Homenagem ao lendário herói ancestral dos ingleses que deu título a um dos considerados "Cem Maiores Livros do Mundo" e tido como o mais antigo escrito em "Old English".

terça-feira, 27 de março de 2012

HISTÓRIA DO BRASIL NA PRIMEIRA METADE DO SÉCULO XX (PARTE 2)

A REVOLUÇÃO DE 1930

A SUCESSÃO DO PRESIDENTE WASHINGTON LUÍS

Na chamada República Velha (1889 - 1930), as eleições para presidente da república ocorriam em 1o de março e a posse do presidente eleito ocorria em 15 de novembro, de quatro em quatro anos. Como não existiam partidos políticos organizados a nível nacional na República Velha, cabia ao presidente da república a condução de sua sucessão, conciliando os interesses dos partidos políticos de cada estado.
A eleição para escolha do sucessor do presidente Washington Luís, que governava desde 1926, estava marcada para 1º de março de 1930. A posse do seu sucessor deveria ocorrer em 15 de novembro de 1930.
À época, vigorava, em termos políticos, a chamada "política do café-com-leite", em que os presidentes dos estados de São Paulo e de Minas Gerais alternavam-se na presidência da república. De acordo com esta "política do café-com-leite", Washington Luís deveria indicar, para ser seu sucessor, o presidente de Minas Gerais, Antônio Carlos Ribeiro de Andrada, ou o vice-presidente da República, que era o mineiro Fernando de Melo Viana, ex-presidente de Minas Gerais, ou outro líder político mineiro.
Porém, no início de 1929, o presidente da República, Washington Luís, fluminense, da cidade de Macaé, radicado em São Paulo desde sua juventude, tendia a apoiar o presidente de São Paulo, Júlio Prestes, que pertencia ao Partido Republicano Paulista, ao qual também pertencia Washington Luís.
Em 29 de março, o “The New York Times” informa que os cafeicultores de São Paulo dariam um banquete a Júlio Prestes, em Ribeirão Preto, em apoio a sua candidatura à presidência, e esperavam o apoio dos demais estados produtores de café. O jornal informava ainda que Minas Gerais estava politicamente dividida.
O presidente de Minas Gerais quebra o acordo assumido com Washington Luís, de só tratar da questão sucessória a partir de setembro de 1929 e envia-lhe uma carta, datada de 20 de julho de 1929, em que propõe uma solução conciliatória, indicando Getúlio Vargas como o preferido para candidato à presidência da república para o mandato de 1930 a 1934.
Em vista disso, Washington Luís inicia o processo sucessório, consultando os presidentes dos 20 estados do Brasil à época, indicando o nome do presidente de São Paulo, Júlio Prestes de Albuquerque, paulista, como o seu sucessor, tendo sido apoiado pelos presidentes de dezessete estados. Apenas três estados negaram apoio a Júlio Prestes: Minas Gerais, Rio Grande do Sul e Paraíba, então sob o governo de João Pessoa Cavalcanti de Albuquerque.
Os políticos de Minas Gerais apoiadores da política "carlista", insatisfeitos com a indicação de Júlio Prestes lançaram, então, Getúlio como candidato de oposição à candidatura de Júlio Prestes, encerrando de vez a política “café com leite”. Antônio Carlos ficaria conhecido como o "Arquiteto da Revolução de 1930".
Os três estados dissidentes iniciaram a articulação de uma frente ampla de oposição, chamada de “Aliança Liberal”, que tinha o objetivo de se opor ao intento do presidente da república e dos dezessete estados de eleger Júlio Prestes. Washington Luís manteve a candidatura do paulista, Júlio Prestes, oficializada em 12 de outubro, como queriam os cafeicultores de São Paulo, apesar das pressões de Minas Gerais, Paraíba e do Rio Grande do Sul. Por seu lado, Antônio Carlos não aceitou retirar a candidatura Getúlio.

A ALIANÇA LIBERAL E O TENENTISMO

Formavam a “Aliança Liberal”, Minas Gerais, Rio Grande do Sul e Paraíba, além de partidos políticos de oposição de diversos estados, inclusive do Partido Democrático de São Paulo, criado como dissidência do PRP, ao qual pertenciam Júlio Prestes e Washington Luís. Em contrapartida, em Minas Gerais, a aliança política denominada "Concentração Conservadora" apoiou Júlio Prestes.
A Aliança Liberal concretizou-se em 20 de setembro (não por acaso, aniversário da Revolução Farroupilha, no Rio Grande do Sul) de 1929, numa convenção dos estados e partidos oposicionistas, no Rio de Janeiro, presidida por Antônio Carlos de Andrada, lançando como seus candidatos às eleições presidenciais: Getúlio Dorneles Vargas para presidente da República e João Pessoa Cavalcanti de Albuquerque, presidente da Paraíba, para a vice-presidência da República.

Vargas e João Pessoa
Washington Luís tentou convencer os presidentes gaúcho e mineiro de desistirem dessa iniciativa, em carta dirigida a Andrada, argumentando que dezessete estados apoiavam a candidatura oficial, sem lograr êxito.
Em 12 de outubro de 1929, realizou-se, no Rio de Janeiro, uma convenção dos 17 estados governistas, que indicou Júlio Prestes de Albuquerque como candidato à presidência da República e o presidente da Bahia, Vital Soares, presidente da Bahia e pertencente ao Partido Republicano Baiano, a vice-presidente.
Em dezembro de 1929, formalizou-se um acordo, no qual Getúlio Vargas comprometia-se a aceitar os resultados das eleições e, em caso de derrota da Aliança Liberal, se comprometia a apoiar Júlio Prestes. Em troca, Washington Luís comprometia-se a não ajudar a oposição gaúcha a Getúlio, a qual praticamente não existia, pois o Rio Grande do Sul unira-se em torno de seu nome.
A Aliança Liberal teve o apoio de intelectuais importantes, de membros das camadas médias urbanas, na época chamadas de Classes Liberais que se opunham às Classes Conservadoras, formadas pelas associações comerciais e fazendeiros. No Rio Grande do Sul, o grande articulador da Aliança Liberal foi Osvaldo Aranha.
Entretanto, a “Aliança Liberal” contou, fundamentalmente, com o apoio da corrente político-militar chamada "Tenentismo". Destacavam-se, entre os tenentes: Cordeiro de Farias, Newton de Andrade Cavalcanti, Eduardo Gomes, Antônio de Siqueira Campos, João Alberto Lins de Barros, Juarez Távora, Luís Carlos Prestes, João Cabanas, Newton Estillac Leal, Filinto Müller e os três tenentes conhecidos como os "tenentes de Juarez": Juracy Magalhães, Agildo Barata e Jurandir Bizarria Mamede. E ainda na marinha do Brasil: Ernâni do Amaral Peixoto, Ari Parreiras, Augusto do Amaral Peixoto, Protógenes Pereira Guimarães. E o general reformado Isidoro Dias Lopes, o general honorário do exército brasileiro José Antônio Flores da Cunha e o major da Polícia Militar de São Paulo Miguel Costa. O tenente Cordeiro de Farias, que chegou a marechal, afirmou, em suas memórias, que os tenentes estavam em minoria no exército brasileiro, mas que mesmo assim fizeram a revolução de 1930.

A ELEIÇÃO DE 1º DE MARÇO DE 1930

A Aliança Liberal entrou na disputa eleitoral sabendo, de antemão, que seria dificílima a vitória, tendo apoio de apenas três estados. A campanha eleitoral, no entanto, ocorreu relativamente calma, dentro dos padrões de violência da República Velha.
A eleição para a presidência da república foi realizada no dia 1 de março de 1930, um sábado de carnaval, e foi vencida por Júlio Prestes, (chamado, pela imprensa, Candidato Nacional) com 1.091.709 votos contra 742.797 dados a Getúlio (Candidato Liberal), que obteve 100% dos votos do Rio Grande do Sul e um total de 610.000 votos nos três estados aliancistas. A votação de Getúlio nos 17 estados “prestistas” foi inexpressiva. Houve empate no antigo Distrito Federal, a cidade do Rio de Janeiro. Júlio Prestes foi eleito para governar de 1930 a 1934, com posse na presidência prevista para o dia 15 de novembro de 1930. A apuração, entretanto, só foi encerrada em maio de 1930, em meio a distúrbios de toda a ordem. Em 22 de maio de 1930, o Congresso Nacional proclama eleitos para a presidência e vice-presidência da república, Júlio Prestes e Vital Soares.
Em seguida à proclamação final dos resultados, o presidente eleito Júlio Prestes viajou para os Estados Unidos, sendo recebido como presidente eleito pelo presidente dos EUA, Herbert Hoover. Em Washington declara que o Brasil nunca será uma ditadura e se torna o primeiro brasileiro a sair na capa da revista Time, retornando a São Paulo em 6 de agosto e sendo recebido por uma multidão de adeptos.
Acusações de fraude eleitoral ocorreram de ambas as partes, como em todas as eleições brasileiras desde o Império, e a Aliança Liberal recusou-se a aceitar o resultado das urnas.

A CONSPIRAÇÃO

A partir da recusa da maioria dos políticos e tenentes da Aliança Liberal em aceitar o resultado das urnas, iniciou-se uma conspiração, com base no Rio Grande do Sul e em Minas Gerais, com a intenção de não permitir que Júlio Prestes assumisse a presidência em 15 de novembro. No nordeste do Brasil, o tenente Juarez Távora, que havia fugido da prisão em janeiro de 1930, organizava, na clandestinidade, a revolução. Esta conspiração sofreu um revés em 10 de maio, quando morreu, em acidente aéreo, o tenente Antônio Siqueira Campos, articulador político e contato com militares estacionados em São Paulo, praticamente encerrando o ímpeto revolucionário entre aqueles militares. Em 29 de maio de 1930, a conspiração sofreu novo revés, com o brado comunista de Luís Carlos Prestes, que deveria ter sido o comandante militar da revolução de 1930, mas desistiu para apoiar o comunismo. O comandante militar secreto da revolução ficou sendo então o tenente-coronel Pedro Aurélio de Góis Monteiro.
Em 18 de julho, o jornal prestista da Concentração Conservadora "Folha da Noite", em Belo Horizonte, foi destruído por um grupo de aliancistas que chamavam o presidente de Minas Gerais, Antônio Carlos, de covarde, pedindo abertamente a revolução.

O ASSASSINATO DE JOÃO PESSOA

Em 26 de julho de 1930, João Pessoa, presidente da Paraíba, foi assassinado por João Duarte Dantas, em Recife, por questões de ordem estritamente pessoal. João Duarte Dantas, cuja família era inimiga política de João Pessoa, tivera o escritório de advocacia saqueado e de seu cofre foram roubadas cartas e poemas de amor da escritora Anayde Beiriz, que foram divulgados e considerados escabrosos. Alguns livros de história afirmam que a correspondência foi publicada no jornal oficial do governo estadual, A União. Outros dizem que as cartas apenas circularam de mão em mão. De qualquer forma, tornaram-se públicas e foi um escândalo. No dia 26 de julho, quando João Pessoa estava com amigos na Confeitaria Glória, em Recife, João Dantas vingou-se: acompanhado de um cunhado, disparou dois tiros contra o peito do presidente da Paraíba. João Duarte Dantas confessou ter matado João Pessoa para defender a sua honra, sendo preso e levado para a casa de detenção da Paraíba, onde foi espancado e morto. Oficialmente, teria se suicidado. Anayde foi encontrada morta em 22 de outubro, por envenenamento, em Recife, num outro suposto suicídio. Apesar de totalmente desvinculado da eleição de Júlio Prestes, o episódio do assassinato de João Pessoa foi o estopim que deflagrou a mobilização armada dos partidários de Getúlio e da Aliança Liberal. O corpo de João Pessoa foi embarcado em navio, no Recife, em 31 de julho de 1930, para ser enterrado, em 18 de agosto, no Rio de Janeiro. Tanto em Recife, como no Rio de Janeiro, houve missas solenes e discursos inflamados, em que a culpa pela morte de João Pessoa era imputada ao governo de Washington Luís. E os conflitos armados generalizaram-se por todo o país.
O Presidente da República não se defendia das acusações, embora o alerta de seus assessores sobre um movimento subversivo em marcha, visando a sua derrubada do poder, e nenhuma medida preventiva foi tomada para impedir a revolução.

A REVOLUÇÃO DE 3 DE OUTUBRO DE 1930

Em 7 de setembro de 1930, o movimento revolucionário tem um novo impulso, quando Antônio Carlos passa o governo de Minas Gerais a Olegário Maciel, muito mais decidido a fazer a revolução do que o primeiro. O Presidente Olegário foi o único presidente de estado a continuar no cargo após a revolução de 1930.
Sobre o sigilo da conspiração, Getúlio contou à "Revista do Globo", em edição especial de agosto de 1950, que sua filha Alzira só soube da revolução dois dias antes dela ter início, afirmando:
“Em 1930, preparando a revolução, fui obrigado a fazer um jogo duplo: de dia mantinha a ordem para o governo federal e à noite introduzia os conspiradores no Palácio Piratini”.
Em 25 de setembro de 1930 foi determinado, pelo comando revolucionário, que a revolução começaria em 3 de outubro, as 17:00 horas. O início da revolução já havia sido adiado várias vezes, devido às hesitações e indecisões dos revolucionários. Desta vez não houve adiamentos e na tarde de 3 de outubro de 1930, em Porto Alegre, iniciou-se a Revolução de 1930, com a tomada do quartel-general da 3ª Região Militar, sob o comando de Osvaldo Aranha e Flores da Cunha. Neste ataque aconteceram as primeiras mortes da revolução de 1930.
Neste mesmo dia, precisamente, Getúlio Vargas começou a escrever o seu diário, encerrado em 1942. Na abertura do "Diário", meia hora antes do início da revolução, refletindo sobre sua responsabilidade na revolução e um eventual fracasso desta, Getúlio escreveu:
“Quatro e meia. A hora se aproxima. Examino-me e sinto-me com o espírito tranquilo de quem joga um lance decisivo porque não encontrou outra saída. A minha vida não me interessa e sim a responsabilidade de um ato que decide o destino da coletividade. Mas esta queria a luta, pelo menos nos seus elementos mais sadios, vigorosos e altivos. Não terei depois uma grande decepção? Como se torna revolucionário um governo cuja função é manter a lei e a ordem? E se perdermos? Eu serei depois apontado como o responsável, por despeito, por ambição, quem sabe? Sinto que só o sacrifício da vida poderá resgatar o erro de um fracasso!!”
No Nordeste do Brasil, devido a um erro de interpretação das ordens dadas pelo comando revolucionário, a revolução só iniciou na madrugada de 4 de outubro, alastrando-se por todo o país. As tropas gaúchas marcharam rumo a São Paulo, porém sem derrubar o governo catarinense, só conseguindo tomar a Ilha de Santa Catarina no dia 16. Em Minas Gerais, inesperadamente, houve resistência, pois o 12º Regimento de Infantaria de Belo Horizonte não aceitou o golpe.

Vargas na vitória do Golpe de 1930
 Oito governos estaduais no nordeste do Brasil, na época chamada de Norte, foram depostos pelos tenentes que enfrentaram, na Bahia e em Pernambuco, resistência notável. O governo de Pernambuco caiu em 8 de outubro, após um combate que matou 150 brasileiros.
No dia 10, Getúlio Vargas partiu, por ferrovia, rumo ao Rio de Janeiro, capital federal à época, deixando o governo do Rio Grande do Sul com Osvaldo Aranha e não ao vice-presidente gaúcho João Neves da Fontoura, seu amigo e colega, fato que o levou a renunciar ao seu cargo de vice-presidente gaúcho.
Em meados de outubro, a revolução dominava apenas parte do nordeste do Brasil e parte do Sul do Brasil. Mantinham-se leais ao governo federal, os estados de Santa Catarina, Bahia, São Paulo, Rio de Janeiro e o Distrito Federal (Rio de Janeiro), toda a região norte do Brasil - Amazonas, Pará e o Território do Acre -, e todo o Centro Oeste - Goiás e Mato Grosso. O governo Capixaba e o de Santa Catarina foram derrubados em 16 de outubro de 1930, e os demais citados somente com o golpe militar que pôs fim à revolução.
No Nordeste do Brasil os revolucionários marchavam em direção à Bahia. Pelo sul, os revolucionários, vindos do Rio Grande do Sul, estavam estacionados na região de Itararé, na divisa do Paraná com São Paulo, onde as forças do governo federal e tropas paulistas estavam acampadas para deter o avanço das tropas revolucionárias, esperando-se que aí ocorresse uma grande batalha. Getúlio aguardava os acontecimentos, instalado em Curitiba. No Sul de Minas Gerais tropas federais ainda resistiam ao avanço das tropas mineiras rumo ao Rio de Janeiro.

Getúlio Vargas e Góis Monteiro
Felizmente, a esperada Batalha de Itararé não correu porque, em 24 de outubro, antes que ela ocorresse, os generais Tasso Fragoso e Mena Barreto e o almirante Isaías de Noronha depuseram Washington Luís através de um golpe militar, e formaram uma Junta Militar Provisória. No mesmo dia, Osvaldo Aranha foi enviado ao Rio de Janeiro para negociar a entrega do poder a Getúlio Vargas. A Junta Militar governou o Brasil até passar o governo a Getúlio em 3 de novembro de 1930. Washington Luís foi deposto apenas 22 dias antes do término do mandato presidencial, que se encerraria em 15 de novembro de 1930.
Jornais que apoiavam o governo deposto foram destruídos, entre eles jornais influentes, como “O País”, "A Noite", "Correio Paulistano", órgão oficial do Partido Republicano Paulista, “A Plateia”, "Gazeta de Notícias", "A Crítica" e a "Folha da Manhã", atual “Folha de S. Paulo”. O edifício-sede de "O País" foi totalmente incendiado. As polícias do Rio de Janeiro, então capital federal, e de São Paulo se omitiram e nada fizeram para impedir os atos de vandalismo.
Washington Luís, Júlio Prestes e vários outros próceres políticos da República Velha foram presos e exilados. Washington Luís só retornou ao Brasil em 1947, depois da deposição de Getúlio Vargas, em 1945.
Getúlio, depois de uma passagem por São Paulo, onde ocupou o Palácio dos Campos Elísios, sede do governo paulista deposto, rumou para o Rio de Janeiro onde chegou de trem em 31 de outubro de 1930, inteirou-se da situação política e assumiu o governo, que lhe foi entregue pela Junta Militar. A cena em São Paulo jamais seria esquecida pelos paulistas: soldados mineiros e gaúchos, com fuzis nos ombros, montando guarda para Getúlio na sede do governo paulista.


O GOVERNO PROVISÓRIO (1930 – 1934)

Às 3 horas da tarde de 3 de novembro de 1930, a Junta Militar Provisória passou o poder, no Palácio do Catete, a Getúlio Vargas, (que vestia farda militar pela última vez na vida), encerrando a chamada República Velha. Na mesma hora, no centro da cidade do Rio de Janeiro, os soldados gaúchos cumpriam a promessa de amarrar os cavalos no obelisco da Avenida Central, atual Avenida Rio Branco, marcando simbolicamente o triunfo da Revolução de 1930.
Getúlio tornou-se “Chefe do Governo Provisório” com amplos poderes; os próprios revolucionários não aceitaram o título "Presidente da República". Seu governo provisório foi o segundo da república, o primeiro tendo sido o de Deodoro da Fonseca.
Getúlio governava através de decretos com força de lei, incluindo o de número 19.398, de 11 de novembro de 1930, que instituiu e regulamentou o funcionamento do Governo Provisório. Entre outras “pérolas”, este decreto:
•    Suspendia as garantias constitucionais da Constituição de 1891, exceto o habeas corpus para crimes comuns.
•    Confirmava a dissolução do Congresso Nacional do Brasil, dos congressos estaduais e das câmaras municipais. Os deputados, senadores e presidentes de estados, eleitos em 1930, nunca chegaram a tomar posse dos seus mandatos.
•    Confirmava também todos os atos da Junta Militar Provisória.
•    Autorizava Getúlio a nomear e exonerar, a seu livre critério, interventores para os governos estaduais, na maioria tenentes que participaram da Revolução de 1930.
•    Excluía de apreciação judicial os atos do Governo Provisório e os atos dos interventores federais nos estados. Assim, nenhum ato e nenhum decreto do Governo Provisório e dos interventores podia ser contestado na justiça brasileira.
•    A atuação dos interventores federais nos estados era disciplinada, no Governo Provisório, pelo "Código dos Interventores", nome pelo qual ficou conhecido o decreto nº 20.348, de 29 de agosto de 1931, que instituiu conselhos consultivos nos Estados, no Distrito Federal e nos municípios e estabeleceu normas sobre a administração local.
Os oficiais das forças armadas que permaneceram fiéis ao governo deposto, tiveram suas carreiras abortadas, sendo colocados, por decreto, na reserva militar. No Supremo Tribunal Federal, em fevereiro de 1931, 6 ministros, apoiadores do governo deposto, foram aposentados compulsoriamente e o número de ministros reduzido de quinze para onze.
Mesmo na Marinha do Brasil, que não havia combatido os revolucionários de 1930, houve, por insistência de Getúlio, aposentadorias forçadas, o que levou o ministro da Marinha, José Isaías de Noronha a pedir exoneração do seu cargo.
Foram investigadas minuciosamente as administrações e os políticos da República Velha, através de uma chamada "Justiça Revolucionária" e de um "Tribunal Especial", criados em 1930, pelo decreto que instituiu o Governo Provisório e organizado por outro decreto, com o objetivo de analisar o "processo e julgamento de crimes políticos, funcionais e outros que serão discriminados na lei de sua organização".
Entretanto, como o próprio Getúlio confirmou em seu Diário, no dia 4 de dezembro de 1932, nada foi encontrado de irregularidades e de corrupção naquele regime deposto em 1930, motivo pelo qual, mais tarde, surgiria a expressão: "os honrados políticos da República Velha". O Tribunal Especial foi dissolvido, em 1932, sem condenar uma só pessoa.
Houve, no início do Governo Provisório, uma espécie do comando revolucionário, denominado oficialmente de Conselho Nacional Consultivo, criado pelo decreto que regulamentou o Governo Provisório, e que recebeu o apelido de "Gabinete Negro", do qual faziam parte Getúlio Vargas, Pedro Ernesto, o general José Fernandes Leite de Castro, Ari Parreiras, Osvaldo Aranha, Góis Monteiro, José Américo de Almeida, Juarez Távora e o tenente João Alberto Lins de Barros, entre outros. O Gabinete Negro se sobrepunha ao gabinete ministerial, tomava as decisões e definia os rumos da revolução.
A radicalização política dos tenentes representou o maior perigo para Getúlio em 25 de fevereiro de 1932, quando foi destruído, na cidade do Rio de Janeiro, um jornal de oposição ao Governo Provisório, o Diário Carioca.
A recusa de Getúlio em punir os tenentes responsabilizados pelo ato, fez com que o ministro do trabalho Lindolfo Collor, o ministro da justiça Joaquim Maurício Cardoso e o chefe de polícia do Rio de Janeiro, João Batista Luzardo, pedissem exoneração de seus cargos. João Neves da Fontoura também rompeu com Getúlio. Os jornais do Rio de Janeiro ficaram dois dias sem circular, em solidariedade ao Diário Carioca.
O gabinete ministerial do Governo Provisório, composto por apenas nove pessoas (sete civis e dois militares), foi cuidadosamente montado, para premiar e contentar os três estados revolucionários, partidos políticos (Partido Libertador, PRR, PRM, Partido Republicano Paraibano e o Partido Democrático), tenentes e a Junta Militar Provisória que, juntos, fizeram a Revolução de 1930.
Duas das peças mais importantes da Revolução de 1930 e muito chegadas a Getúlio Vargas, tiveram fim incompatível com seu papel relevante durante o golpe, devido a dissidências posteriores com o Chefe do Governo Provisório. O General Flores da Cunha, próximo ao golpe do Estado Novo de 1937, abandonou o cargo de governador gaúcho, exilando-se no Uruguai. Antônio Carlos de Andrada, chamado por Getúlio, em seu Diário, “a Velha Raposa”, com o advento do Estado Novo abandonou a vida pública. Além destes, o major Miguel Costa foi cassado depois da Intentona Comunista; Juarez Távora, aos poucos, acabou apenas ocupando cargos burocráticos; Juraci Magalhães, no início, foi fiel a Getúlio, mas não aceitou o Golpe de Estado de 1937, quando deixou o governo da Bahia e voltou aos quartéis; Carlos de Lima Cavalcanti, líder da revolução de 1930 em Pernambuco, foi deposto do cargo de governador pelo golpe do Estado Novo, em 1937, por ter apoiado, no mesmo ano, a tentativa de reeleição de Antônio Carlos para presidente da Câmara dos Deputados.
Os mais fiéis e influentes militares, durante os 15 anos de Getúlio no poder, foram o general Pedro Aurélio de Góis Monteiro, e, em seguida, o general Eurico Dutra, ministro da Guerra de 1936 a 1945, o capitão Filinto Müller, por vários anos, fiel chefe de Polícia do Rio de Janeiro (1933-1942), e o coronel João Alberto Lins de Barros.

Segue a Parte 3.

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