúmeros combates com árabes e búlgaros, principalmente. (Figura da Imperatriz Teodora II)
A dinastia dos Focas (802 a 820), de expressão muito pequena, foi substituída pela dinastia Amoriana (820 a 867), em que reinou, entre outros, Teodora II, esposa de Teófilo, desde a sua morte em 842, até 855. Ao seu final, o império tinha restabelecido sua posição tanto no oriente como no ocidente e a eficiência e sua estrutura militar defensiva permitiu que seus imperadores começassem a planejar as guerras de reconquista, no leste. 
Irene, primeira Imperatriz do Império do Oriente
O processo da reconquista iniciou com a dinastia Macedônica (867 a 1057) e o reinado de Basílio I que manteve guerras diversas, principalmente contra os muçulmanos que ameaçavam o império. Neste período, a situação na fronteira com os árabes permaneceu instável, com os bizantinos alternando entre ofensivas e defensivas e poucas mudanças no cenário de fronteiras. Durante esta dinastia foram também movidas batalhas contra os búlgaros e contra o novo Principado de Kiev, com a derrota definitiva dos primeiros em 1018 e a adesão dos últimos ao Império do Oriente. O século XI foi também de grande importância para os seus eventos religiosos. Em 1054, as relações entre as tradições ocidentais e orientais dentro da Igreja Cristã chegaram a uma crise terminal, com a cisão definitiva entre a Igreja Católica Apostólica Romana, com sede em Roma e a Igreja Ortodoxa Grega, com sede em Constantinopla, através do Grande Cisma do Oriente, encerrando séculos de separação gradual. A dinastia encerrou-se com os turcos seljúcidas fazendo as suas primeiras incursões do outro lado da fronteira bizantina, em 1065 e 1067. Até 1081, os seljúcidas expandiram seu domínio sobre quase todo o planalto da Anatólia e Armênia, a leste da Bitínia, no oeste, e fundaram sua capital em Niceia, a apenas 88 km de Constantinopla.
Aqui cabe um pequeno parênteses para o melhor entendimento do que ainda virá, até a tomada de Constantinopla. Os turcos seljúcidas eram uma tribo de nômades, conduzidos por Seljuque, que se instalaram perto de Bucara (agora no Uzbequistão) no final da década de 900. Alguns desses guerreiros partiram a seguir para a conquista de novas terras mais para o ocidente. Em 1071, Alp Arslan conduziu os seus homens para a Armênia, onde foi atacado por um exército bizantino sob o comando do imperador Romano IV Diógenes, fatal para os bizantinos. Os turcos fingiram fugir, cercaram o inimigo e derrotaram-no, capturando o imperador, que afinal foi libertado mediante o pagamento de resgate. Tal batalha acabou com o poderio bizantino na Ásia Menor. Os seljúcidas avançaram e fundaram um império que daria origem ao Sultanato de Rum, o primeiro império turco na Anatólia e predecessor do Império Otomano. Sob o governo do xá Malik (1055—1092) atingiram o seu auge. Em 1078 tomaram Jerusalém. A reação da cristandade à tomada de Jerusalém deu origem às famosas Cruzadas. 
Imperador Aleixo I Comneno
A dinastia Comnena (e Proto Comnena, 1057 a 1185) iniciou com uma grande tentativa de restauração do Império, enfrentando lutas contra os normandos, os seljúcidas, embora sem recursos humanos suficientes para recuperar os terrenos perdidos na Ásia Menor e sem poder avançar contra os últimos. Em 1095, enviados do imperador Aleixo falam com o Papa Urbano II sobre o sofrimento dos cristãos do Oriente, e ressaltam que sem a ajuda do Ocidente, eles continuariam a sofrer sob o domínio muçulmano. Como resposta, Urbano II convoca o Concílio de Clermont, e exorta os presentes a pegar em armas sob o signo da cruz, iniciando uma peregrinação armada para recuperar Jerusalém dos muçulmanos no Oriente. A resposta da Europa Ocidental foi esmagadora. Com a formação dessa “Primeira Cruzada”, Aleixo recuperou um número importante de cidades e ilhas e muito do oeste da Ásia Menor, marcando o fim da ameaça normanda durante o reinado de Aleixo I. Durante o reinado de Manuel I, ocorreu a formação da “Segunda Cruzada”, sempre com o objetivo de manter à distância os turcos otomanos e a sua aliança com o Reino Cruzado de Jerusalém (resultado da Primeira Cruzada), reforçando sua posição como senhor dos estados cruzados e aumentando consideravelmente os domínios do Império. Sob o governo Comneno o Bizâncio foi mais próspero do que em qualquer momento desde a invasão persa no século VII. Durante o século XII, os níveis da população elevaram-se e grandes novas extensões de terras agrícolas foram colocadas em produção. Evidências arqueológicas da Europa e Ásia Menor mostram um aumento considerável do tamanho dos assentamentos urbanos, juntamente com o aumento notável de novas cidades. O comércio também florescia: venezianos, genoveses e outros abriram as portas do mar Egeu para o comércio, o transporte de mercadorias dos reinos cruzados de Ultramar e do Egito do califado fatímida para o oeste, bem como o comércio com o império bizantino via Constantinopla. Em termos artísticos, houve um ressurgimento de mosaicos e as escolas regionais de arquitetura começaram a produzir estilos distintos que se basearam em uma série de influências culturais. 
Concílio de Clermont, origem da Primeira Cruzada
Ao final da dinastia Comnena, Andrônico I assumiu o trono através de um golpe de estado e suas medidas tomadas para reformar o governo do Império são elogiadas pelos historiadores, como acertadas e austeras, para eliminar a corrupção reinante, o que acabou por transformá-lo em um império de terror. Reincorporou ao Império alguns territórios, perdeu outros tantos, sofreu invasões dos turcos, da Armênia, dos húngaros e sérvios, além de sofrer atos de pirataria por parte de Veneza. Uma forte investida de Guilherme II da Normandia, com sua armada, acabou por causar a queda e o assassinato de Andrônico I em favor da ascensão de Isaac II Ângelo que iniciou a dinastia dos Ângelos (1185 a 1204). O seu reinado e, mais ainda, de seu irmão Aleixo III, viu o colapso do que restava da máquina do governo centralizado bizantino e da defesa. Embora, os normandos tenham sido expulsos da Grécia após uma derrota decisiva em setembro de 1085, em 1186 os valáquios (da Romênia) e os búlgaros começaram uma rebelião que levaria à formação do Segundo Império Búlgaro. A política interna dos Ângelo foi caracterizada pelo esbanjamento do tesouro público e uma má administração fiscal. A autoridade bizantina foi seriamente enfraquecida, e o vácuo crescente no poder central do império encorajou a fragmentação. De acordo com o historiador Alexandre Vasiliev, "a Dinastia Ângelo, gregos em sua origem, [...] acelerou a ruína do império, já enfraquecido com desunião interna". Esta dinastia assistiu à tomada de Constantinopla pela Quarta Cruzada, em abril de 1204 e ao seu saque pelos venezianos, em episódio que nunca foi totalmente esclarecido, mas no qual se envolveram todos os governantes do Império à época, restando o trono para Aleixo IV. Este acabou sendo assassinado e lhe sucedeu Aleixo V Ducas que acabou fugindo, deixando Constantinopla entregue agora ao Império Latino. Ao Império Bizantino restou apenas o domínio de Niceia, Trebizonda e Épiro, que se tornaram estados bizantinos sucessores. Destes, Épiro e Niceia ficaram com a melhor chance de recuperar Constantinopla e Teodoro I Láscaris, proclamado novo imperador, refugiou-se na cidade de Niceia (atual Iznik, na própria Turquia), de onde governou o Império Bizantino no exílio, iniciando a dinastia de Láscaris (1204 a 1258).

(1) O Concílio de Éfeso foi o terceiro Concílio Ecumênico (de caráter Universal) da história, realizado na cidade de mesmo nome, situada na costa ocidental da Ásia Menor, próxima à atual Selçuk, Turquia, no ano 431 DC. Tal Concílio condenou o Nestorianismo (de Nestório), que pregava a desunião entre as naturezas humana e divina de Cristo, como heresia, afirmando uma única natureza em Cristo (Monofisismo) e a maternidade divina de Maria. O Concílio seguinte, de Calcedônia, em 451, condenou o Monofisismo, afirmando o Diofisismo, unidade das duas naturezas (humana e divina) completas e perfeitas em Cristo.

Conclui na Parte 11.

domingo, 14 de julho de 2013

BREVE HISTÓRIA DO IMPÉRIO ROMANO - PARTE 8

V.1.2 – A Crise do Terceiro Século

Este foi o nome dado a uma série de acontecimentos catastróficos ocorridos no Império Romano ao longo do Século III, mais precisamente do ano 235 ao ano 284. Neste período, o império foi governado sucessivamente por cerca de dezoito imperadores "legítimos" (ver o anexo “Imperadores do Principado”). A maioria deles era de proeminentes generais que assumiram o poder imperial sobre todo ou parte do império, somente para perdê-lo por derrota em combate, assassinato, ou morte natural, governando, em média, apenas dois a três anos. O número exato de imperadores do período é desconhecido, pois não considera os nomeados junto com pais e colegas, além de desconsiderar os pretendentes.
Ao final do século II, uma guerra civil de sucessão aconteceu, que abalou profundamente o império. Na primeira metade do século seguinte, o império se manteve próspero e extenso, até que o poderoso Império Sassânida(1), ao leste, iniciou ataques ao Império Romano. No ano 260, foram capturados o imperador Valeriano e todo o seu exército de 70 mil homens e, sem muita defesa, as províncias do leste foram devastadas. A peste bubônica espalhou-se pelo império tornando-se uma epidemia. Além desses problemas, o Império Romano ainda iria se deparar com outro poderoso inimigo ao norte, os godos, povo de origem germânica, das regiões meridionais da Escandinávia. O avanço da peste e os fracassos militares do império eram tão frustrantes que o povo passou a buscar novas crenças e rituais para afastar os perigos, ao mesmo tempo em que se intensificou a perseguição aos cristãos, sempre culpados do infortúnio do momento.
Uma característica marcante observada na crise do terceiro século foi a fraqueza demonstrada pelos imperadores em manter, de forma prolongada, o controle sobre o império. Essa série de imperadores fracos foi, de certa forma, um reflexo da extensa militarização do império. Em outras palavras, Roma foi abandonando gradativamente seu caráter aristocrático, percebido anteriormente nos poderes investidos ao senado romano, para tornar-se um império militar. Esse processo de enfraquecimento do senado romano foi acompanhado pelo fortalecimento, cada vez maior, das legiões romanas nas decisões relativas à escolha dos imperadores, em função de seus interesses imediatos e, por consequência, na administração do império. Isso levou, inevitavelmente, à escolha de imperadores despreparados e incompetentes.
Foi também durante a “Crise do Terceiro Século” que algumas das Províncias Romanas efetivaram rebeliões contra o governo central e que mencionaremos de passagem, considerando que os imperadores que surgiram com essas rebeliões constam da “Relação dos Imperadores do Principado”. 
Império das Gallias (verde) e Palmira (amarelo) no Império Romano (vermelho)

a) O Império das Gallias
O Império das Gálias (em latim Imperium Galliarum) é o nome moderno dado à secessão das províncias romanas da Gália, Britânia, parte de Hispânia e parte de Germânia, do Império Romano durante a “Crise do Terceiro Século”, de 259 a 274, também conhecido como Império Galo-Romano.
Seu fundador, Marco Cassiano Latínio Póstumo, estabeleceu a capital do Império em Trier, no atual estado alemão da Renânia-Palatinado.
Imperador Póstumo
Em seu trono sucederam-se uma série de usurpadores que se proclamaram imperadores romanos e são conhecidos principalmente pelas moedas que cunharam. O imperador romano da época, Galiano, empreendia uma campanha contra os marcomanos(2)  no médio Danúbio, enquanto o general Póstumo assumia a defesa da Récia (província romana na atual Suíça). O general aproveitou-se dessa posição e assumiu o trono imperial na Gália. O estabelecimento do Império das Gálias proporcionou uma resposta mais eficaz às invasões germânicas do que poderia oferecer o imperador Galiano, ocupado com a fronteira no leste e no Danúbio.
O império das Gálias foi recuperado para Roma pelo imperador Aureliano, que com uma série de campanhas militares conseguiu restabelecer o poder imperial no Ocidente e também no Oriente, onde havia sido proclamado o Reino de Palmira. 
Imperador Galiano

b) O Império de Palmira
A Palmira (hoje chamada de Tadmor) era uma antiga cidade na Síria central, localizada num oásis a cerca de 210 km a nordeste de Damasco. Sua localização estratégica, aproximadamente ao meio da distância que vai do Mar Mediterrâneo até ao rio Eufrates, tornou-a um ponto de paragem obrigatório para muitas das caravanas que seguiam por aí a sua rota comercial. O nome "Palmira" refere-se, tal como o prenome feminino, às palmeiras, árvore que, supostamente, existiria aí em grande quantidade.
Palmira tornou-se parte da província romana da Síria durante o reinado de Tibério (14 a 37 DC). A cidade continuou a desenvolver-se e a ganhar importância até que se tornou uma cidade livre, sob o império de Adriano, em 129. No século III, a sua rainha, Septímia Zenóbia criou alguns embaraços ao Império Romano ao autoproclamar-se rainha do reino de Palmira (Império de Palmira); mas em 272, o imperador romano Aureliano capturou-a e levou-a para Roma. Depois de expô-la numa parada triunfal, acorrentada a cadeias de ouro, permitiu-lhe que se retirasse para uma vila em Tibur (hoje, Tivoli, Itália) onde continuou a ter um papel politicamente ativo, durante anos. 
Imperador Aureliano

c) Imperadores Ilírios
Não se tratando propriamente de uma dinastia, é antes de tudo um conjunto de imperadores romanos que, devido à sua origem comum, ficaram conhecidos como "Ilírios". A Ilíria é uma região histórica que corresponde, aproximadamente, à antiga Iugoslávia no período entre 268 e 285. Os imperadores Ilírios ficaram famosos também por serem quase todos militares. Com Cláudio II, o Gótico (268-270), inaugura-se precisamente essa época, em que quase todos os imperadores provinham da Ilíria, que compreendia a Dalmácia, região fortemente romanizada na costa do Adriático e toda a área montanhosa adjacente, também indelevelmente marcada pela ação civilizadora romana. Apesar da escassa duração deste período Ilírio, conseguiu-se nessa época restabelecer, pela força, a unidade do Império, então muito abalada. A sucessão desses imperadores pode ser vista na relação anexa (Imperadores do Principado). Os Ilírios foram, de fato, os últimos imperadores da unidade e da afirmação da coesão do Império, que não lhes sobreviveu como unidade geopolítica una e indivisível.
Com a crise do terceiro século, começaram as transformações que, mais de um século depois, levariam ao fim do período histórico conhecido como Antiguidade e o início da Idade Média. Foram os sucessos de Aureliano que, efetivamente, encerraram a Crise do Terceiro Século do Império Romano, rendendo-lhe o título de “Restaurador do Mundo”.

V.2 – O DOMINATO

O Dominato, palavra que se origina de dominus (senhor), é o período do Império Romano que vai de 284 DC, com Diocleciano, a 565 DC, data da morte de Justiniano. O Dominato foi uma monarquia despótica e militar, do tipo helenístico, sob a influência de ideias orientais, em que o princeps converteu-se em dominus, isto é, em amo ou governante absoluto, à frente de uma grande burocracia. Durante o Dominato, os imperadores mostravam claramente a sua condição, usando coroas, púrpuras e outros ornamentos imperiais. O imperador tornava-se "senhor e deus" e todos que eram admitidos em sua presença eram obrigados a ajoelhar-se e beijar a ponta do manto real. Extinguiu-se, com isso, o Principado: os civis haviam sido derrotados pelos militares.
O cargo de princeps já trazia, na realidade, o germe da situação de Dominato: fatos como a “apoteose” dos imperadores, o poder sem limites, e o lento declinar, por parte dos Romanos, da importância que davam a vida política entre iguais, contribuíram, de forma decisiva, para a adoção de uma monarquia oriental, especialmente bem sucedida no Império Romano do Oriente. 
Imperador Diocleciano
Durante o Dominato persistiram as dinastias (“Anexo 2 - Imperadores do Dominato”), que se iniciou com Diocleciano, em 284 DC e a sua constituição da Tetrarquia, em 293 DC. A Tetrarquia designa qualquer sistema de governo em que o poder esteja dividido entre quatro indivíduos, denominados "tetrarcas", e aplica-se, usualmente, à introduzida por Diocleciano, que perdurou até 313 DC, marcando a resolução da crise do século III e a recuperação do Império Romano.
A primeira medida importante de Diocleciano foi indicar Maximiano como seu augusto ou co-imperador, em 285. Não foi propriamente uma divisão de poder, pois, na realidade, Diocleciano estava em posição superior à de Maximiano; entretanto, a partir daí, o império passou a ter dois augustos (augusti), cada qual com exército, administração e capital próprios, embora Diocleciano continuasse a ser o chefe do Estado, representando a unidade do mundo romano. Com isso, o império foi dividido entre os sectores orientais (pars Orientis), sob o controle pessoal de Diocleciano, e ocidentais (pars Occidentis), governados por Maximiano. 
Imperador Maximiano
Oito anos mais tarde, em 293, dada a crescente dificuldade de conter as numerosas revoltas no interior do império, procedeu a uma nova divisão funcional e territorial, a fim de facilitar as operações militares: nomeou um imperador menos "graduado", denominado César, subordinado a cada imperador mais graduado (augusto). Como seu césar para o oriente, Diocleciano designou Galério; Maximiano fez o mesmo, nomeando Constâncio Cloro para o ocidente. A tetrarquia concretizou-se com a divisão do império em quatro territórios:
Diocleciano controlava as províncias orientais e o Egito, com capital na Nicomédia (atual İzmit, na Turquia);
Galério administrava as províncias balcânicas, com capital em Sirmium (atual Sremska Mitrovica, na Sérvia);
Maximiano governava a Itália e a África Proconsular, com a capital em Mediolanum (atual Milão, na Itália); 
Imperador Galerio
Constâncio Cloro, pai de Constantino I, recebeu a Hispânia, a Gália e a Britânia, com capital em Augusta Treverorum (atual Trier ou Tréveris, na Alemanha).
Os césares eram chefes militares capazes de governar e proteger o império, adotados como filhos pelos augustos, a quem sucederiam em caso de morte, de incapacidade provocada pela velhice ou decorridos vinte anos de seus governos. Lugares-tenentes dos augustos, os césares também possuíam capital, exército e administração próprios.
Com a abdicação de Diocleciano (305), teve início uma guerra entre os augustos e os césares por ele nomeados e a anarquia se instaurou. De 316 a 323, Constantino e Licínio governaram Roma. A partir de 324, Constantino passou a ser o único senhor de todo o império, valendo à pena escrevermos algumas linhas sobre ele, por razões que logo serão entendidas.
Imperador Constâncio Cloro
Constantino I, também conhecido como Constantino Magno ou Constantino, o Grande, foi um imperador romano, proclamado Augusto pelas suas tropas em 25 de julho de 306, que governou uma porção crescente do Império Romano até a sua morte.
Quando Diocleciano e Maximiano abdicaram conjuntamente em 305, Constâncio (pai de Constantino) seria proclamado “augusto”, mas Constantino seria descartado como “césar” em proveito de Flávio Severo. Pouco antes da morte de seu pai, em 25 de julho de 306, Constantino conseguiu a permissão de Galério para reunir-se a ele no Ocidente, onde participou de campanha contra os “picts”, estando junto ao leito de morte de seu pai na Britânia, o que lhe permitiu impor o princípio da hereditariedade em seu proveito, proclamando-se "césar" e sendo reconhecido como tal por Galério, então "augusto" do Oriente. Assim, desde o início de seu reinado, Constantino tinha o controle da Britânia,Gália,Germânia e Hispânia, com sua capital em Trier, cidade que fez embelezar e fortificar. 
Imperador Constantino I
As guerras civis constantes e prolongadas fizeram de Constantino, antes de mais nada, um reformador militar, que, para aumentar o número de tropas a sua disposição imediata, constituiu o cortejo militar do imperador (comitatus) num corpo de tropas de elite auto suficiente - um verdadeiro exército de campanha —, principalmente pelo recrutamento de grande número de germanos que se apresentavam ao exército romano nos termos de diversos tratados de paz, a começar pelo chefe dos alamanos, Chrocus, que teve um papel decisivo na aclamação de Constantino como Augusto.
Constantino acabou, no entanto, por entrar na História como o primeiro imperador romano a professar o cristianismo, na sequência da sua vitória sobre o imperador Magêncio na Batalha da Ponte Mílvio, próximo de Roma, em 312, que ele mais tarde atribuiria ao Deus cristão. Constantino legalizou e apoiou fortemente a cristandade por volta do tempo em que se tornou imperador, com o Édito de Milão (3), sem tornar o paganismo ilegal ou fazer do cristianismo a religião estatal única. Na sua posição de Pontifex Maximus, estabeleceu as condições do seu exercício público e interferiu na organização da hierarquia, quando convocado.
Quando Licínio expulsou os funcionários cristãos da sua corte, Constantino encontrou um pretexto para enfrentar seu colega e, tendo negada a permissão para entrar no Império do Oriente, durante uma campanha contra os sármatas, fez disto a razão para derrotar e eliminar Licínio em 324, quando tornou-se imperador único.
Apesar de a Igreja ter prosperado sob o auspício de Constantino, ela própria decaiu no primeiro de muitos cismas públicos. Após ter unificado o mundo romano, Constantino convocou o “Primeiro Concílio de Niceia” (4), em um grande centro urbano da parte oriental do império, em 325, um ano depois da queda de Licínio, a fim de unificar a Igreja cristã, pois com as divergências desta, o seu trono poderia ficar ameaçado.
Para resolver definitivamente o problema logístico da distância entre a capital e as principais frentes militares da época, sem recorrer ao expediente de uma residência imperial "interina", Constantino reconstruiu a antiga cidade grega de Bizâncio, em maio de 330 chamando-a Nova Roma, dotando-a de um Senado e instituições cívicas semelhantes aos da antiga Roma. Entretanto, era uma cidade cristã onde encontrava-se o mausoléu onde Constantino seria sepultado. Os templos pagãos de Bizâncio foram nela preservados, mas foram proibidos os sacrifícios e o culto das imagens dos deuses. Após a morte de Constantino, Bizâncio foi renomeada Constantinopla – em sua homenagem -, gradualmente transformando-se na capital permanente do império romano, por mais de mil anos, sendo por isso considerado como um dos fundadores do Império Romano do Oriente. A fundação de Constantinopla foi complementada pelo tratado entre Constantino e seus descendentes e os godos que, a partir de 332, passaram a defender a fronteira do Danúbio, fornecendo homens ao exército romano, em troca de abastecimentos. A mudança da capital imperial enfraqueceu a influência do papado de Roma, fortalecendo a influência do bispo de Constantinopla sobre o Oriente, um dos eventos notáveis que provocaria, futuramente, o Grande Cisma do Oriente (5).
Além de derrotar os imperadores Magêncio e Licínio durante as guerras civis, Constantino lutou com sucesso contra os francos e alamanos, visigodos e sármatas, durante boa parte do seu reinado.
Constantino foi sucedido, em 337, por seus três filhos com sua esposa Fausta: Constantino II, Constante e Constâncio II, que dividiram entre si a administração do império até que, após uma série de lutas confusas, Constâncio II emergiu como “augusto” único.
Durante as décadas das dinastias Constantina e Valentiniana que se seguiram, o império foi dividido ao longo de um eixo leste-oeste, com dois centros de poder, um em Constantinopla e outro em Roma (logo falaremos sobre isso com mais detalhe). O reinado de Juliano, que tentou restaurar a religião helenística e romana clássica, apenas interrompeu, brevemente, a sucessão de imperadores cristãos. Teodósio I, que sucedeu à casa Valentiniana, o último imperador a governar Oriente e o Ocidente, em Constantinopla, morreu em 395 D.C., depois de, efetivamente, tornar o Cristianismo a religião oficial do Estado.

(1) O Império Sassânida foi o último Império Persa pré-islâmico, governado pela dinastia sassânida de 224 a 651 DC. O Império Sassânida, que sucedeu ao Império Parta, foi reconhecido como uma das principais potências da Ásia Ocidental e Central, juntamente com o Império Romano/Bizantino, por um período de mais de 400 anos.
(2) Os marcomanos constituíam uma tribo germânica com estreitas ligações aos suevos e que habitavam a região sul do rio Danúbio. As fontes romanas indicam que, no início da era cristã, as tribos marcomanas se estabeleceram na atual Boêmia, depois de terem sido derrotadas por Nero Cláudio Druso, general do imperador romano Augusto. No século II DC, os marcomanos federaram-se com outros povos (quados, vândalos e sármatas) para enfrentar o Império Romano. Sendo essencialmente guerreiros, os marcomanos empregavam também mulheres em combates.
(3) O Édito de Milão (313 DC), também referenciado como Édito da Tolerância, declarava que o Império Romano seria neutro em relação ao credo religioso, acabando oficialmente com toda perseguição sancionada oficialmente, especialmente do Cristianismo. O édito foi emitido em Milão, pelo tetrarca ocidental Constantino I e por Licínio, o tetrarca Oriental.

(4) O Primeiro Concílio de Niceia foi um concílio de bispos cristãos reunidos na cidade de Niceia da Bitínia (atual İznik, Turquia), pelo imperador romano Constantino I em 325 DC. O concílio foi a primeira tentativa de obter um consenso da igreja através de uma assembleia representando toda a cristandade. O seu principal feito foi o estabelecimento da questão cristológica entre Jesus e Deus, o Pai; a construção da primeira parte do Credo Niceno (credo ou profissão de fé, mais utilizado na liturgia cristã); a fixação da data da Páscoa; e a promulgação da lei canônica (lei eclesiástica interna que rege as Igrejas Cristãs).
(5) O Cisma do Oriente, também chamado de Grande Cisma ou Cisma Ocidente-Oriente, foi a divisão definitiva da “Igreja Católica Apostólica” em “Igreja Católica Apostólica Romana” e “Igreja Ortodoxa”. O cisma ocorreu no ano de 1054, na cidade de Constantinopla.



Continua na Parte 9.