Homenagem ao lendário herói ancestral dos ingleses que deu título a um dos considerados "Cem Maiores Livros do Mundo" e tido como o mais antigo escrito em "Old English".

sexta-feira, 17 de maio de 2019

CHARLES AZNAVOUR

INTRODUÇÃO

No dia 1º de outubro do ano de 2018, há pouco findo, com a idade de 94 anos, morreu Charles Aznavour, o pequeno grande armênio mais francês que o mundo já produziu. Infelizmente, não pude dar ao evento, à época, a importância merecida, por estar envolvido com as eleições próximas para presidente do Brasil. Logo em seguida, outro mito da música popular, Michel Legrand partiu para oferecer suas composições a Deus, que será, sem dúvida, o seu maior ouvinte; e para não deixar outro postergado, ocupei-me do último, em primeiro lugar.
Atrasado, portanto, presto agora a minha insignificante homenagem a esta imensa personagem da música internacional. Não vou aqui falar das honrarias, medalhas, premiações e cargos que recebeu e ocupou Charles Aznavour, mas apenas contar um pouco do que foi e das músicas que fez. Muito, mas muito mesmo, dancei sob o som de suas canções maravilhosas, num tempo em que mesmo os jovens escutavam boas músicas, brasileiras e de muitas nações, sem discriminação e sem incorrerem no perigo de parecer “politicamente incorretos”. Eram, de fato, outros tempos ...
Charles Aznavour, nascido Shahnour Vaghinag Aznavourian, em 22 de maio de 1924, foi um cantor, letrista e diplomata francês-armênio, conhecido por sua especial voz de tenor: clara e vibrante nos seus trechos superiores, com graves e profundas notas baixas. Numa carreira de compositor, cantor, letrista, que durou mais de 70 anos, gravou mais de 1.200 canções, interpretadas em nove línguas. Além disso, escreveu ou co-escreveu mais de 1.000 canções para si e para outros.
Foi um dos mais populares e duradouros cantores da França. Vendeu mais de 180 milhões de discos durante sua vida e foi por alguns chamado o “Frank Sinatra francês”, ao passo que o crítico musical Stephen Holden descreveu Aznavour como uma “deidade popular francesa”. Em 1998 foi chamado “Apresentador do Século” pela CNN e por usuários de todo o mundo do “Time Online”. Foi reconhecido como o mais relevante cantor do século com quase 18% dos votos totais, desclassificando, entre outros, Elvis Presley e Bob Dylan. Aznavour cantou para presidentes, papas e a realeza, bem como em eventos humanitários. Em resposta ao terremoto de 1988 na Armênia, ele fundou, com seu antigo amigo e empresário Levon Sayan, a organização de caridade “Aznavour para a Armênia”. Em 2009 foi indicado embaixador da Armênia para a Suiça, bem como delegado permanente da Armênia para as Nações Unidas, em Genebra.
Iniciou seu último tour em 2014 e em 24 de agosto de 2017 recebeu a 2.618ª estrela da Calçada da Fama de Hollywood. No mesmo ano, ele e sua irmã foram agraciados com a “Medalha Raoul Wallenberg”, através de uma declaração emitida por Reuven Rivlin, presidente de Israel, por abrigar judeus, armênios e outros refugiados durante a Segunda Guerra Mundial, com risco das próprias vidas. Seu último concerto teve lugar no NHK Hall, em Osaka, em 19 de setembro de 2018.

INÍCIO DA VIDA E CARREIRA

Filho de artistas imigrantes armênios, Charles Aznavour nasceu em Paris, de Michael Aznavourian e Knar Baghdasarian. Seu pai cantava em restaurantes franceses antes de estabelecer um restaurante caucasiano chamado “Le Caucase”. Seus pais o estimularam a cantar desde muito novo e ele deixou a escola com nove anos de idade, adotando o nome de palco, Aznavour.
Aznavour já era familiarizado com apresentações no palco ao tempo em que iniciou sua carreira como músico. Com nove anos de idade ele teve alguns papéis numa peça chamada “Um Petit Diable à Paris” (Um Pequeno Diabo em Paris) e num filme intitulado “La Guerre des Gosses” (A Guerra dos Moleques). Aznavour virou-se então para a dança profissional, apresentando-se em vários clubes noturnos. Em 1944, ele e um ator, Pierre Roche, iniciaram uma parceria e, em esforços colaborativos, apresentaram-se em outros numerosos clubes. Foi com essa parceria que Aznavour começou a escrever suas canções e a cantá-las. Os primeiros sucessos da parceria foram no Canadá, entre 1948 e 1950, quando Aznavour escreveu sua primeira canção, intitulada “J’ai Bu” (Eu Bebi).
Nos primeiros tempos de sua carreira, Aznavour abriu para Edith Piaf, no Moulin Rouge, quando ela o aconselhou a insistir em sua carreira como cantor, ajudando-o a desenvolver uma distintiva voz que estimulava a melhor de suas habilidades.
Algumas vezes descrito como “Frank Sinatra da França”, Aznavour frequentemente cantava sobre o amor. Escreveu ou co-escreveu musicais, mais de mil músicas e gravou noventa e um álbuns em estúdio. A voz de Aznavour variava em direção ao alcance do tenor, mas possuía o alcance e a coloração baixa mais típica do barítono, contribuindo ao seu som único. Falava e cantava em várias línguas - francês, inglês, italiano, espanhol, alemão, russo, armênio e napolitano -, o que muito o ajudou a apresentar-se no Carnegie Hall, Estados Unidos, bem como eu outros importantes locais em todo o mundo. Também gravou pelo menos uma canção do poeta armênio do século XVIII, Sayat-Nova e uma canção popular, “Im Yare”, em armênio. A melodia “Que c’est triste Venise”, cantada em francês, italiano, espanhol, inglês e alemão, teve muito sucesso nos anos ’60.
Charles Aznavour em 1963
Em 1974 Aznavour tornou-se um grande sucesso no Reino Unido, quando sua canção “She” foi número 1 no “UK Singles Chart” por quatro semanas numa sequência de quatorze semanas. Sua outra mais conhecida canção no Reino Unido, foi “The old fashioned way”, que permaneceu nos quadros do Reino Unido por 15 semanas.
Artistas que gravaram suas canções e colaboraram com Aznavour, incluem Edith Piaf, Fred Astaire, Frank Sinatra (Aznavour foi um dos raros cantores europeus convidados para cantar em dueto com ele), Andrea Bocelli, Bing Crosby, Ray Charles, Bob Dylan (que citou Aznavour entre ao maiores cantores vivos que ele jamais tinha visto), Dusty Springfield, Liza Minnelli, Mia Martini, Elton John, Dalida, Serge Gainsbourg, Josh Groban, Petula Clark, Tom Jones, Shirley Bassey, José Carreras, Laura Pausini, Nana Mouskouri e Julio Iglesias. Sua colega francesa, a cantora popular Mireille Mathieu, cantou e gravou com Aznavour em numerosas ocasiões. O cantor inglês Marc Almond, apontado por Aznavour como o intérprete favorito de suas canções, que o cobriu em seu “What makes a man”, nos anos ’90, o declarou como uma das principais influências do seu estilo e trabalho. Em 1974, Jack Jones registrou um álbum inteiro com composições de Aznavour intitulado “Write me a love song, Charlie” (Escreva-me uma canção de amor, Charlie), regravado em CD em 2006. Dois anos mais tarde a cantora holandesa Liesbeth List lançou seu álbum “Charles Aznavour Apresenta Liesbeth List”, em que apresentou composições de Aznavour com letras em inglês. Aznavour e o tenor italiano Luciano Pavarotti cantaram juntos a “Ave Maria” de Bach-Gounod. Apresentou-se também com o amigo violoncelista russo Mstislav Rostropovich, na posse da presidência francesa da União Europeia, em 1955. Elvis Costello gravou sua composição “She” para o filme “Notting Hill”. Um dos maiores amigos e colaboradores de Aznavour na indústria da música foi o tenor Plácido Domingo, que muitas vezes apresentou seus sucessos, principalmente uma gravação solo de “Les bateaux sont partis”, em 1985 e versões em dueto da canção, em francês e espanhol, em 2008, bem como várias apresentações da “Ave Maria” de Aznavour. Em 1994, Aznavour apresentou-se com Placido Domingo e a soprano norueguesa Sissel Kyrjebo no terceiro concerto anual “Christmas in Vienna”; nesse concerto, televisionado para todo o mundo e lançado em CD, internacionalmente, os três cantores apresentaram uma variedade de canções de Natal, medleys e duetos.
Em 1998, quando a CNN e a Time pediram ao público americano para votar em seu apresentador favorito do século XX, Charles Aznavour despontou em primeiro lugar, à frente de Frank Sinatra e Elvis Presley! O cantor francês via os Estados Unidos como o seu terceiro lar. Viveu na California e Connecticut por algum tempo, teve um romance secreto com a cantora Liza Minnelli e casou com sua terceira esposa em Las Vegas. Em reconhecimento a uma carreira que se estendeu por quase 80 anos, durante a qual gravou cerca de 1.400 canções e 390 álbuns, Charles Aznavour recebeu uma estrela na Hollywood Boulevard, em agosto de 2017, com a placa de número 6.225, ao lado da atriz Bette Davis. “Os Estados Unidos e eu temos compartilhado um romance de longa duração”, declarou o "Sinatra Francês" numa entrevista à revista “France – Amérique”, em 2009, antes de admitir, “Eu não falo inglês tão bem quanto gostaria, mas adoro cantar em inglês”.
Aznavour em New York, em 1965
No início do outono de 2006, Aznavour iniciou sua turnê de despedida, apresentando-se nos Estados Unidos e Canadá, com fantásticas audiências. Iniciou o ano de 2007 com concertos pelo Japão e toda a Ásia. Em 30 de setembro de 2006 realizou um importante concerto em Yerevan, capital da Armênia, parta iniciar a estação cultural “Armênia minha amiga”. O presidente armênio Robert Kocharyan e o francês Jacques Chirac, estavam na primeira fila de espectadores. Ainda em 2006, Aznavour gravou seu álbum “Colore ma vie”, em Cuba, com Chucho Valdés, conhecido pianista, compositor e líder de orquestra cubano. Convidado regular do “Star Academy” (importante programa de calouros), Aznavour cantou junto com o candidato Cyril Cinélu, no mesmo ano. Em 2007 ele cantou parte de “Une vie d’amour”, em russo, durante um concerto em Moscou. A segunda metade de 2007 viu Aznavour retornar a Paris para mais de 20 shows no “Palais de Congrés”, seguidos de outros concertos na Bélgica, Holanda e o resto da França. “Forever Cool” um álbum deste ano, da Capitol/EMI, apresenta Aznavour cantando um novo dueto de “Everybody loves somebody sometime”, com a voz de Dean Martin. Encerrou uma turnê em Portugal em fevereiro de 2008 e por toda a primavera deste ano se apresentou pela América do Sul, realizando muitos concertos na Argentina, Brasil, Chile e Uruguai. Admirador de Quebec e Montreal - onde se apresentou em casas noturnas antes de se tornar famoso -, ajudou a carreira da cantora lírica Lynda Lemay, de Quebec, na França e possuía uma casa em Montreal. Em julho de 2008 foi investido na “Ordem do Canadá”. Em seguida, apresentou-se nas “Plains of Abraham” (área histórica da cidade), como personagem da celebração dos 400 anos de fundação da cidade de Quebec. Ainda em 2008, lançou o álbum de duetos “Duos”, num esforço colaborativo de Aznavour com seus grandes amigos e colaboradores ao longo de sua carreira, incluindo Céline Dion, Sting, Laura Pausini, Josh Groban, Paul Anka, Plácido Domingo e outros, durante dezembro de 2008, em todo o mundo. Seu álbum seguinte, “Charles Aznavour and the Clayton Hamilton Jazz Orchestra” (anteriormente conhecido como Jazznavour 2), foi uma continuação na mesma linha do seu sucesso “Jazznavour”, lançado em 1998, com novos arranjos de suas canções clássicas; lançado em 27 de novembro de 2009. No mesmo ano, Aznavour também se apresentou pela América na turnê chamada “Aznavour en liberté”, iniciando ao final de abril com uma série de concertos pelos Estados Unidos, Canadá, América Latina e EUA novamente.
Aznavour, Festival de Cannes, 1999
Aznavour e a cantora senegalesa Yousson N’Dour, com a colaboração de mais de 40 cantores e músicos franceses, gravaram um vídeo com o grupo musical “Band Aid”, após o catastrófico tremor de terra de 2010 no Haiti, intitulado “1º Geste pour Haiti Chérie”. Em agosto de 2011 Aznavour lançou o novo álbum “Aznavour Toujours”, apresentando onze novas canções e “Elle”, uma versão francesa do seu sucesso internacional “She”. Após este, o Aznavour de 87 anos de idade iniciou uma turnê pela França e Europa, chamada “Charles Aznavour en toute intimité” que iniciou com 21 concertos no teatro Olympia, em Paris. Em 12 de dezembro de 2011 deu um concerto no “State Kremlin Palace”, Moscou, com capacidade esgotada, ao qual seguiria uma ovação de 15 minutos. Em 2012 ele embarcou para outra turnê na América do Norte, com o mesmo show, visitando Quebec e o Anfiteatro Gibson em Los Angeles, terceiro maior teatro da California para shows múltiplos. Em 16 de agosto de 2012 Aznavour se apresentou na cidade natal de seu pai, Akhaltsikhe, na Georgia, num concerto especial, parte da cerimônia de abertura do recém restaurado Castelo Rabati.
Charles Aznavour em 2014
Em novembro de 2013 Aznavour apresentou-se, pela primeira vez em 25 anos, em Londres, no “Royal Albert Hall”, quando a demanda foi tão alta que tiveram que marcar um segundo concerto no mesmo local para junho de 2014. Em novembro de 2013, Aznavour apresentou-se com Achinoam Nini (Noa) em um concerto dedicado à paz, no “Nokia Arena”, Tel Aviv, com a presença do Presidente israelense Shimon Peres. Em dezembro de 2013 Aznavour deu dois concertos na Holanda, no “Heineken Music Hall”, Amsterdan e novamente em janeiro de 2016. Em 2014, 2015 e 2016 Aznavour prosseguiu com sua turnê internacional, incluindo concertos em Bruxelas, Berlim, Frankfurt, Barcelona, Madri, Varsóvia, Praga, Moscou, Bucareste, Antuérpia, Londres, Dubai, Montreal, Nova York, Boston, Miami, Los Angeles, Osaka, Tóquio, Lisboa, Mônaco, Verona, Amsterdan e Paris. Em 2017 e 2018, sua turnê continuou em São Paulo, Rio de Janeiro, Santiago, Buenos Aires, Moscou, Viena, Sydney, Melbourne, Haiti, Tóqio, Osaka, Madri, Milão, Roma, São Petersburgo, Paris, Londres, Amsterdan e Mônaco. Em 19 de setembro de 2018, seu último concerto teve lugar no “NHK Hall”, Osaka, Japão.
Aos 94 anos, seus quase 80 anos de palco o tornaram um pouco ruim de audição. Nos seus anos finais ainda cantaria em várias línguas e sem permanente uso de “ponto”, em geral se mantendo no inglês e francês, com italiano e espanhol menos frequentemente, na maior parte dos seus concertos. Além de cantor, Charles Aznavour teve uma longa e variada carreira paralela de ator, aparecendo em mais de oitenta filmes para o cinema e a televisão.
Charles Aznavour foi casado três vezes: Megan Rugel, de 1946 a 1952; Evelyn Plessis, de 1956 a 1960; e Ulla Thorsell, de 1967 a 2018. Destes casamentos, resultaram cinco filhos: Séda, Patrick, Katia, Mischa e Nicolas. Costumava fazer piadas do seu físico, a maior parte delas sobre sua estatura de 1,60 m. Fazia dela um humor autodepreciativo, ao longo dos anos.

POLÍTICA E ATIVISMO

Desde o terremoto de 1988 na Armênia, Aznavour ajudou o seu país com o programa “Aznavour pour Arménie”. Com seu cunhado e coautor Georges Garvarentz, ele escreveu a canção “Pour toi Armenie” que foi apresentada por um grupo de artistas franceses famosos e permaneceu nos quadros por dezoito semanas. Há uma praça com o seu nome na Yerevan (capital e maior cidade da Armênia) central, rua Abovian e uma estátua sua construída em Gyumri (segunda maior cidade da Armênia), que viu a maior parte das vidas perdidas no terremoto. Em 1995 Aznavour foi indicado como Embaixador e Delegado permanente da Armênia para a UNESCO. Foi também um membro do Corpo de Consignatários do Fundo para a Armênia, organização que arrecadou mais de 150 milhões de dólares em ajuda humanitária e assistência para desenvolvimento de infraestrutura para a Armênia, desde 1992. Em 1997 ele foi indicado como Oficial da Legião de Honra, a mais alta ordem do mérito francês. Em 2002 Aznavour apareceu no aclamado filme “Ararat”, do diretor Atom Egoyan, sobre o genocídio dos armênios pelo Império Otomano, no início do século XX. Em 2004 Aznavour recebeu o título de “Herói Nacional da Armênia”, a mais alta comenda daquele país. Em 26 de dezembro de 2008, o presidente da Armênia, Serzh Sargsyan, assinou um decreto presidencial para concessão da cidadania da Armênia a Aznavour, a quem ele chamou de “proeminente cantor e figura pública” e “um herói do povo armênio”. Em 2011 foi inaugurado, em Yerevan, Armênia, o Museu Charles Aznavour. Em abril de 2016, Aznavour visitou a Armênia para participar da cerimônia de entrega do prêmio “Aurora Prize for Awakening Humanity”, prêmio humanitário internacional anual que reconhece indivíduos e organizações por trabalhos humanitários, em favor dos sobreviventes do genocídio armênio. Em 24 de abril, junto com Serzh Sargsyan, os católicos de “All Armenians”, sua Santidade Karekin II, chefe supremo da Igreja Apostólica Armênia, e o ator George Clooney, ele depositou flores no “Memorial do Genocídio Armênio”.
Estátua de Aznavour em Gyumri, Armênia
Além de sustentar o título, mormente cerimonial, de embaixador francês à distância para a Armênia, Aznavour concordou em manter a posição de Embaixador da Armênia para a Suíça, em fevereiro de 2009, quando teria declarado: “Inicialmente eu hesitei, pois não é tarefa fácil. Então pensei que o que é importante para a Armênia é também importante para nós. E então aceitei a proposta com amor, felicidade e um sentimento de profunda dignidade”. Escreveu uma canção sobre o Genocídio Armênio, intitulada “Ils sont tombés” (Eles tombaram).
À medida que sua carreira progredia, Aznavour envolvia-se fortemente na política armênia e internacional. Durante as eleições presidenciáveis francesas de 2002, quando o candidato de extrema direita nacionalista Jean-Marie Le Pen, da Frente Nacional, passou nas eleições preparatórias, para enfrentar Jacques Chirac, Aznavour assinou a petição “Vive la France” e convidou todos os franceses a cantar a Marselhesa em protesto. Chirac, um amigo pessoal de Aznavour, acabou vencendo a eleição numa vitória esmagadora, com mais de 82% dos votos.
Fez campanhas frequentes para uma reforma da lei internacional de direitos autorais. Em novembro de 2005 ele encontrou-se com o Presidente da Comissão Europeia, José Manuel Barroso para discutir a questão da revisão do termo de proteção para artistas e produtores na União Europeia, advogando uma extensão do termo de proteção da União Europeia, dos atuais 50 anos, para a lei dos EUA, que prega 95 anos, dizendo que “em termos de proteção, artistas e companhias gravadoras têm o mesmo pensamento. A extensão do termo de proteção seria boa à cultura europeia, positiva para a economia europeia e poria um fim à atual discriminação com os EUA.” Também enfrentou notavelmente a política francesa Christine Boutin no que concerne à sua defesa de uma autorização de taxa constante, tipo “licença global” para o uso de arquivos ainda protegidos, na internet, argumentando que a licença eliminaria a criatividade. Em maio de 2009 o Senado Francês aprovou um dos mais estritos projetos contra a pirataria na internet jamais visto antes, com uma das mais arrasadoras votações, de 189 contra 14. Aznavour foi um proponente vocal da medida e considerou-a uma vitória de porte.

MORTE E FUNERAIS

Em abril de 2018, logo após completar o seu 94º aniversário, Charles Aznavour foi conduzido ao um hospital em São Petersburgo, Rússia, após ter exageradamente forçado a coluna durante um ensaio para um concerto na cidade. Tal concerto teve que ser postergado até a próxima estação, mas foi afinal cancelado pela sua morte. Em maio de 2018 ainda foi convidado para participar de um programa de Graham Norton, conhecido apresentador, comediante, ator e autor irlandês vivendo em Londres, na Rádio BBC. Uma semana depois, Aznavour quebrou seu braço em duas partes, resultado de uma queda em sua casa na cidade de Mouriès, o que resultou no cancelamento de todos os seus shows até o final de junho. Este cancelamento foi ao final estendido para incluir os 18 shows programados para agosto, em função de um processo de cura prolongado. Num programa da televisão francesa levado ao ar em 28 de setembro, apenas três dias antes de sua morte, ele mencionou que ainda sentia dor. Em 1º de outubro de 2018 Charles Aznavour foi encontrado morto numa banheira de sua casa em Mouriès, com a idade de 94 anos. Ao tempo de sua morte, sua residência permanente ficava em Saint Sulpice, Vaud, Suiça. Um relatório de autópsia concluiu que Aznavour morreu de uma parada cardiorrespiratória complicada por um edema pulmonar agudo.
No dia 5 de outubro Aznavour foi honrado com um funeral oficial do Estado, no complexo militar de “Les Invalides”, com o Presidente Emmanuel Macron saudando-o como uma das mais importantes “figuras da França”. Macron louvou as letras de Aznavour dizendo que elas haviam apelado à “nossa secreta fragilidade” e que as letras do cantor foram, “para milhões de pessoas, um bálsamo, um remédio, um conforto .... Por tantas décadas ele fez nossas vidas mais doces, nossas lágrimas menos amargas.”
Uma missa funerária teve lugar no dia 6 de outubro, celebrada pelo Patriarca da Igreja Apostólica Armênia, Catholicos Karekin II, na Catedral Armênia de São João Batista, em Paris.
Seu caixão foi conduzido ao final, ao som de sua canção “Emmenez-moi” (Conduzi-me). Entre os dignatários presentes, incluíram-se o Primeiro Ministro francês Édouard Philippe, e os ex-presidentes Nicolas Sarkozy e François Hollande, bem como o Presidente armênio, Armen Sarkissian e o Primeiro Ministro armênio, Nikol Pashinyan, com suas esposas.
Foi enterrado na cripta da família, no cemitério de Montfort-l’Amaury.

AS MÚSICAS DE CHARLES AZNAVOUR

E o que dizer das mais de 1400 maravilhosas melodias compostas e gravadas durante uma carreira de quase oitenta anos, como a de Charles Aznavour? Bem, como nos mais diversos ramos da atividade humana, também a música é uma questão de gosto e muito especial. E são tantas as músicas de Aznavour e tão belas, que fica muito difícil decidir quais apresentaremos nessa finita crônica.
Quando eu nasci, em 1944, Charles Aznavour já cantava, nos seus 20 anos de idade. Quatorze anos depois, na minha maravilhosa adolescência, eu já conhecia o famoso cantor francês, seguramente introduzido por meus pais, e muito viria a dançar as suas românticas melodias, de rosto colado, com minha namorada. Portanto, considerando que o próprio cantor já era um nostálgico, vou me amparar em minha discoteca para selecionar umas pouquíssimas de suas músicas, uma pequeníssima amostra do seu imenso e variado repertório, para tentar dar aos meus leitores uma tênue ideia do que foi a música do incomparável Charles Aznavour. E, claro, serão as mais conhecidas para contentar a um maior número de pessoas.
Em geral, tudo o que fala de Veneza, exerce sobre mim um fascínio enorme e por essa razão, sem considerações de cronologia, vou iniciar a lista pela canção “Que c’est triste Venise”, escrita pela escritora Françoise Dorin e composta e interpretada por Charles Aznavour, lançada em 1964 e logo tornada um sucesso internacional. Além de versões instrumentais, vários cantores famosos gravaram essa melodia, em várias línguas, incluindo o espanhol Julio Iglesias, num dueto com o compositor. Há uma gravação lindíssima dessa melodia, interpretada por Charles Aznavour num dueto com a cantora francesa Patricia Kaas, em 2004, por ocasião do 80º aniversário do compositor. Mas por uma questão de fidelidade, apresentamos uma versão apenas pelo compositor, mais antiga e autêntica. Como não poderia deixar de ser, a letra fala da melancolia de Veneza com suas gôndolas, seus canais, a Ponte dos Suspiros e, claro, dos amores perdidos que nunca são esquecidos.
Em 1972 Charles Aznavour lançou um álbum de que fazia parte uma canção chamada “Les Plaisirs Démodés” (Os Prazeres Fora de Moda), de sua autoria. Nela, o autor fala de como teria conhecido sua amada na boate enfumaçada da moda, entre pessoas da sua idade; e então, no presente, entre jovens com suas músicas modernas e barulhentas, dançando separados, ele a convidaria para redescobrir os prazeres fora de moda, ao dançar de rosto colado, coração contra coração .... A gravação original é muito interessante porque inicia com uma melodia e ritmo modernos, alterna para a melodia principal romântica num ritmo lento, quando ele a convida para dançar e descobrir os prazeres fora de moda, volta ao ritmo moderno e finalmente à melodia principal, encerrando com ela. No ano seguinte ele gravaria e lançaria a sua versão em língua inglesa, “The Old Fashioned Way” (À moda antiga), onde conseguiu, basicamente, manter a ideia original, convidando a sua amada a dançar à moda antiga e toda a melodia se concentra na forma mais lenta e romântica. Embora a gravação original seja mais interessante e completa (são mais de 5 minutos e meio de gravação), sempre preferi a versão em língua inglesa, porque combina mais com o estilo das melodias de Charles Aznavour. Essa música foi também gravada por Bing Crosby e Fred Astaire, em dueto, Petula Clark e Shirley Bassey, entre outros. Entre as gravações instrumentais, destacamos a de Mantovani com sua maravilhosa orquestra de violinos.
Em 1964, um escritor francês, de nome René Fallet, escreveu um romance chamado “Paris au mois d’aout” (Em Paris no mês de agosto). O personagem principal do romance é nele descrito como tendo muita semelhança com Charles Aznavour. Em 1966, o cineasta francês Pierre Granier-Deferre produziu o filme epônimo numa adaptação do romance, oferecendo o papel principal a Charles Aznavour, que assinou a trilha sonora original com a canção “Paris au mois d’août” (composição de Georges Garvarentz e Charles Aznavour), gravada em 1965 para o álbum “La Bohème”. Uma das minhas grandes preferidas, esta canção tem várias gravações, incluindo uma em que Aznavour a canta com a grande orquestra de Paul Mauriat, além de uma magistral versão em italiano. Entretanto, fugindo um pouco da nossa ideia original, abriremos uma exceção para apresentar aos nossos leitores uma versão mais moderna em que Charles Azanavour canta a melodia “Paris au mois d’août” num dueto maravilhoso com a cantora italiana Laura Pausini. Inesquecível!
Para os muito saudosistas como eu, faço um convite para escutarem, não a Charles Aznavour, mas agora ao famoso cantor francês dos anos ’60, Johnny Hallyday, cantando a canção de Aznavour, “Retiens la nuit”, que tanto embalou nossos bailes de adolescente. Essa canção, composta por Georges Garvarentz, com letra de Charles Aznavour, foi lançada em 1961 e permaneceu durante nove semanas como número 1 no quadro de vendas de simples, durante os meses de março a maio de 1962. O próprio Charles Aznavour veio também a gravar, posteriormente, essa canção, além da inesquecível Sylvie Vartan.
She” (Ela, em português) é a versão mais conhecida em todo o mundo, da canção “Tous Les Visages de L'amour” (Todas as Faces do Amor, em português), lançada em 1974 por Charles Aznavour, seu compositor. A versão inglesa, lançada pouco após o surgimento da original francesa, foi composta em parceria com o britânico Herbert Kretzmere e gravada por Aznavour. Sem obter grande receptividade nos Estados Unidos nem na França, chegou ao primeiro lugar na lista das mais ouvidas na Inglaterra, feito até então inédito para um músico francês. Em 1999, “She” foi regravada pelo britânico Elvis Costello, para a trilha sonora do filme Notting Hill (Um Lugar Chamado Notting Hill, na tradução brasileira), alcançando rapidamente sucesso mundial. Houve ainda uma versão em italiano, composta no mesmo ano, em parceria entre Aznavour e o compositor italiano Giorgio Calabreses, intitulada “Lei” (Ela, em português). Mais recentemente, em 2006, a cantora italiana Laura Pausini lançou nova versão em italiano, rebatizada como “Uguale a Lei” (Igual a Ela, em português). Com vocês, Charles Aznavour cantando “She”.
La Bohème” é uma canção escrita pelo músico francês Jacques Plante em parceria com Charles Aznavour. Essa é a canção assinatura de Aznavour, além de um marco e uma das mais populares canções em língua francesa. A letra da melodia fala de um pintor relembrando seus anos de juventude em Montmartre, bairro boêmio de Paris, sua vida artística e os anos quando sentia fome, mas era feliz. De acordo com Aznavour, essa canção é um adeus aos últimos dias da boêmia Montmartre. A gravação original de Aznavour foi realizada em 1965, tornando-se um sucesso internacional no mesmo ano, permanecendo por longo tempo nos quadros das dez mais da Argentina, Brasil, França e vários outros países. O próprio Aznavour gravou “La Bohème” em versões em italiano, espanhol, inglês, alemão e numa rara gravação em português, tendo sido apresentada, virtualmente, em todos os seus concertos pelo mundo.
E com essa melodia, encerramos a nossa apresentação - que poderia estender-se por várias páginas -, das músicas desse magistral chansonier que tanto encantou a nossa vida, por tantos anos. É o nosso tributo e o nosso adeus a Charles Aznavour!

2 comentários:

Dinorvan disse...

Amigo. Estou lendo suas postagens de 2014.
Quero deixar aqui meu agradecimento.
Excelente conteúdo.

Obrigado.

Nelson Azambuja disse...

Prezado amigo Dinorvan
Muito obrigado pelo comentário. Tenho escrito pouco. São esses comentários que me estimulam a prosseguir.
Grande abraço.
Nelson Azambuja.