Beowulf

Homenagem ao lendário herói ancestral dos ingleses que deu título a um dos considerados "Cem Maiores Livros do Mundo" e tido como o mais antigo escrito em "Old English".

segunda-feira, 20 de outubro de 2025

DAYS OF WINE AND ROSES (DIAS DE VINHO E ROSAS)

APRESENTAÇÃO

Agora, com 81 anos de idade, senti, mais ou menos de repente, a necessidade de prestar uma homenagem aos meus amigos. Quando eu digo “meus amigos”, quero me referir a todos os meus amigos e amigas, sem exceção e sem apontar preferências, para evitar cometer qualquer tipo de injustiça. Sou uma pessoa de tão poucos inimigos que prefiro dizer que não os tenho; esses, vamos chamá-los de “não amigos” ou desconhecidos, como se eu nunca os tivesse conhecido, simplesmente. Aqui me refiro a todos os amigos que tive a honra de fazer ao longo desta minha já extensa caminhada de 81 anos – e são tantos .... Amigos do passado e do presente, ainda vivos ou já fora desta vida, pai, mãe e irmão, esposa, filhos e netos, parentes de todos os tipos. Evidentemente, Deus incluído, como meu mais importante amigo!
Meus amigos mais chegados, por certo, já estão cansados de saber que eu me considero – e declaro, sem qualquer ofensa a qualquer outro que também se considere – o homem mais feliz do mundo! Pois bem, durante a festa de nossas Bodas de Rubi, em 2006, organizada por nossos queridos filhos para a celebração dos nossos 40 anos de um feliz casamento, o padre que conduziu a renovação dos nossos votos perguntou-me a que eu atribuía a minha felicidade, tão propalada. Respondi-lhe que achava que boa parte dela eu creditava aos meus amigos. O padre, um sujeito formidável, respondeu-me: “Ah, aos seus amigos, interessante ...”. Mas notei, por sua expressão, que ele não ficou satisfeito com a minha resposta, certamente porque esperava ouvir nela a palavra “Deus”. Aqui um “Mea culpa”: eu deveria ter respondido “Deus” à pergunta do padre, pois acredito firmemente que aquilo que sou e aquilo que tenho, devo-os a Deus! Mas minha resposta foi espontânea e intuitiva, como se uma demonstração do carinho que nutro pelos meus amigos. De qualquer maneira, essa já passa a ser uma discussão filosófica que transcende o objetivo dessa postagem, a minha singela homenagem aos meus amigos.
Muitos deles já sabem, com certeza, que a música é um dos maiores prazeres da minha vida. A música, de todos os tipos, permeia todas as minhas atividades diárias. Sempre que não estou executando alguma atividade que exija minha total atenção, estou escutando música, cantando ou assobiando alguma canção que me vem à cabeça. Daí que imaginei não haver melhor maneira de homenagear aos meus amigos, do que oferecendo-lhes uma pesquisa sobre uma música que tem grande significado para mim e, principalmente, para os meus amigos particulares que estão na minha mesma faixa de idade e que percorreram, juntos comigo, essa extensa caminhada que envolveu horas alegres e horas nem tão alegres, mas que no seu conjunto tornou a nossa vida tão feliz.
Em particular, a minha homenagem a um amigo que num belo dia, “en passant”, baixou o volume de voz e me disse: “Já te deste conta, Nelson, que aquele tempo nunca mais?” Ele se referia àquele tempo de nossa infância, adolescência e fase adulta jovem; àquela fase que os americanos costumam chamar de “age of no regrets” (a idade sem arrependimentos), e que nessa simples homenagem aos meus amigos estaremos chamando de “Days of Wine and Roses”.

O FILME

Embora a parte mais importante da postagem seja a música, principalmente por sua letra, como ela está associada a um filme, que foi muito importante também, começarei por ele, deixando a canção para o final assim destacando a sua maior importância.
“Days of Wine and Roses” (no Brasil exibido com o título “Vício Maldito”) é um filme americano dramático-romântico, de 1962, dirigido por Blake Edwards. Os atores principais do filme são Jack Lemmon e Lee Remick, com o apoio dos atores Charles Bickford e Jack Klugman. O filme retrata a espiral descendente de dois americanos de classe média que sucumbem ao alcoolismo e às repetidas tentativas para lidar com os seus problemas. O filme recebeu quatro indicações ao Oscar, incluindo Melhor Ator e Melhor Atriz, tendo sido selecionado para preservação no Registro Nacional de Filme dos Estados Unidos em 2018.
O enredo do filme acompanha Joe Clay (Jack Lemmon), um executivo de relações públicas, que se casa com Kirsten Arnesen (Lee Remick, uma abstêmia que se torna viciada no álcool por influência de Joe que lhe deu a experimentar o conhecido coquetel “Brandy Alexander”. A representação do alcoolismo no filme é intensa e realística, tornando-o uma poderosa história de amor, dependência e redenção. O drama emocional da película e as inesquecíveis atuações o tornaram um clássico que até hoje permanece impactante. Imagino que muitos dos meus amigo tenham assistido ao filme.
E o que tem o filme a ver com a canção? Quase nada! Pouco relativamente à letra da música que, junto com a melodia, foi a grande motivadora desta postagem. Por isso, vamos à canção!

A CANÇÃO

A canção “Days of Wine and Roses” é uma canção popular composta por Henry Mancini (que dispensa quaisquer comentários), com letra de Johnny Mercer (que também dispensa comentários), apresentada no filme de 1962 “Days of Wine and Roses”, que tratava dos esforços travados contra o alcoolismo e seus impactos sobre os relacionamentos. Por esta belíssima composição, seus autores receberam da Academia o Prêmio de Melhor Canção Original, bem como o Prêmio Grammy de 1964 como Disco do Ano e Canção do Ano. Em 2004 a música terminou em 39º lugar no “100 anos ... 100 canções da AFI” (American Film Institute), levantamento das melhores melodias do cinema americano.
A canção apreende um sentimento agridoce, que recorda os momentos joviais que são, muitas vezes, ofuscados por dor e perda. A letra da música é notável por consistir em apenas duas sentenças complexas, cada uma das quais formando uma das duas estrofes da canção. A letra da melodia comunica um sentido de saudade do passado, onde os dias de vinho e rosas simbolizam um tempo de felicidade e amor despreocupado e feliz. Contudo, a canção também sugere a inevitável passagem do tempo e os desafios que vêm com ele. A superposição de alegria e tristeza é um tema central, que a faz ressoar aos ouvintes que experimentaram sentimentos similares em suas próprias vidas.
A canção apresenta um magnífico arranjo instrumental típico do estilo de Henry Mancini, combinado com a suave interpretação vocal de Frank Sinatra (apenas um de seus múltiplos intérpretes), que acentua a intensidade emocional da letra. A combinação de melodia e letra cria uma intensa reflexão sobre amor e perda, que a tornaram um eterno clássico.
“Days of Wine and Roses” foi interpretada por vários artistas ao longo dos anos, mas a interpretação de Frank Sinatra permanece como uma das mais celebradas, embora mais no estilo Jazz. A música é muitas vezes associada com temas de nostalgia e é frequentemente executada em contextos de jazz ou popular. Continua a ser um grande favorito entre os fãs da música clássica americana.
As gravações mais conhecidas são as de Billy Eckstine, em 1961 (Eckstine teria tido acesso à música neste ano, durante a filmagem e antes do seu lançamento no filme) e Andy Williams, em 1963; mas vários outros artistas também gravaram a canção: Bill Evans, Shirley Bassey, Frank Sinatra, Julie London, Rosemary Clooney, Perry Como, Tony Bennett, Pat Boone, Ella Fitzgerald e Matt Monro, entre outros. Entre as gravações instrumentais, podemos citar Henry Mancini, Richard Alden (Ronnie Aldrich) e Jackie Gleason, além de outros.
Peço desculpas aos amigos para postar, a título de ilustração, as minhas gravações preferidas, que talvez não coincidam com as de vocês: duas com interpretação vocal e duas orquestradas. Basta clicar nos nomes e serão conduzidos às interpretações.

3) Henry Mancini (não poderia faltar o compositor);
4) Jackie Gleason (mais lenta e sentimental para melhor representar a ideia).

Dei um tratamento especial às gravação de Perry Como e de Henry Mancini, criando dois pequenos clips para os meus amigos, com a juntada de títulos, fotos e legendas às duas interpretações. Mas como essa não é a minha especialidade, as duas outras são apresentadas somente como as consegui da rede.
Não poderia deixar de apresentar a letra de “Days of Wine and Roses” em sua íntegra e original versão, bem como uma tradução para aqueles que, já um pouco esquecidos do seu inglês, possam bem acompanhar a maravilhosa ideia dos autores, que me motivou a realizar essa postagem. Afinal, essa letra tem muito a ver com os meus amigos e comigo, com a convivência nos muitos momentos em que estivemos juntos ...



A frase “Days of Wine and Roses” – e acho muito importante colocar essa referência – vem, originalmente, do poema “Vitae Summa Brevis Spem Nos Vetat Incohare Longam” (A Breve Duração da Vida nos Proíbe a Esperança de Resistir por Longo Tempo), do escritor inglês Ernest Dowson (1867-1900):

“They are not long, the weeping and the laughter,
Love and desire and hate:
I think they have no portion in us after
We pass the gate.
They are not long, the days of wine and roses:
Out of a misty dream
Our path emerges for a while, then closes
Within a dream.”

Em português, se me permitem a tradução:

“Eles não são longos, o choro e o riso,
O amor, o desejo e o ódio:
Creio que eles não fazem mais parte de nós após
Passarmos o portão.
Não são longos, os dias de vinho e rosas:
Oriundos de um sonho nebuloso
Nosso caminho emerge por um instante, e então se fecha
Dentro de um sonho.”

Embora tenha dito que os nomes de Henry Mancini e Johnny Mercer dispensam comentários, eu tenho muita pena dos quase sempre esquecidos autores de músicas, ao contrário do seus intérpretes, sempre lembrados, o que me faz incluir umas poucas palavras sobre o autor da melodia e o seu letrista.
Henry Mancini, nascido Enrico Nicola Mancini em 16 de abril de 1924 e falecido em 14 de junho de 1994, foi um compositor, condutor de orquestra, arranjador, pianista e flautista americano. Muitas vezes citado como um dos maiores compositores da história do cinema, recebeu quatro Prêmios da Academia, um Globo de Ouro e vinte Prêmios Grammy, além de um “Grammy Lifetime Achievement Award” (Prêmio Grammy pela Realização durante a Vida) póstumo, em 1995. Seus trabalhos incluem o tema e trilha sonora da série de televisão “Peter Gunn”, a música para a série de filmes de “The Pink Panther” (A Pantera Cor de Rosa) e “Moon River”, do filme “Breakfast at Tiffany’s”, sem esquecer “Days of Wine and Roses”, todos esses, resultado de sua longa colaboração, na composição de trilhas sonoras de filmes, com o diretor de cinema Blake Edwards.
Henry Mancini também manteve extensa colaboração com vários outros diretores de cinema, de que resultaram joias da música popular como “Charade”, “Arabesque”, “Two for the Road”, “Hatari” (quem não se lembra do “Passo do Elefantinho”?), “Sunflower” e incontáveis outras canções.
John Herndon Mercer, nascido em 18 de novembro de 1909 e falecido em 25 de junho de 1976, foi um letrista, compositor e cantor, além de executivo e cofundador do selo Capitol Records. Suas canções sempre estiveram entre os maiores sucessos de seu tempo, incluindo “Moon River”, Days of Wine and Roses” e “Autumn Leaves”. Escreveu as letras de mais de 1.500 canções incluindo composições do cinema e espetáculos da Broadway. Recebeu dezenove indicações para o Oscar, tendo recebido quatro Oscars de Melhor Canção Original, sendo considerado um dos maiores letristas do “Great American Songbook”.

EPÍLOGO

O epílogo é da postagem, evidentemente! Isso porque, meus amigos e eu não teremos jamais epílogo, mas viveremos para sempre! Não no físico, que tem duração curta, como os dias de vinho e rosas, embora até eles permaneçam apesar da idade. Mas o que é o físico comparado ao destino que ainda nos espera após esta vida material? Mais filosofia, para outra hora ...
Esta foi a minha despretensiosa declaração de amor a todos os meus amigos e amigas, genericamente relacionados na apresentação desta postagem. Eu ficaria muito feliz se eles apreciassem, não o trabalho em si, mas a intenção que tentei colocar por trás dele. Amo vocês todos!
E ao final de tudo, eu colocaria a frase que ouvi do conhecido jogador internacional do Real Madrid, Luka Modric, na despedida do seu clube, no famoso estádio Santiago Bernabéu, ocorrida em 24 de maio de 2025, após a vitória por 2 a 0 sobre a Real Sociedade, na última rodada de La Liga, temporada 2024/2025:

NÃO CHORE PORQUE ACABOU, SORRIA PORQUE ACONTECEU!

terça-feira, 14 de outubro de 2025

HISTÓRIA DO POVO JUDEU APÓS O RETORNO DE SEU EXÍLIO NA BABILÔNIA (PARTE 5 - ÚLTIMA)

VIII - A DINASTIA HASMONEANA: AUTONOMIA E CONFLITOS INTERNOS


A Revolta dos Macabeus levou ao estabelecimento da Dinastia Hasmoneana, que governou a Judeia de 140 a 63 AC, marcando um período de autonomia judaica. Simão, irmão de Judas Macabeu, foi nomeado para os títulos de Alto Sacerdote, General e Líder por uma grande assembleia geral, tornando-se o primeiro governante da dinastia Hasmoneana de um estado autônomo. Vislumbrando o poder romano, viajou para Roma para obter dela a garantia de que a Judeia seria um território independente.
Por essa época, já era o mandante do Império Selêucida, Antiochus VII Euergetes, apelidado Sidetes, que reinou de julho de 138 a 129 AC, como último rei Selêucida de alguma estatura; após sua morte em batalha, o reino Selêucida ficou restrito apenas à Síria. Antiochus VII queria as cidades de Gadara, Joppa e Acre de volta, além de um grande tributo. Como Simão quisesse pagar uma fração do desejado pela manutenção de apenas duas das cidades, Antiochus enviou seu general Cendebaeus para atacar. O general foi morto e o exército posto em debandada. Sob o domínio dos hasmoneus, o reino expandiu suas fronteiras, cobrindo uma área quase tão grande quanto a que a nação tinha sob o rei Salomão.
Simão e dois de seus filhos foram mortos numa trama para derrubar os Hasmoneus, que pretendia também matar João Hyrcanus seu filho restante, mas que escapou para Jerusalém para defendê-la. João Hyrcanus conquistou a Transjordânia, a Galileia, a Samaria e a Idumeia (Edom). Hyrcanus tinha muitas questões para resolver como novo Alto Sacerdote. Antiochus invadiu a Judeia e sitiou Jerusalém em 134 AC. Por falta de alimentos Hyrcanus teve que fazer um acordo com Antiochus, pagando uma grande quantidade de dinheiro, abrindo as muralhas da cidade, reconhecendo o poder selêucida sobre a Judeia e ajudando os selêucidas em sua luta contra os Partas, que não aconteceu pela morte de Antiochus em 128 AC. Com isso Hyrcanus tomou de volta a Judeia e manteve o seu poder. Ele também manteve boas relações com os romanos e egípcios, pela grande quantidade de judeus que lá viviam.
Aristobulus I sucedeu a João Hyrcanus, seu pai, sendo o primeiro Hasmoneu a assumir o título de "Rei" e Sumo Sacerdote, durante um curto reinado de um ano. Desafiou os desejos de seu pai que queria sua mãe como sua sucessora, mandando-a para a prisão com todos os seus irmãos, exceto um que logo foi assassinado por suas ordens. Seu feito mais significativo foi a conquista da Galileia.
Com sua morte foi sucedido por seu irmão Alexandre Yanai, apenas preocupado com poder e conquista. Casou-se com a viúva de seu irmão, mostrando muito pouco respeito pela lei judia. Sua primeira conquista foi a cidade egípcia de Ptolomais, cujos habitantes clamaram pela ajuda de Ptolomeu IX que se encontrava em Chipre. Contudo quem veio foi sua mãe Cleópatra III, para ajudar Alexandre e não seu filho.
O reinado dos Hasmoneus foi marcado por intrigas políticas e conflitos internos. A união dos cargos de rei e Sumo Sacerdote na figura dos Hasmoneus gerou insatisfação, pois a realeza deveria ser de descendência davídica, e o Sumo Sacerdócio, da linhagem de Zadoque, o que os Hasmoneus não podiam reivindicar. Essa tensão levou ao surgimento de grupos político-religiosos distintos: os fariseus, os saduceus e os essênios. A luta entre fariseus e saduceus atingiu seu auge com o governo de Alexandre Yanai (100-75 AC), cujo comportamento como Sumo Sacerdote despertou o desprezo dos fariseus. Como Alexandre não fosse um governante popular, uma guerra civil irrompeu em Jerusalém que durou seis anos. Com sua morte, sua viúva, Salomé Alexandra, tornou-se a governante, mas não Alto Sacerdote.
Os governantes que o sucederam foram Aristobulus II, João Hyrcanus II e o último Hasmoneano, Antigonus, deposto e executado pelos romanos sob Marco Antônio. O fim da Dinastia Hasmoneana ocorreu em 63 AC quando os romanos vieram a pedido do então Rei-Sacerdote Aristobulus II e seu concorrente Hyrcanus II. Foi nesse contexto de conflito interno que o general romano Pompeu interveio em 63 AC, marcando a queda da dinastia Hasmoneana e a conquista da Judeia pela República Romana com o fim da independência Judaica
A ascensão e queda da Dinastia Hasmoneana ilustra a complexidade da autonomia judaica em um cenário geopolítico volátil. A união dos poderes real e sacerdotal pelos Hasmoneus, embora inicialmente um símbolo de vitória e independência, tornou-se uma fonte de discórdia interna, pois desafiava as expectativas tradicionais sobre a linhagem da realeza e do sacerdócio. A fragmentação em seitas como fariseus, saduceus e essênios não foi apenas uma questão de diferenças doutrinárias, mas também de disputas de poder e visões divergentes sobre o futuro da nação. Essa divisão interna enfraqueceu a Judeia, tornando-a suscetível à intervenção externa e, em última análise, à conquista romana. A história hasmoneana demonstrou que a independência política, sem coesão interna e legitimidade religiosa amplamente aceita, era insustentável.

IX - A JUDEIA SOB O DOMÍNIO ROMANO (63 AC - PRIMEIROS ANOS DA ERA CRISTÃ)

Pompeu conquistou Jerusalém em 63 AC, encerrando a independência dos judeus e incorporando a Judeia à República Romana como um reino cliente. Sua entrada no Templo, embora sem causar danos ou remover objetos, foi um grave insulto para os judeus, simbolizando o fim da soberania religiosa e política. A intervenção de Pompeu na guerra civil hasmoneana não foi apenas uma conquista militar, mas um ponto de virada decisivo que marcou o fim da autonomia judaica e o início de um longo período de dominação romana. A decisão dos irmãos Hasmoneus de buscar a ajuda romana para resolver suas disputas internas revelou uma falha fatal na liderança judaica, abrindo as portas para a hegemonia de uma potência externa. A profanação simbólica do Templo por Pompeu foi um presságio das tensões e conflitos que surgiriam sob o domínio romano, onde a sensibilidade religiosa judaica frequentemente colidiria com o poder imperial. Isso estabeleceu um padrão de subordinação que culminaria em revoltas e na eventual destruição do Templo.
Os romanos colocaram Hyrcanus II como Alto Sacerdote, mas a Dinastia chegou ao fim em 40 AC quando Herodes, o Grande, um idumeu (como sinônimo de edomita, originário da região de Edom), tradicionalmente inimigo dos judeus; em 37 AC foi nomeado "rei dos judeus" pelo senado romano com o apoio de Marco Antônio e, posteriormente, de Augusto. Seu reinado, que durou até 4 AC, foi caracterizado por uma mistura de impressionantes realizações arquitetônicas e atos de brutalidade.
Hrodes, o Grande, o rei cliente romano do reino da Judeia
Herodes era um rei-vassalo em total lealdade a Roma, e sua ascensão ao poder foi resultado de sua habilidade diplomática e oportunismo político. Ele buscou legitimar seu governo aos olhos do povo judeu casando-se com Mariane, uma princesa hasmoneana, e empreendeu vastos projetos de construção, incluindo a reconstrução e embelezamento extensivo do Segundo Templo em Jerusalém, a construção de seu palácio, a torre Antônia, a fortaleza de Massada e a cidade de Cesareia Marítima.
Apesar de seus esforços para apaziguar os judeus, como o alívio de impostos em épocas de fome e a obtenção de privilégios para os judeus em diversas partes do mundo, Herodes enfrentou dificuldades com o povo judeu durante a maior parte de seu domínio. Sua tirania, crueldade, paranoia (que o levou a executar membros de sua própria família, incluindo Mariane e seus filhos) e a imposição de pesados impostos para financiar suas obras e sua lealdade a Roma, geraram ressentimento generalizado. Sua legitimidade era contestada pelos judeus por ele ser um edomita, um povo rival.
O reinado de Herodes, o Grande, exemplifica a complexa dinâmica de um rei-vassalo que, embora judeu por ascendência (idumeu), era fundamentalmente leal a Roma. Sua política de construção de grandes obras, incluindo o Templo, pode ser interpretada como uma tentativa de legitimar seu governo e apaziguar a população judaica, mas também serviu para exibir o poder romano e drenar os recursos da Judeia através de impostos exorbitantes. A desconfiança e o ressentimento do povo judeu em relação a Herodes, decorrentes de sua brutalidade e sua subserviência a Roma, demonstram a persistente busca por autonomia e a recusa em aceitar um governante que não fosse visto como divinamente sancionado ou alinhado com os interesses judaicos. Essa tensão entre a elite pró-romana e a população geral seria um fator constante de instabilidade até as grandes revoltas dos judeus.
Herodes, o Grande, é descrito na Bíblia Cristã (Mateus 2:16-18) como o coordenador do Massacre dos Inocentes, por ter mandado matar todas as crianças com menos de dois anos de idade assim evitando que vivesse Cristo, o futuro Rei dos Judeus. A maior parte do Novo Testamento faz referência a seu filho, Herodes Antipas (execuções de João Batista e Jesus de Nazaré em Mateus 14) e a seu neto Herodes Agripa (em Atos 12).
Máxima extensão do reino de Herodes
e as tetrarquias herodianas
Com a morte de Herodes, o Grande, em 4 AC, os romanos dividiram seu reino entre três de seus filhos e sua filha. A seu filho Herodes Archelaus teria cabido a etnarquia (território que sugere liderança) da Judeia, Samaria e Idumeia; seu filho, Herodes Antipas, recebeu a tetrarquia (divisão regional que sugere quatro governantes, possivelmente porque Arquelau teria recebido a metade do reino ou dois quartos) da Galileia e Pereia; seu outro filho Filipe teria ficado com a tetrarquia dos territórios ao norte e leste do Rio Jordão; e à sua filha Salomé I teria cabido a toparquia (distrito onde o toparca, mandante do território, exerce o seu poder) que incluia as cidades de Jamnia, Ashdod e Phasaelis.
Após a deposição de Herodes Arquelau (de breve reinado, por incompetência), Roma combinou as províncias sob o seu mando numa só Província da Judeia, governada por um prefeito romano e subordinada ao governador da Síria. Herodes Antipas reinou até 39 DC, quando foi deposto e exilado. Filipe reinou até sua morte em 34 DC, quando suas terras tornaram-se brevemente parte da província romana da Síria. As terras de Salomé I foram aglutinadas sob os demais territórios.
Em 37 DC as terras de Filipe foram dadas a Herodes Agripa, neto de Herodes o Grande; com o banimento de Herodes Antipas, Herodes Agripa tornou-se também mandante da Galileia e Pereia; em 41 DC por favor do Imperador Claudius, Agripa sucedeu ao prefeito romano como Rei da Judeia. Com essa aquisi~]ao, o reino Herodiano dos judeus foi nominalmente reestabelecido até a sua morte em 44 DC. Após o breve reinado de Herodes Agripa I (41-44 DC), o governo foi entregue a um procurador, subordinado diretamente ao imperador romano.
Os procuradores romanos, como Copônio, Pôncio Pilatos e Félix, tinham como principais funções a coleta de impostos, a gestão das propriedades imperiais e a distribuição de pagamentos, principalmente aos militares. Eles também tinham o poder de nomear e depor os Sumos Sacerdotes e de referendar a dependência dos anciãos e da nobreza laica, garantindo o domínio romano sobre Israel.
A administração romana, com sua pesada carga tributária e a interferência na liderança religiosa, gerou crescentes tensões e ressentimento entre os judeus. Embora Roma adotasse uma política de tolerância religiosa, permitindo a prática do judaísmo como uma "religio licita" (religião permitida), qualquer movimento que ameaçasse a ordem pública romana era proibido. A imposição de impostos, a presença militar e a exploração econômica, combinadas com a perda da independência, contribuíram para um quadro de inquietação social e política que culminaria nas grandes revoltas. A situação explosiva da Palestina no século I DC, pode ser explicada em grande parte pela concorrência entre o poder romano e as elites locais pela exploração do país.
A transição para a administração direta romana e o papel dos procuradores revelam a intensificação da subjugação judaica e a crescente exploração econômica. A capacidade dos romanos de nomear e depor Sumos Sacerdotes corroeu a autoridade religiosa interna e transformou o sacerdócio em um instrumento do poder imperial, alienando ainda mais a população. A imposição de impostos onerosos e a percepção de que a riqueza de Jerusalém estava sendo drenada para Roma alimentaram um profundo descontentamento. Essa dinâmica de opressão e resistência, onde as liberdades religiosas eram concedidas apenas na medida em que não desafiassem a ordem romana, criou um ambiente de instabilidade crônica, culminando nas guerras judaico-romanas e na destruição do Segundo Templo (70 DC), com a consequente dispersão dos judeus por todas as nações do mundo. No seu conjunto, a Diáspora judaica refere-se à dispersão dos judeus por diversas regiões do mundo, deixando sua terra original, a Palestina, após eventos como o cativeiro na Babilônia e a destruição do Segundo Templo pelos romanos. Essa dispersão forçada, resultou na formação de comunidades judaicas em diferentes partes do mundo, que mantiveram sua identidade e tradições.

X - CONCLUSÕES

O período que se estende do retorno do Cativeiro Babilônico aos primeiros anos da Era Cristã foi uma era de transformações profundas e contínuas para o povo judeu. A destruição do Primeiro Templo e o exílio, embora traumáticos, atuaram como um catalisador para uma redefinição fundamental da identidade judaica. Desprovidos de sua monarquia e de seu centro cultual original, os judeus foram forçados a se reorientar, solidificando sua identidade não mais em estruturas políticas ou geográficas, mas na adesão à Lei, na prática religiosa e na coesão comunitária.
A reconstrução do Segundo Templo e das muralhas de Jerusalém, liderada por figuras como Zorobabel, Esdras e Neemias, simbolizou um renascimento físico e espiritual. Essa liderança diversificada – um príncipe, um escriba-sacerdote e um governador – marcou a emergência de um modelo de governança não monárquico, onde a autoridade religiosa do Sumo Sacerdote e a autoridade interpretativa dos escribas ganharam proeminência. A despeito dos desafios internos e da oposição externa, a comunidade demonstrou uma notável resiliência, reafirmando seu compromisso com a fé e a identidade.
A sucessão de dominações imperiais – persa, helenística e romana – impôs desafios distintos, mas também impulsionou adaptações cruciais. Sob os persas, os judeus gozaram de uma autonomia limitada, que permitiu a consolidação da liturgia e a compilação de textos sagrados. O helenismo, com sua disseminação cultural, gerou respostas variadas, desde a assimilação e a tradução da Septuaginta até a resistência ferrenha que culminou na Revolta dos Macabeus e na breve independência hasmoneana. No entanto, as divisões internas e a fragilidade política dos Hasmoneus abriram caminho para a conquista romana, que trouxe consigo uma administração direta, pesada tributação e uma nova camada de tensões.
A ascensão de seitas como fariseus, saduceus, essênios, zelotes e herodianos reflete a efervescência intelectual e as profundas divisões ideológicas que caracterizaram o judaísmo do Segundo Templo. Essas diferenças, que variavam da interpretação da Lei à relação com o poder romano, demonstram a busca contínua por um caminho para preservar a fé e a identidade em um mundo em constante mudança.
Em suma, o período do retorno do Cativeiro Babilônico aos primeiros anos da Era Cristã foi um cadinho de provações e inovações. A capacidade do povo judeu de se adaptar, reinterpretar sua fé, desenvolver novas instituições como a sinagoga e codificar sua tradição oral foi fundamental para sua sobrevivência e para a resiliência de sua identidade. Essa era não apenas moldou o judaísmo que conhecemos hoje, mas também forneceu o contexto histórico, cultural e religioso essencial para o surgimento do cristianismo, marcando-a como um dos períodos mais dinâmicos e formativos na história da civilização ocidental.

quarta-feira, 8 de outubro de 2025

HISTÓRIA DO POVO JUDEU APÓS O RETORNO DE SEU EXÍLIO NA BABILÔNIA (PARTE 4)

VI – O PERÍODO HELENÍSTICO E A CRISE DE IDENTIDADE (333 AC - 63 AC)

No império Persa, Artaxerxes I foi sucedido por seu filho Xerxes II que foi, por sua vez, assassinado e sucedido por seu meio irmão Soguediano, ambos reinando por períodos muito curtos. Dario II (424 – 404 AC) sucedeu a Soguediano e foi sucedido por seu filho Artaxerxes II, que reinou de 404 AC até a sua morte em 358 AC. Artaxerxes III o sucedeu no trono, sendo sucedido por Dario III, último rei do Império Aquemênida Persa, tendo reinado de 336 a 330 AC.
Alexandre, o Grande, da Macedônia
Por essa época Felipe, rei da Macedônia (norte da Grécia), foi assassinado em Egae, por Pausanias, filho de Cerastes, da família de Orestes, e Alexandre, seu filho, o sucedeu no trono.
Alexandre, passando pelo Helesponto (atual Estreito de Dardanelos) derrotou os generais do exército de Dario III na batalha travada em Cranicum, marchou sobre a Lydia (antigo nome da região oeste da Turquia asiática), subjugou a Ionia, Caria e Pamphylia, avançando para o leste da atual Turquia. Enquanto isso, Dario avançava com seus exércitos para o oeste, visando dar combate a Alexandre em Issus, Cilicia. Sanballat, certo de que Dario derrotaria Alexandre, reafirmou suas promessas a Massaneh. Entretanto, Dario foi batido por Alexandre que tomou a maior parte dos seus exércitos além de aprisionar sua mãe, esposa e filhos, e fugiu para a Pérsia. Alexandre invadiu a Síria, tomando Damasco, Sidon e sitiando Tiro, quando então buscou o alto sacerdote judeu para fornecer suprimentos a seus exércitos. Entretanto, o Alto Sacerdote respondeu-lhe que não transgrediria seu juramento a Dario enquanto este estivesse vivo, pois temia sua represália. Alexandre, evidentemente não gostou de sua resposta e prometeu represália aos judeus assim que tomado Tiro. Isso aconteceu rapidamente e Alexandre chegou a Gaza que foi sitiada e teve o governador da guarnição, Babemeses, preso.
Ao tempo do sítio de Tiro, Sanballat viu um boa oportunidade de atingir seus objetivos e, renunciando a Dario III, buscou Alexandre oferecendo-lhe cerca de sete mil de seus soldados e aceitando-o como seu lorde. Sanballat, sendo bem recebido por Alexandre, narrou-lhe seus próprios problemas e fez ver a Alexandre que dividindo Jerusalém com dois altos sacerdotes, dividiria também sua força. Contou com a anuência de Alexandre e apressou-se na construção do Templo prometido, fazendo Manasseh alto sacerdote. Entretanto, assim que Alexandre conquistou Tiro e Gaza, Sanballat morreu e Alexandre apressou-se a tomar Jerusalém (cerca de 329 AC), colocando o Alto Sacerdote Jaddua em pânico, fazendo com que adornasse a cidade e abrisse os seus portões para receber o Rei Alexandre. Recebeu Alexandre com toda a pompa, foi por ele muito bem aceito e conduzido ao Templo, onde ofereceu sacrifício ao Deus dos Judeus, tratando magnificamente o Alto Sacerdote e os demais sacerdotes. Tal foi a maneira como Alexandre atendeu a todas as reivindicações dos Judeus, que muitos deles se prontificaram a marchar sob suas ordens para as suas novas conquistas. Após Alexandre ter acertado todos os assuntos em Jerusalém, conduziu seu exército pelas cidades vizinhas que o receberam muito bem. A partir dessa época, a Palestina passou a ser chamada de Palestina Helenística. Vendo que os judeus o haviam recebido tão bem, os samaritanos, que tinham Shechem por sua metrópole (uma cidade situada no monte Gerizzim e habitada por apóstatas da nação judia), manifestaram, como de outras vezes, sua descendência judia, igualmente saudando o rei Alexandre.
A Província Helenística de Judá
O Império Persa, sob o qual os judeus haviam desfrutado de uma autonomia limitada, foi, portanto, conquistado por Alexandre, o Grande, da Macedônia, no século IV AC. Em 313 AC, Alexandre anexou a Terra de Israel ao seu crescente império, marcando uma nova fase de dominação estrangeira. A ascensão meteórica de Alexandre ao poder e a extensão de seu domínio por vastas regiões do mundo antigo, tudo antes de completar 30 anos, tiveram um impacto notável na história judaica.
A conquista de Alexandre não se deu apenas pela força militar, mas também pela disseminação da língua e cultura gregas num processo conhecido como helenização. O helenismo, a disseminação da cultura e língua gregas, teve um impacto profundo e complexo no judaísmo. A língua grega tornou-se um veículo de comunicação universal em todo o Oriente Médio, facilitando um diálogo cultural entre gregos e civilizações orientais. Em algumas comunidades da diáspora, notadamente em Alexandria, no Egito, os judeus se abriram à cultura helenística, assimilando-a em vários níveis, desde a língua até o pensamento e o modo de vida. Um dos produtos literários mais importantes desse contato foi a tradução da Bíblia hebraica para o grego, conhecida como a Septuaginta, realizada em etapas entre o século III e o século I AC em Alexandria. Essa tradução foi crucial para os muitos judeus da diáspora que haviam perdido o contato com a língua hebraica e para a difusão do pensamento judaico no mundo helenístico. No entanto, a influência helenística não foi uniformemente aceita. Enquanto os judeus dispersos, especialmente no Egito, mantiveram um diálogo fecundo com a cultura grega, os judeus residentes na Terra de Israel, rejeitaram fortemente a cultura helênica imposta, pois a viam como uma ameaça direta à sua identidade judaica. Dessa interação e confronto de culturas, surgiu uma rica produção literária, tanto de apoio ao helenismo (literatura de justificação) quanto de rejeição a ele (literatura de resistência). A interação entre o judaísmo e o helenismo não foi uma simples dicotomia de aceitação ou rejeição, mas um espectro de respostas que moldou profundamente a identidade judaica. A tradução da Septuaginta, por exemplo, não foi apenas um ato de adaptação linguística, mas um empreendimento que tornou as Escrituras judaicas acessíveis a um público mais amplo, incluindo os gentios, e que influenciaria profundamente o desenvolvimento do cristianismo. A resistência ao helenismo forçado, por outro lado, fortaleceu a convicção religiosa e a coesão identitária dentro da Judeia, culminando com a Revolta dos Macabeus. Essa dualidade de adaptação e resistência demonstra a capacidade do judaísmo de se engajar com culturas dominantes sem perder sua essência, um modelo de resiliência que se repetiria ao longo de sua história.

VII – DA MORTE DE ALEXANDRE, O GRANDE, À REVOLTA DOS MACCABEUS

Com a súbita morte de Alexandre, o Grande, em 323 AC, seus generais e sucessores, os “Diadochi” (Sucessores), lutando pela sucessão, acabaram por dividir o reino entre si: Seleucus I Nicator (que deu origem ao Reino Selêucida), obteve a Ásia (Ásia Menor, Síria, Mesopotâmia e Babilônia); Lysimachus governou a Trácia (Trácia propriamente e grande parte da atual Turquia); a Cassandro coube a Macedônia (que incluía a Macedônia e toda a Grécia); e a Ptolomeu I Soter coube o Egito (Egito propriamente dito, a região da Silícia, na Ásia Menor e parte da Palestina). 
Partição do reino de Alexandre entre seus generais
A Judeia, anteriormente sob o domínio persa e estrategicamente localizada entre os reinos ptolomaico e selêucida, tornou-se um ponto de disputa constante entre entre os Ptolomeus e os Selêucidas. Inicialmente, sob o governo ptolomaico, as práticas religiosas judaicas foram toleradas. No entanto, a transição para o domínio selêucida, especialmente sob Antiocus IV Epifânio, traria uma nova e severa ameaça à identidade judaica. Essa instabilidade política e a subsequente mudança de controle de um império tolerante (Ptolomeu) para um opressor (Selêucida) demonstraram a vulnerabilidade contínua da comunidade judaica a forças externas. Essa sucessão de dominações estrangeiras, cada uma com suas próprias políticas e impactos culturais, forçou os judeus a desenvolverem estratégias de resistência e adaptação, que se manifestariam em movimentos religiosos e políticos distintos, preparando o terreno para a Revolta dos Macabeus.
Com as alterações das guerras durante os primeiros anos dos Diadochi, o Reino de Judá foi, inicialmente, para o comando dos Ptolomeus que governavam o Egito, seguido do comando Selêucida no segundo século AC, com Antiocus III, o Grande. A incorporação de Judá ao reino ptolomaico como uma unidade administrativa separada (Hiparquia) liderada pelos Alto Sacerdotes Judeus, que foram diretamente responsáveis pelo governo na Alexandria, foi responsável por isso. Em contraste, os hiparcas diretamente instalados pelo rei Ptolomaico, gerenciaram todas as outras hiparquias na Selesíria, tais como a Samaria, Galileia, Idumeia e Ashdod.
Ptolomeu I reinou sobre Jerusalém de maneira cruel, num certo momento tomando grande número de cativos das partes montanhosas da Judeia e de locais em torno de Jerusalém e Samaria e próximos do Monte Gerizzim e conduzindo-os para o Egito, onde se tornaram responsáveis pela região de Alexandria. Posteriormente outros judeus, por sua própria vontade, deslocaram-se para o Egito pela qualidade dos seus solos e pela liberalidade de Ptolomeu.
Em contraste com o que sabemos sobre as atividades dos Ptolomeus na Palestina, são virtualmente nulas as informações que se têm sobre as atuações políticas dos judeus ao tempo dos Diadochi. As províncias praticamente não se envolveram em eventos geopolíticos. Contudo, as variações no poder político também tiveram consequências significativas para Judá, que se refletiram mesmo na cunhagem de moedas. A Judeia continuou a ser governada pelo Alto Sacerdote e a aristocracia sacerdotal. Um dos poucos incidentes de que se tem notícia foi a questão sobre a taxação entre o Alto Sacerdote Onias e Ptolomeu III Euergetes (que reinou entre 246 e 221 AC) que frequentava o Templo de Jerusalém. O resultado da disputa foi a indicação do jovem José, filho de Tobias, um sobrinho do Alto Sacerdote, como coletor de impostos para todo o país. A rivalidade entre a família de Tobias e do Alto Sacerdote Onias acabou tendo um papel importante na tentativa radical da Helenização da Judeia no segundo século AC.
Quando Onias morreu, seu filho Simon, o Justo, tornou-se seu sucessor. Com a morte de Simon (que havia deixado um filho também com o nome Onias), seu irmão Eleazar tornou-se o Alto Sacerdote, sendo responsável pela libertação de mais de 100.000 judeus escravos no Egito, por ordem de Ptolomeu.
Durante os anos de conflito entre Ptolomeus e Selêucidas, cada um dos rivais era apoiado por uma facção judia. A Gerousia (Conselho dos Anciãos), mencionada pela primeira vez em fontes dessa época, apoiava os Selêucidas. Há registros de que o Alto Sacerdote Simon, o Justo, (cerca de 200 AC), que provavelmente liderou a Gerousia, teria apoiado os Selêucidas. Provavelmente ele teria recuperado o poder sobre a taxação, anteriormente entregue a José, filho de Tobias, agora encarregado da renovação do Templo e da Cidade.
Em 221 AC o rei Selêucida Antiochus III (223 a 187) invadiu a Palestina pela primeira vez, sem ter o sucesso da conquista. A morte do rei Ptolomeu IV Philopator, em 203 AC abriu o caminho a Antiochus III para novas tentativas e em 201 AC ele invadiu o país novamente, conquistando-o rapidamente.
Quando Antiochus III tomou o controle da Judeia, ele afirmou o direito dos judeus de viverem de acordo com suas leis ancestrais. Contudo, apenas 30 anos após, os judeus proponentes de uma helenização extrema veriam seu filho o rei Selêucida Antiochus IV Epiphanes, como o agente que poria em ação seus planos de helenizar Jerusalém e seu povo. Ao tempo em que o domínio dos Ptolomeus na Palestina terminou, cidades gregas haviam se estabelecido por todo o país e o helenismo havia firmado fortes bases a ponto de dividir a nação antes que a Judeia recuperasse sua independência. Cerca de 198 AC, os Selêucidas estavam solidamente no controle e assim permaneceriam até a revolta dos Macabeus (168-164 AC), que enfraqueceu o poder do Império Selêucida, preparando o caminho para o início da dinastia local Hasmoneana. Em seguida ao cerco de Jerusalém por Pompeu, o Grande, em 63 AC, a região foi anexada pela República Romana, marcando o fim da Palestina Helenística e o início da Judeia Romana.
Antiochus III devia uma grande quantia de dinheiro aos romanos e a fim de obter esses recursos ele decidiu roubar um templo. O povo do templo de Bel in Lam, para vingar-se, matou Antiochus e todos os que o ajudaram, em 187 AC. Antiochus III foi sucedido por seu filho Seleucos IV Philopater que simplesmente defendeu a área de Ptolomeu V antes de ser assassinado por seus ministros em 175 AC. Seu irmão, Antiochus IV Epiphanes, tomou seu lugar. Antes de matar o rei anterior, o ministro Heliodorus tentara roubar os tesouros do Templo em Jerusalém e Antiochus IV foi informado disso por um rival do atual Alto Sacerdote Onias III que proibira a entrada de Heliodorus no Templo. Onias III foi chamado para explicar por que um ministro do rei fora impedido de acessar as dependências do Templo. Em sua ausência, seus rivais colocaram um novo Alto Sacerdote em seu lugar, Jason (versão helenizada de Josué), irmão de Onias III. 
A Palestina à época dos Macabeus
A perseguição selêucida sob Antiochus IV Epifânio (175-164 AC) foi o catalisador para a Revolta dos Macabeus. Antiochus, que se autodenominava "deus manifesto", buscou impor uma assimilação cultural e religiosa forçada sobre os judeus. Ele proibiu práticas religiosas judaicas, como a observância das leis alimentares, a circuncisão e o Sábado, e ordenou a adoração do deus grego Zeus. O ápice de sua profanação ocorreu em 167 AC, quando ele sacrificou um porco no Templo de Jerusalém, transformando-o em um local de culto sincrético pagão-judaico.
Essa opressão desencadeou a Revolta dos Macabeus, uma rebelião judaica liderada por Matatias, um sacerdote judeu, e seus cinco filhos, notavelmente Judas Macabeu, um competente general judeu. A resistência ganhou força com revoltas populares e uma campanha militar contra as forças selêucidas. Um dos momentos mais simbólicos da revolta foi a recuperação e purificação do Templo de Jerusalém pelos Macabeus, um evento celebrado até hoje no festival judaico de Hanukkah.
A Revolta dos Macabeus foi uma resposta à tentativa de aniquilação cultural e religiosa, e seu sucesso em repelir os gregos e estabelecer um reino independente marcou uma fase importante na história judaica. A profanação do Templo por Antiochus IV não foi apenas um ato de tirania, mas uma violação do cerne da identidade judaica, que considerava o Templo como o centro de sua fé e unidade. A revolta, portanto, não foi apenas uma luta por independência política, mas uma defesa existencial da religião e da identidade do povo. O estabelecimento de Hanukkah como uma festa duradoura reforça a importância da memória histórica e da resiliência religiosa como elementos centrais da identidade judaica.
Os Macabeus começaram a chamar a atenção do rei Antiochus IV em 165 AC, que mandou seu chanceler Lysias pôr um fim à revolta. Para tanto, Lysias enviou três generais que foram todos derrotados pelos Macabeus. O próprio Lysias enfrentou a questão que foi então solucionada por negociação.
Após a morte de Antiochus IV em 164 AC, seu filho Antiochus V, tendo Lysias como regente, deu aos judeus liberdade religiosa.
Ao tempo da re dedicação do Templo, durante o cerco da fortaleza de Acre, Eleazor, um dos irmãos de Judas Macabeus foi morto. Os Macabeus tiveram que se retirar para Jerusalém onde foram totalmente batidos. Contudo Lysias teve que abandonar pela contradição sobre quem seria o regente de Antiochus V. Pouco depois ambos foram assassinados por Demetrius I Soter que se tornou o novo rei selêucida. O novo Alto Sacerdote, Alcimus, tinha vindo a Jerusalém em companhia de um exército conduzido por Bacchides. Judas Macabeus conseguira há pouco um tratado com os romanos, quando foi morto em Jerusalém lutando contra o exército de Bacchides. O irmão de Judas Macabeus, Jonathan, o substituiu e por oito anos não pode fazer muita coisa. Contudo, em 153 o Império Selêucida começou a enfrentar problemas. Jonathan aproveitou a oportunidade para oferecer suas tropas a Demetrius I, como tentativa para retomar Jerusalém.
Em 152 AC, Alexandre Balas, da família Selêucida, aportou no território Fenício (costa norte da Palestina) e iniciou uma guerra civil contra Demetrius I Soter, apoiado por mercenários e facções descontentes do Império Selêucida. Em batalha decisiva em julho de 150 AC, Demetrius I foi derrotado e morto por Alexandre Balas que governou o Império Selêucida de 150 a agosto de 145 AC como Alexandre I Theopator Euergetes. Jonathan foi indicado Alto Sacerdote por Alexandre Balas e quando os conflitos entre Ptolomeu do Egito e os Selêucidas reiniciaram, ele tomou o controle da fortaleza de Acre. Em 142 Jonathan foi morto e seu irmão Simão tomou seu lugar. (Parte 5 na próxima postagem)

terça-feira, 7 de outubro de 2025

HISTÓRIA DO POVO JUDEU APÓS O RETORNO DE SEU EXÍLIO NA BABILÔNIA (PARTE 3)

 

IV – NABUCODONOSOR II E OS SUCESSORES DO SEU IMPÉRIO

O Levante Histórico em vermelho
Após ter reinado por quarenta e três anos, o rei Nabucodonosor morreu. Foi um homem ativo e mais feliz que os reis que o antecederam. Berosus menciona suas ações no terceiro livro de sua “História dos Caldeus”, onde diz: “Quando seu pai Nabopolassar foi informado de que o governador que havia colocado no Egito e as regiões da Coelesyria
[1] e Fenícia[2] haviam se revoltado, entregou parte do seu exército ao seu filho ainda jovem, Nabucodonosor, e enviou-o contra eles”. O jovem príncipe debelou todos os revoltosos e incorporou as regiões ao seu próprio país, ao mesmo tempo em que seu pai adoecia e morria na Babilônia, após reinar por 21 anos. Tendo acertado seus assuntos no Egito e outros países bem como os relativos aos transportes dos prisioneiros egípcios, fenícios, sírio e judeus bem como seu próprio exército, retornou à Babilônia assumindo o controle do reino. Construiu reforçadas muralhas em volta de toda a cidade e construiu um novo palácio para si mesmo em frente ao de seu pai.
O filho de Nabucodonosor II, Evil-Merodach, o substituiu, imediatamente colocando em liberdade e fazendo-o seu amigo íntimo, Jehoiachin, penúltimo rei de Judá, colocado por Nabucodonosor II.
Quando Evil-Merodach morreu, após um reinado de 18 anos, foi substituído por seu filho Niglissar que reinou por quarenta anos. A sucessão do reino passou para seu filho Labosordacus que reinou por apenas nove meses, sendo substituído por Baltasar, entre os babilônios, Naboandelus. Contra ele fizeram guerra Darius, o rei da Média e Ciro, o rei da Pérsia. Segundo Flavius Josephus, quando Baltasar se encontrava sitiado, teria tido um sonho que nenhum dos seus adivinhos teria conseguido interpretar. 
Mapa da região da Fenícia, em verde
Por interferência de sua avó, surge então a figura do cativo Daniel, judeu de nascimento trazido da Judeia por Nabucodonosor para a Babilônia, um sábio, que teria conseguido interpretar, apenas por influência de Deus, o sonho de Baltasar, recusando todos os presentes prometidos. Daniel teria então relatado a Baltasar que ele morreria em pouco tempo por terem, ele e Nabucodonosor blasfemado contra Deus e que, por isso, Deus partiria seu reino em pedaços dividindo-o entre Persas e Medos.
Pouco tempo depois, em 539 AC, a cidade e Baltasar foram tomados por Ciro (o primeiro general a entrar na Babilônia quando tomada pelos persas), encerrando, após um reinado de 17 anos, a posteridade de Nabucodonosor.

V – DO PRIMEIRO ANO DE CIRO ATÉ A ASCENSÃO DE ALEXANDRE, O GRANDE

Ciro II, o Grande, redentor dos Judeus
Ciro II, o Grande, filho de Cambises e neto de Ciro I, foi o fundador do Império Aquemênida, o primeiro Império Persa. Seu reinado durou 30 anos e foi criado a partir da conquista do Império Medo, do Império Lídio e, finalmente, do Novo Império Babilônio. Assumiu o trono da Pérsia em 559 AC, mas não como governante independente; como seus predecessores, teve que reconhecer a liderança dos Medos. Só após a conquista da Babilônia, em 539 AC, Ciro proclamou-se “Rei dos Quatro Cantos do Mundo”, com o maior império que o mundo tinha visto até então. 
Após a conquista persa da Babilônia, o rei Ciro, o Grande, emitiu um decreto em 538 AC (70º ano da remoção do povo judeu para a Babilônia) que não apenas permitiu, mas ativamente encorajou o retorno dos exilados judeus para Judá e a reconstrução do Templo em Jerusalém. Mais do que isso, providenciou junto aos mandatários da vizinhança da Judeia o ouro e a prata necessários para as despesas. Essa política persa de tolerância religiosa foi recebida com grande júbilo pelos exilados, a ponto de o profeta Dêutero-Isaías aclamar Ciro como "o ungido do Senhor".
A primeira onda de retornados, liderada por Zorobabel (que pode ter sido a mesma pessoa que Sesbazar) e incluindo mandatários das duas tribos, Judá (Reino de Judá após a cisão) e Benjamin, com os Levitas e sacerdotes, ocorreu por volta de 537 AC. Este grupo, composto por aproximadamente 42.360 indivíduos, além de 7.337 servos e servas e 200 cantores e cantoras, levou consigo os vasos sagrados do Templo. Contudo, é fundamental observar que este foi apenas um retorno parcial. Muitos judeus já haviam estabelecido novas vidas na Babilônia e em outras partes da diáspora, mas continuavam a considerar o Templo em Jerusalém como um poderoso símbolo de sua unidade coletiva.
A narrativa do "retorno" é central para o judaísmo pós-exílico, mas os registros históricos revelam uma contra-narrativa crucial: uma porção significativa da população judaica optou por não retornar. Isso indica que o exílio babilônico, embora traumático, também fomentou o crescimento de uma diáspora robusta e duradoura. A contínua reverência pelo Templo de Jerusalém por aqueles que permaneceram no exterior demonstra que a identidade judaica estava se tornando cada vez mais flexível, capaz de transcender as fronteiras geográficas. O estabelecimento precoce de uma grande e influente comunidade diaspórica moldaria profundamente o futuro do judaísmo, promovendo diversas expressões culturais e centros intelectuais fora da Judeia.
Os judeus que retornaram se dedicaram à reconstrução do Templo e de Jerusalém, mas foram retardados em seus esforços, pelos povos vizinhos, em especial pelos Cutheans ou Cuthitas, povo trazido da Média e Pérsia, por Nabucodonosor, para a região da Samaria, para povoar a região que ficara desabitada quando os judeus do Reino de Israel (após a cisão) foram levados para o cativeiro da Babilônia. Ciro não tinha conhecimento desses fatos porque participava de guerras contra outros povos, ocasião em que foi morto. Ciro II foi sucedido por Cambises II, em 530 AC, reinando até 522 AC, recebendo desses povos queixas contra os judeus, dizendo que assim que os seus trabalhos fossem concluídos, eles se rebelariam, deixando de pagar seus tributos. Cambises II ordenou que os judeus cessassem as construções em andamento para que os problemas anteriores ao cativeiro não voltassem a se repetir. Durante todo o reinado de Cambises II os trabalhos de reconstrução do Templo foram suspensos, só reiniciando no segundo ano de Dario I, o Grande. Cambises II foi sucedido por seu irmão mais moço Bardiya, filho de Ciro II com Atossa, sua esposa, que não era rainha. Bardiya foi assassinado por Dario I que assumiu o trono da Pérsia. Aqui a história não é bem clara e há quem diga que Bardiya não assumiu o trono, mas sim um Mago que por ele se fez passar e assim que descoberto foi assassinado por Dario I, filho de Histaspes, que assumiu o trono em 521 AC, reinando de Persépolis, capital do Império na Pérsia.
Na história de “Daniel na cova dos leões” (Daniel 6, do Antigo Testamento), Daniel continuou a servir na corte real sob Dario I, historicamente de reinado duvidoso, como alto dignatário. Seus rivais, com inveja, planejaram a sua queda, fazendo com que Dario emitisse um decreto pelo qual nenhuma oração poderia ser feita a qualquer deus ou homem além do próprio Dario, sob pena de morte. Daniel continuou a rezar ao Deus de Israel; Dario, embora profundamente desgostoso, teve que condená-lo a ser jogado na cova dos leões porque os decretos de Persas e Medos não podiam ser alterados. Ao nascer do dia o rei apressou-se ao lugar e Daniel disse-lhe que Deus havia enviado um anjo para salvá-lo. Dario então ordenou que aqueles que haviam conspirado contra Daniel fossem lançados aos leões em seu lugar, com suas esposas e filhos. Quando aqueles que tinham pretendido destruir Daniel, foram assim destruídos, o Rei Dario enviou cartas por todo o país louvando o Deus que Daniel adorava e dizendo que Ele era o único Deus verdadeiro.
A monumental tarefa de reconstruir Jerusalém e restabelecer a comunidade judaica foi reiniciada e liderada por três figuras distintas, mas complementares:

Zorobabel, o príncipe da casa de Davi que liderou a primeira leva de retornados e foi fundamental na colocação dos alicerces do Segundo Templo por volta de 536 AC. A construção do Templo foi finalmente concluída em 516 AC, durante o reinado do rei persa Dario I.
Esdras, um escriba e sacerdote altamente habilidoso, chegou mais tarde, após uma considerável lacuna cronológica. Seu foco principal era a restauração da adoração adequada e a rigorosa implementação da Torá. Ele iniciou reformas morais e espirituais significativas, incluindo a controversa condenação de casamentos mistos, tudo visando revitalizar a identidade religiosa e a devoção do povo judeu.
Neemias, que servia como copeiro do rei posterior persa Artaxerxes (cujo reinado se estendeu de 465 a 424 AC), assumiu a responsabilidade pela reconstrução das muralhas defensivas de Jerusalém, um projeto que enfrentou considerável oposição externa. Além da construção física, Neemias também se dedicou à edificação espiritual do povo e à garantia de sua adesão à aliança.

Os papéis de Zorobabel (reconstrução física e cultual), Esdras (reforma religiosa e legal) e Neemias (organização administrativa e social) ilustram uma evolução crítica na governança judaica. Com a ausência da monarquia tradicional, a liderança se diversificou. Essa divisão de autoridade, embora eficaz para uma restauração abrangente, também sinaliza uma nascente separação entre o poder religioso e o secular, com o Sumo Sacerdote ganhando influência significativa. A ênfase nas reformas espirituais e morais de Esdras e Neemias sublinha que a comunidade pós-exílica compreendia a "restauração" não apenas como um retorno a uma terra ou edifício físico, mas como uma profunda renovação espiritual e ética, centrada na Lei em vez de um rei. Esse modelo de liderança se tornaria fundamental para o futuro do judaísmo, especialmente após a destruição do Templo.
Zorobabel, feito governador dos judeus pós cativeiro, foi de Jerusalém à presença de Dario I, de quem tinha sido amigo e nas graças de quem havia caído antes mesmo que ele assumisse o reino, para solicitar-lhe o cumprimento de sua promessa de reconstrução de Jerusalém e do templo dos judeus, bem como a devolução dos vasos sagrados que Nabucodonosor havia roubado. Dario cumpriu todas as promessas feitas a Zorobabel e muito mais, isentando-o de impostos, proibindo outros povos de guerrearem contra os judeus e ainda obrigando-os a ajudarem na reconstrução da cidade e do templo. O povo saudou o retorno de Zorobabel a Jerusalém e celebrou durante sete dias o início da reconstrução e restauração do seu país.
Judá em amarelo e Israel em azul, século IX AC
A reconstrução do Templo e das muralhas foi um testemunho da fé e determinação judaica, superando adversários políticos significativos e o desânimo interno. O Segundo Templo, embora carecesse da Arca da Aliança e da Shekinah (presença divina) de seu predecessor
    e por isso fosse percebido por alguns como espiritualmente inferior, tornou-se, no entanto, o símbolo central da identidade judaica e o principal local de adoração, sacrifício ritual e reuniões comunitárias. O Templo é consistentemente destacado como um "símbolo central da identidade judaica". No entanto, a menção explícita de sua "falta de esplendor" e da ausência da Arca e da Shekinah introduz uma nuance crucial: o Segundo Templo, embora uma restauração física, não foi visto como um retorno espiritual completo à glória do Primeiro Templo. Essa sensação de imperfeição, combinada com as críticas proféticas à ganância interna e ao exclusivismo, indica que a restauração pós-exílica foi um empreendimento humano complexo, repleto de desafios internos e uma persistente sensação de incompletude espiritual. Essa tensão inerente contribuiria para as diversas expressões religiosas e expectativas que caracterizaram o período posterior do Segundo Templo.
Após dois anos e dois meses de seu retorno do cativeiro, os judeus estavam bem adiantados na construção do Templo e iniciaram as celebrações correspondentes. As nações vizinhas dos judeus, incluindo os samaritanos (da região da Samaria), voltaram a indignar-se e tentaram, de todas as nações da Síria obter novamente uma interrupção nos trabalhos dos judeus, sem tomar qualquer providência antes de saber como reagiria Dario I. Enquanto isso, os profetas Haggai e Zacarias encorajavam os judeus a não desistirem da obra nem das promessas dos Persas. Dario I não aceitou as reclamações dos vizinhos dos Judeus e voltou a hipotecar-lhes o seu apoio na reconstrução do Templo, que foi concluída em 7 anos. No nono ano de Dario I os israelitas festejaram a conclusão do novo Templo, sempre mantido o apoio persa em seu favor, sob o governo de Zorobabel, até a morte de Dario I, o Grande.
Império Persa em sua maior extensão sob Dario, o Grande
Sob o domínio persa, a comunidade judaica na província de Judá desfrutou de um grau de autonomia limitada. O principal vínculo com o vasto Império Persa era através de uma política tributária, que, embora impondo obrigação econômica, permitia uma significativa auto governança interna. Este período foi profundamente formativo para a identidade e cultura judaicas. Testemunhou o crucial processo de consolidação da liturgia judaica e a compilação dos textos que finalmente formariam o Tanakh (Bíblia Hebraica). A rigorosa observância da Lei, do Sábado e da circuncisão tornou-se elemento definidor e essencial da vida judaica.
A ausência de uma monarquia soberana e a limitada autonomia política sob a Pérsia forçaram uma reorientação fundamental da identidade judaica. A ênfase na "consolidação da liturgia e dos escritos histórico-religiosos" e a elevação da "Lei, Sábado e circuncisão" como "elementos distintivos" significam uma mudança de uma identidade nacional-política para uma identidade religiosa-textual. Os escribas tornaram-se figuras de suma importância, servindo efetivamente como os novos guardiões intelectuais e espirituais. Esse desenvolvimento foi crucial para a sobrevivência do judaísmo em um mundo sem rei e plena independência política.
Na ausência de um rei, o Sumo Sacerdote emergiu como o líder religioso preeminente e, em grande medida, líder político da comunidade judaica em Jerusalém. O cargo de Sumo Sacerdote era hereditário, traçando sua linhagem até Arão, irmão de Moisés, da tribo de Levi. Essa figura central, responsável pela mediação entre Deus e o povo através dos rituais do Templo, assumiu uma autoridade considerável na província de Judá. O surgimento de uma hierarquia sacerdotal centralizada no Templo, liderada pelo Sumo Sacerdote, foi uma resposta direta à ausência de uma monarquia e à necessidade de uma estrutura de governança interna sob o domínio persa. Essa concentração de poder religioso e, em parte, político no Sumo Sacerdote, embora garantisse a coesão da comunidade e a continuidade do culto, também plantou as sementes para futuras tensões. A dependência que tinha o sacerdócio da aprovação imperial, primeiramente persa e depois helenística e romana, para manter sua posição e privilégios, criaria divisões internas e comprometeria a independência religiosa, levando a conflitos e a uma busca por maior autonomia.
Com a morte de Dario I, seu filho Xerxes assumiu o reino persa, mantendo com os judeus o mesmo tratamento dispensado por seu pai. Por essa época, o grande sacerdote dos judeus era Joachim, filho de Jeshua. Na Babilônia, o principal sacerdote era Esdras, conhecedor das leis de Moises e bem relacionado com Xerxes. Pretendendo viajar a Jerusalém, com judeus que ainda se encontravam na Babilônia, Esdras conseguiu do rei Xerxes uma carta de recomendação que o permitisse passar com segurança pelos países do trajeto para a Judeia. Mais do que isso, permitiu à comitiva que levasse riquezas e bens da Pérsia, que servissem como sacrifícios dos judeus a Deus. Satisfeito com a boa vontade de Xerxes que o tornava responsável perante os judeus por tudo o que conseguira para levar à Judeia, Esdras organizou o povo que participaria da viagem, para o seu pleno sucesso, renunciando ao exército que Xerxes lhe oferecera como segurança. Partiram do Eufrates no 12º dia do 1º mês do 7º ano do reinado de Xerxes, chegando a Jerusalém no 5º mês do mesmo ano. Lá chegando, Esdras entregou aos tesoureiros, da família dos sacerdotes dos judeus, todos os presentes enviados por Xerxes bem como sua carta aos oficiais do Rei e aos governadores dos reinos vizinhos para que bem entendessem a boa vontade de Xerxes para com os judeus e os auxiliassem no que pudessem.
Logo começaram a surgir queixas contra alguns dos cidadãos que haviam se casado com mulheres estranhas à nação judaica, assim transgredindo as leis do seu país. Os acusadores argumentavam que Esdras deveria obrigar os faltosos a enviar de volta para os seus países, as mulheres estrangeiras com os filhos gerados, a fim de obter o perdão de Deus. Surge a figura importante de Jechonias depondo contra os faltosos, o que motiva Esdras a obrigar os chefes dos sacerdotes, dos levitas e dos israelitas a jurarem que mandariam embora as esposas e crianças. Isto feito e a fim de apaziguar Deus, ofereceram sacrifícios de animais e outros bens. Ao 7º mês tiveram início as Festas do Tabernáculo que duraram oito dias, após o que todos retornaram às suas casas cantando hinos a Deus e agradecendo a Esdras pelo conserto das faltas introduzidas. Após ter obtido tal reputação entre o povo, Esdras morreu velho e foi enterrado de maneira magnífica em Jerusalém. Ao mesmo tempo, morreu também o alto sacerdote Joachim, sucedido por seu filho Eliasib no alto sacerdócio.
Alguns anos depois, Neemias, um judeu em Susa, metrópole da Pérsia, que servia como copeiro de Xerxes, ficou sabendo que Jerusalém e o povo estavam novamente em péssimo estado, por ação de seus vizinhos. Neemias deu conhecimento do assunto a Xerxes que novamente escreveu carta aos vizinhos dos judeus, autorizando Neemias a voltar para Jerusalém com a carta que cobrava ajuda da Samaria e adjacências para a reconstrução da cidade e manutenção do templo. No 25º ano do reinado de Xerxes, Neemias retornou a Jerusalém com muitos judeus que voluntariamente o acompanharam. Em Jerusalém ele reuniu todo o povo e informou a razão de sua ida, conclamando os judeus a se reunirem por vontade de Deus e se dedicarem com ânimo à reconstrução das muralhas e à manutenção do Templo, sem se preocuparem com as afrontas dos reinos vizinhos. E após prometer que ele mesmo, com seus servos, assistiria aos judeus (assim chamados após o retorno da Babilônia, a partir do nome da tribo de Judá) na reconstrução, Neemias dissolveu a assembleia.
Logo os moabitas, amonitas, samaritanos e sírios reiniciaram suas provocações que incluíram ameaças de morte ao próprio Neemias, provocando de parte dos judeus medidas especiais para que pudessem prosseguir em seus trabalhos. Nesses moldes, a construção das muralhas demandou dois anos e quatro meses, sendo concluídas no nono mês do 28º ano do reinado de Xerxes. Encerrada a construção, Neemias e o povo ofereceram sacrifícios a Deus e festejaram durante oito dias, o que deixou indignadas as nações vizinhas. Neemias tomou ainda várias outras providências para garantir a vida tranquila da população e morreu velho e feliz por ter realizado a felicidade do povo de Jerusalém.
Com a morte do rei Xerxes, assumiu o trono da Pérsia seu filho Artaxerxes I (que alguns conhecem por Cyrus), que se casou com uma moça judia, de família real e que teve importante papel na preservação do povo judeu. O rei separando-se de sua primeira esposa, ordenou que fossem selecionadas um grande número de virgens para que escolhesse entre elas a sua nova esposa. Artaxerxes acabou apaixonando-se por Esther, uma jovem órfã judia criada por Mordecai, seu tio. O rei casou-se com ela e levou-a para habitar o seu palácio em Shushan, abandonando a Babilônia onde vivia, sem saber que Esther era judia.
Um complô contra o rei foi descoberto por Esther e denunciado por Mordecai ao Rei, que determinou a execução dos envolvidos, tornando Mordecai, que foi habitar no palácio, um de seus favoritos. Havia no reino um amalequita (inimigo dos judeus) de nome Haman que costumava ir ao rei e a quem Artaxerxes ordenara que persas e estrangeiros o adorassem. Mordecai, de origem judia, negou-se a tal procedimento e por isso Haman descobriu que ele e sua família eram judeus e resolveu aproveitar denunciando-os ao Rei para provocar a extinção de todos os judeus, propondo-se a pagar do seu bolso um valor equivalente ao tributo pago pelo povo judeu. O rei aceitou a proposta e Haman enviou decretos a todas as nações sob o jugo persa determinando a morte de todos os judeus, suas esposas e filhos, até o 14º dia do 12º mês daquele corrente ano. Mordecai e os judeus de todas as partes fizeram tais notícias chegassem aos ouvidos do Rei e da Rainha.
Essas intrigas envolvendo o Rei Artaxerxes, sua esposa Esther, Haman e Mordecai permaneceram durante algum tempo até que todas as artimanhas de Haman foram descobertas por Artaxerxes por meio de sua esposa Esther. O rei, que então ficara sabendo do parentesco de Esther com Mordecai, chamou-o e deu-lhe o anel que antes havia dado a Haman, bem como sua casa. A rainha solicitou também ao rei que liberasse totalmente a nação dos judeus do medo da morte, ao que o rei respondeu que nada faria que a desagradasse, mas que ela escrevesse tudo o que lhe agradasse sobre os judeus, em nome do rei, que lhe aporia o selo real e o enviaria a todo o seu reino.
Após aqueles dias, como celebração, os judeus realizaram vários dias de festivais que chamaram Phurim ou Purim, que continuam a ser celebrados até hoje. Mordecai tornou-se um grande e ilustre personagem junto ao rei, assistindo-o sempre no governo do povo. Com isso, os assuntos do povo judeu foram resolvidos ainda melhor do que se poderia esperar. Esta a situação dos Judeus sob o reino de Artaxerxes.
Quando o sacerdote Eliasib morreu, seu filho Judas sucedeu-o no alto sacerdócio e com sua morte, seu filho João assumiu aquela dignidade. Foi sob o seu comando que Bagoses, general de outro exército de Artaxerxes poluiu o Templo, impondo novos tributos aos Judeus. Jesus, irmão de João, era amigo de Bagoses, que lhe havia prometido o alto sacerdócio. Por isso os dois irmão brigaram no Templo e de tal forma violenta que João acabou assassinando Jesus, crime enorme principalmente considerada a sua situação de alto sacerdote. Quando Bagoses, o general persa, soube que João, o alto sacerdote dos Judeus havia assassinado seu irmão Jesus, no Templo, quis adentrar o templo, mas os judeus não permitiram, ao que ele respondeu: “Por acaso eu não sou mais puro que o assassino do templo?” E entrou, punindo os judeus por sete anos pelo assassinato de Jesus!
Quando João morreu, seu filho Jaddua o sucedeu no alto sacerdócio. Ele tinha um irmão de nome Manasseh. Na Samaria havia nesta época um homem chamado Sanballat, do mesmo estoque dos samaritanos, que havia sido enviado por Dario. Ele sabia que os reis de Jerusalém haviam dado muitos problemas aos assírios e ao povo da Selesíria, por isso deu sua filha Nicaso em casamento a Manasseh de modo a criar um compromisso com os judeus para que esses não lhe criassem problemas. Os anciãos de Jerusalém, com o alto sacerdote Jaddua, não viram com bons olhos o casamento de Manasseh com uma estrangeira, como já tinha ocorrido anteriormente, exigindo a sua separação da esposa ou o seu afastamento definitivo do altar sagrado. Manasseh buscou o auxílio de seu sogro, Sanballat, explicando toda a situação. Sanballat prometeu-lhe a manutenção de sua dignidade, bem como dar-lhe o governo de todos os locais que ele agora governava e também a construção de um templo como o de Jerusalém, no monte Gerizzini, a mais alta montanha da Samaria, com a aprovação de Dario, se ele não se separasse de sua filha. Foi por esse tempo que morreu Jaddua, o alto sacerdote, tomando seu lugar o seu filho Onias na Jerusalém daquele tempo. (Parte 4 na próxima postagem)


[1] A Coelesyria (Selesíria) era uma região da Síria na antiguidade clássica, na maioria das vezes aplicada ao vale do Beqaa, entre as cadeias de montanhas do Líbano e Ante-Líbano. É agora parte da Síria e Líbano dos dias modernos.

[2] A Fenícia foi uma antiga civilização na região do Levante, Mediterrâneo Oriental, primariamente localizada nos modernos Líbano e Síria costeira. O território dos fenícios estendeu-se e retraiu-se através da história, com o núcleo de sua cultura estendendo-se de Trípoli (norte do Líbano moderno) até o Monte Carmel (Israel moderno). Além de sua terra natal, os fenícios se espalharam através do Mediterrâneo, de Chipre até a Península Ibérica.

quarta-feira, 1 de outubro de 2025

HISTÓRIA DO POVO JUDEU APÓS O RETORNO DE SEU EXÍLIO NA BABILÔNIA (PARTE 2)

III – O NOVO IMPÉRIO BABILÔNICO


O Novo Império Babilônico ou Segundo Império Babilônico, historicamente conhecido como Império Caldeu, foi o último sistema governado por monarcas nativos da Mesopotâmia (região do atual Iraque). Iniciado com a coroação de Nabopolassar como rei da Babilônia em 626 AC e estabelecendo-se firmemente com a queda do Império Neo-Assírio em 612 AC, o Novo Império Babilônico foi conquistado pelo Império Persa Aquemênida em 539 AC.
A queda do Novo Império Assírio e a subsequente transferência de poder de Nínive para a Babilônia, marcou a primeira vez em que a cidade e, em geral, o sul da Mesopotâmia, havia se levantado para dominar o antigo Oriente Próximo desde o colapso do Antigo Império Babilônico sob Hamurabi, cerca de mil anos antes. O Novo Império Babilônico mantém uma posição notável na memória cultural dos dias atuais devido a um desagradável retrato da Babilônia e seu maior rei, Nabucodonosor II, pintados nos textos da Bíblia judaica. A cobertura bíblica de Nabucodonosor II foca em sua campanha militar contra o Reino de Judá e, particularmente, no cerco babilônico sobre Jerusalém em 587 AC que resultou na destruição do Templo de Salomão e o subsequente cativeiro babilônico do povo judeu. As fontes babilônicas descrevem o reino de Nabucodonosor II como uma idade dourada que transformou a Babilônia no maior império do seu tempo. 
Cidades importantes da Mesopotâmia no Novo Império
Ainda sob autoridade do rei do Novo Império Assírio na Babilônia, Sin-shar-ashkun, o então oficial do sul, general Nabopolassar, usou a política de instabilidade na Assíria, causada por uma breve guerra civil anterior entre Sin-shar-ashkun e o general Sin-shumu-lishir, para se revoltar. Em 626 AC Nabopolassar assaltou e dominou com sucesso as cidades da Babilônia e Nippur. A resposta de Sin-shar-ashkun foi rápida e decisiva, recapturando Nippur e sitiando Nabopolassar na cidade de Uruk em outubro do mesmo ano, mas sem conseguir retomar a Babilônia. Nabopolassar resistiu ao cerco de Uruk e expulsou o exército assírio. Em novembro de 626 AC Nabopolassar foi formalmente coroado Rei da Babilônia, como reino independente após mais de um século de direto mando assírio. Em 623 AC, Sin-shar-ashkun conduziu um contra-ataque maciço que poderia tê-lo tornado vitorioso, mas teve que abandonar a campanha devido a uma revolta na Assíria que ameaçava sua posição como rei. A ausência de exército assírio permitiu aos babilônios conquistar os remanescentes postos assírios na Babilônia e manter firme controle sobre Uruk e Nippur até 620 AC, assim consolidando o controle de Nabopolassar sobre toda a Babilônia, o que fez rapidamente desmoronar o Império Assírio.
Ao final de 615 AC, os Medos (da Média, Pérsia) sob o rei Cyaxares, também antigos inimigos da Assíria, conquistaram a região assíria em torno de Arrapha. No meio do ano de 614 AC, os Medos começaram a atacar as cidades de Kalhu e Nínive, além de sitiar, com sucesso, Assur, antigo coração político da Assíria, promovendo saque brutal. Nabopolassar chegou em Assur somente após o início do saque, encontrando-se com e aliando-se a Cyaxares, com quem assinou um pacto contra os assírios. Em abril ou maio de 612 AC, início do 14º ano de Nabopolassar como rei da Babilônia, o exército combinado Medo-Babilônio marchou sobre Nínive. De junho a agosto do mesmo ano sitiaram a capital assíria e em agosto as muralhas foram rompidas, conduzindo a um novo longo e brutal saque durante o qual supõe-se que Sin-shar-ashkun tenha morrido. Seu sucessor Ashur-uballit II, último rei da Assíria, foi derrotado em Harran em 609 AC. O Egito, aliado da Assíria, continuou a guerra contra a Babilônia por alguns anos, sendo finalmente derrotado pelo príncipe da coroa de Nabopolassar, Nabucodonosor, em Carchemish, em 605 AC. 
Nabucodonosor II, responsável pelo cativeiro Judeu

Nabucodonosor II sucedeu a Nabopolassar, seu pai, em 605AC. O império que herdou estava entre os mais poderosos do mundo e ele rapidamente reforçou a aliança de seu pai com os Medos, casando-se com a filha ou neta de Cyaxares, Amytis. Algumas fontes sugerem que os famosos “Jardins Suspensos da Babilônia”, uma das “Sete Maravilhas do Mundo Antigo”, foram construídos por Nabucodonosor, para sua esposa, para lembrá-la de sua terra natal. Os 43 anos do reinado de Nabucodonosor trouxeram uma idade de ouro para a Babilônia que a tornou o mais poderoso do Oriente Médio.
Suas campanhas mais famosas foram as realizadas no Levante, relativamente no início do seu reinado, para estabilizar seu reino e consolidar o seu império – a maioria dos reinos e cidades-estados recém independentes no Levante eram vassalos do Novo Império Assírio. Sua destruição de Jerusalém em 587 AC acabou com o Reino de Judá, então sob o reinado de Sedequias, e dispersou sua população, com a maioria de seus cidadãos de elite sendo enviados para a Babilônia, iniciando um período conhecido como “Cativeiro Babilônico”.
O exílio dos Judeus, de Canaã à Babiônia, segundo James Tissot, 1896
 Subsequentemente, ele sitiou o Tiro por 13 anos e embora não tivesse capturado a cidade, ela rendeu-se a ele em 573 AC, concordando em ser governada por reis vassalos. 
A partir desse ponto, a fonte principal da pesquisa passa a ser “As Antiguidades dos Judeus”, de Flavius Josephus. (Parte 3 na próxima postagem).