Homenagem ao lendário herói ancestral dos ingleses que deu título a um dos considerados "Cem Maiores Livros do Mundo" e tido como o mais antigo escrito em "Old English".

quarta-feira, 25 de março de 2015

AS TRÊS PRIMEIRAS GRANDES CIVILIZAÇÕES MUNDIAIS: EGITO (PARTE 03)

III.5 - REINO MÉDIO (2055 – 1650 AC)


O Reino Médio do Egito, também conhecido como o Período da Reunificação, é o período da história do Antigo Egito entre 2000 e 1700 AC. Englobou parte da Décima Primeira Dinastia (primeira fase), que governou com sede em Tebas, e toda a Décima Segunda Dinastia (segundo fase), quando o governo esteve centrado em El-Lisht, período em que Osiris tornou-se a mais importante deidade da religião popular.
Mentuhotep II, unificador do Egito
Os faraós do Reino Médio recuperaram a prosperidade e estabilidade do país, estimulando uma ressurgência da arte, literatura e monumentais projetos de construção. Mentuhotep II e seus sucessores da Décima Primeira Dinastia governaram de Tebas, nome grego da cidade do Egito antigo (Waset), localizada a 800 km ao sul do Mediterrâneo, margem ocidental do Nilo, hoje na moderna cidade de Luxor. Com tais providências, a população, artes e religião da nação floresceram. Em contraste com as elitistas atitudes do Reino Antigo, em relação aos deuses, o Reino Médio experimentou um crescimento nas expressões de piedade pessoal e numa espécie de democratização da “vida após a morte”, em que todas as pessoas possuíam uma alma e eram bem vindas à companhia dos deuses, após a morte. A literatura do Reino Médio apresentou temas e caracteres sofisticados escritos em estilo confiante e eloquente. As esculturas em relevo e de retrato, do período, capturavam detalhes sutis e individuais que alcançavam novos níveis de perfeição técnica.
Localização de Tebas
Mentuhotep II comandou campanhas militares ao sul, até a Segunda Catarata, na Núbia, que havia ganho sua independência durante o Primeiro Período Intermediário. Também restaurou a hegemonia egípcia sobre a região do Sinai, que havia sido perdida pelo Egito desde o final do Reino Antigo. Para consolidar sua autoridade, ele restaurou o culto ao governante, se autodescrevendo como deus em vida, vestindo o ornato de cabeça dos deuses Amun e Min. Morreu após um reinado de 51 anos, passando o trono ao seu filho Mentuhotep III.
Mentuhotep III reinou por doze anos prosseguindo a consolidação do governo de Tebas sobre todo o Egito, construindo uma série de fortes no Delta oriental para proteger o Egito contra ameaças da Ásia. Enviou a primeira expedição a Punt utilizando navios especialmente construídos para esse fim, pelo Mar Vermelho. Mentuhotep III foi substituído por Mentuhotep IV cujo nome é omitido das listas antigas de reis egípcios, já que papiros antigos declaram que após Mentuhotep III “vieram sete anos sem reis”. A despeito dessa ausência, seu reino é atestado por algumas inscrições no wadi Hammamat[1], que registra expedições à costa do Mar Vermelho e a jazidas de pedras para os monumentos reais, cujo líder era o vizir Amenemhat, futuro faraó Amenemhet I, primeiro rei da 12th Dinastia.
A ausência de Mentuhotep IV da lista de reis criou a teoria de que Amenemhet I usurpou o seu trono. Embora não hajam relatos contemporâneos dessa desavença, alguma evidência circunstancial aponta para a existência de uma guerra civil ao final da 11th Dinastia, entre dois reivindicantes ao trono. O que é certo é que, tendo galgado o poder, Amenemhet I não era de nascimento real.
Ao assumir o reino no início da Décima Segunda Dinastia, cerca de 1985 AC, Amenemhet I mudou a capital para a cidade de Itjtawy (Dominador das Duas Terras), próxima de Memphis e el-Lisht, imediatamente ao sul do vértice do delta do Nilo. De Itjtawy, os faraós da Décima Segunda Dinastia empreenderam um previdente projeto de recuperação de terras e esquema de irrigação para aumentar os resultados agrícolas da região. A partir dessa dinastia, os reis mantiveram exércitos permanentes bem treinados que incluíam contingentes núbios, com os quais reconquistaram territórios na Núbia, ricos em jazidas e minas de ouro, enquanto operários construíam uma estrutura defensiva no delta oriental, chamada “Muralhas do Governante”, contra ataques estrangeiros. Contudo, o Reino Médio foi basicamente defensivo em sua estratégia militar, com fortificações construídas na Primeira Catarata do Nilo, na região do Delta e no istmo do Sinai.
Para reforçar sua posição, Amenemhet exigiu registro das terras, modificou os limites das nomes, indicou nomarcas diretamente, mas aquiesceu com o sistema, para aplacar os representantes que apoiavam o seu governo, imprimindo ao Reino Médio o caráter de uma organização mais feudal do que o Egito havia tido antes ou teria posteriormente.
Em seu 20º ano de reinado, Amenemhat estabeleceu seu filho Senusret I como corregente, estabelecendo uma prática que seria usada repetidamente pelo resto do Reino Médio e durante o Reino Novo.
Com o provável assassinato de Amenemhet, em conspiração palaciana, em seu 30º ano de reinado, Senusret I assumiu o poder. Durante o seu reinado, os exércitos egípcios avançaram para o sul até a Segunda Catarata, na Núbia, construindo um forte de fronteira em Buhen e incorporando toda a baixa Núbia como uma colônia egípcia. Estendeu contatos comerciais na Palestina síria, até Ugarit. Em seu 43º ano de reinado, Senusret I indicou Amenemhet II como corregente e morreu três anos após.
O reino de Amenemhet II foi caracterizado como muito pacífico, mas seus registros diários lançam dúvidas sobre esta informação, muitas vezes falando em tratados de paz com certas cidades sírio-palestinas e conflitos com outras. Não parece que Amenemhet II tenha perseguido a política de seus antecedentes na nomeação de nomarcas, preferindo retornar à hereditariedade. Em seu 33º ano de reinado, ele indicou seu filho, Senusret II, como corregente.
Não existe evidência de atividades militares durante o reinado de Senusret II, mas ele parece ter focado em questões domésticas, particularmente a irrigação de Faiyum. Esse projeto visava a conversão do oásis numa produtiva faixa de terra cultivada. Acabou por construir sua pirâmide na localidade de el-Lahun, próximo da junção do Nilo com o principal canal de irrigação de Faiyum. Reinou somente por 15 anos, evidenciados pela natureza incompleta de muitas de suas construções. Sucedeu-o no trono, seu filho, Senusret III.
Senusret III era um rei guerreiro que muitas veze foi ao campo de batalha. Em seu sexto ano de reinado ele redragou um canal do Reino Antigo, próximo da Primeira Catarata, para facilitar a viagem para a Núbia superior. Usou esse canal para lançar uma série de brutais campanhas na Núbia no sexto, oitavo, décimo e décimo sexto anos de seu reinado. Após essas vitórias, Senusret construiu uma série de fortes maciços pelo país, para estabelecer o limite formal entre as conquistas egípcias e a Núbia não conquistada, em Semna, entre a Segunda e Terceira Cataratas. O pessoal desses fortes era encarregado de enviar relatórios frequentes, para a capital, sobre os movimentos e atividades dos nativos núbios locais, que não podiam navegar para o norte da fronteira nem penetrar por terra com seus rebanhos; mas podiam viajar para fortes locais para comerciar. Após isso, Senusret fez mais uma campanha, em seu 19º ano, mas foi obrigado a retornar devido aos níveis anormalmente baixos do Nilo, que punham em risco os seus navios. Um de seus soldados registrou também uma campanha na Palestina, provavelmente contra Shechem, única referência a uma campanha militar contra um local da Palestina, em toda a literatura do Reino Médio.
O poder dos nomarcas caiu substancial e definitivamente durante o seu reinado, embora não haja registro de que Senusret tenha tomado qualquer ação direta contra eles. A duração do seu reino permanece uma questão aberta. Seu filho Amenemhet III começou a reinar após o 19º ano de seu pai, o que tem sido considerado como a data máxima atestada; contudo uma referência ao ano 39º, num fragmento encontrado nas ruínas da construção do templo mortuário de Senusret, tem sugerido a possibilidade de uma longa corregência com seu filho.
O reinado de Amenemhet III, o último grande governante deste período, marcou o pico da prosperidade econômica do Reino Médio. Ele permitiu a entrada de colonos canaanitas de língua semita, do Oriente Próximo, para fornecer força de trabalhos para sua mineração ativa e campanhas de construção. Reforçou as defesas de seu pai na Núbia e prosseguiu com as obras de recuperação de terra de Faiyum. Após um reinado de 45 anos, Amenemhet III foi sucedido por Amenemhet IV, cujo reino foi pobremente documentado.
Busto de Sobekneferu, museu do Louvre
Claramente, nessa época o poder dinástico começou a enfraquecer, por várias razões, entre as quais as ambiciosas atividades de mineração e construção. Por outro lado, registros da época indicam que o fim do reinado de Amenemhet III foi seco e os fracassos das colheitas podem ter ajudado a desestabilizar a dinastia. Além disso, o reinado extraordinariamente longo de Amenemhet III deve ter criado problemas de sucessão. Esse argumento talvez explique porque Amenemhet IV foi sucedido por Sobekneferu, a primeira rainha do Egito historicamente comprovada, que reinou apenas por quatro anos.
Após a morte de Sobekneferu, sem herdeiros, o trono pode ter passado para Sekhemre Khutawy Sobekhotep, embora em estudos anteriores, Wegaf, que tinha anteriormente sido o Grande Supervisor das Tropas, possa ter reinado em seguida. Começando com este reino, o Egito foi governado por uma série de reis efêmeros por cerca de dez ou quinze anos. Fontes egípcias antigas consideram estes como os primeiros reis da 13ª Dinastia, embora o termo dinastia seja enganoso já que a maioria dos reis da 13ª Dinastia não era aparentada.
Localização de Avaris, no Delta do Nilo, Baixo Egito
Após o caos dinástico inicial, uma série de reis de reinados maiores e melhor comprovados, reinaram entre 50 a 80 anos. O mais forte rei deste período, Neferhotep I, governou por onze anos e manteve efetivo controle do Alto Egito, Núbia e o Delta, com as pequenas possíveis exceções de Xois e Avaris (duas cidades antigas do Delta). Neferhotep I foi reconhecido até como o suserano do governador de Byblos (Delta Ocidental), indicando que a 13ª Dinastia conseguiu reter muito do poder da 12ª Dinastia, pelo menos até esse reinado. Em algum ponto da 13ª Dinastia, Xois e Avaris se tornaram independentes; os governantes de Xois constituíram a 14ª Dinastia e os governantes asiáticos de Avaris constituíram os Hicsos da 15ª Dinastia. Essa última revolta ocorreu durante o reinado do sucessor de Neferhotep I, Sobekhotep IV, embora sem evidência arqueológica. Sobekhotep IV foi seguido pelo curto reinado de Sobekhotep V, que foi sucedido por Wahibre Ibiau que reinou por dez anos e então por Merneferre Ai que teve um reino de vinte e três anos, o mais longo da 13ª Dinastia; ambos parecem ter dominado pelo menos partes do Baixo Egito. Após Merneferre Ai, contudo, nenhum rei deixou seu nome em qualquer objeto fora do Sul. Este foi o início da porção final da 13ª Dinastia, quando os reis do Sul continuaram a reinar sobre o Alto Egito, mas quando a unidade do Egito se desintegrou totalmente, o Reino Médio deu lugar ao Segundo Período Intermediário.

III.6 – SEGUNDO PERÍODO INTERMEDIÁRIO (1650-1550 AC) E OS HICSOS

O segundo Período Intermediário marca o período em que o Antigo Egito caiu em desordem pela segunda vez, entre o final do Reino Médio e o início do Novo Reino, mais conhecido como o período em que os Hicsos surgiram no Egito e cujo reino compreendeu a 15ª Dinastia.
Retendo o assento da 12ª Dinastia, a 13ª Dinastia reinou de Itjtawy e tornou-se notável pela ascensão do primeiro rei semita formalmente reconhecido, Khendjer. A 13ª Dinastia provou ser incapaz de manter a integridade do Egito e uma família provincial reinante, de descendência canaanita, em Xois, abandonou a autoridade central para formar a 14ª Dinastia, como vimos acima.
A 15ª Dinastia do Egito data de aproximadamente 1650 a 1550 AC, foi a primeira dinastia dos Hicsos (em egípcio, governadores estrangeiros), reinou de Avaris – como mencionado anteriormente – e não conseguiu controlar todo o país. Os Hicsos preferiram permanecer no norte do Egito, uma vez que haviam invadido do nordeste; mantiveram os modelos de governo e se identificaram com os faraós, assim integrando elementos egípcios em sua cultura. Junto com outros invasores semitas, introduziram novos artefatos de guerra no Egito, notadamente o arco composto (arco tradicional feito de chifre, madeira e tendão laminados juntos, o chifre para o lado do arqueiro) e o carro puxado por cavalos. Os nomes e a ordem dos reis dessa dinastia é incerta. A Lista dos Reis de Turim[2] indica que foram seis reis Hicsos, com um obscuro Khamudi listado como o último rei da 15ª Dinastia. Os governantes conhecidos da 15ª Dinastia são os seguintes:

· Salitis
· Sakir-Har
· Khyan
· Apophis, cerca de 1590 AC-1550 AC
· Khamudi, cerca de 1550-1540 AC

A 16ª Dinastia governou a região tebana no Alto Egito por 70 anos, mas os dados existentes sobre ela e sobre o período são muito precários. Uma guerra contínua contra a 15ª Dinastia dominou esta 16ª Dinastia, de curta vida. Os exércitos da 15ª Dinastia, vencendo cidade a cidade dos seus inimigos do sul, continuamente ocuparam o seu território acabando por conquistar a própria Tebas. A fome, que havia fustigado o Alto Egito durante a 13ª e 14ª Dinastias, também prejudicou a 16ª Dinastia.
A Dinastia de Abydos pode ter sido uma curta dinastia local, que governou parte do Alto Egito, durante o Segundo Período Intermediário do Antigo Egito, contemporânea com a 15ª e 16ª Dinastias, aproximadamente de 1650 a 1600 AC. A existência de tal dinastia parece ter sido recentemente comprovada, quando a tumba do faraó Seneb Kay, até então desconhecido, foi descoberta em Abydos, e incluiria quatro governantes: Wepwawetemsaf, Pantjeny, Snaaib, e Seneb Kay. A necrópole real da Dinastia de Abydos foi descoberta na parte sul de Abydos, onde seus governantes colocaram o seu cemitério adjacente aos túmulos dos governantes do Reino Médio.
Múmia de Ahmose I, que expulsou os hicsos do Egito
Pelo tempo em que Memphis e Itjtawy caíram para os Hicsos, a casa reinante nativa egípcia, em Tebas, declarou sua independência tornando-se a 17ª Dinastia que, após anos de vassalagem, reuniu suficiente força para desafiar os hicsos num conflito de libertação que durou mais de 30 anos, até expulsar os Hicsos de volta à Ásia em 1555 AC. Antes disso, haviam mantido relações de comércio com o reino Hicso, sendo que Senakhtenre Ahmose, o primeiro rei da linha dos reis Ahmoside, importou calcário branco da região controlada pelos hicsos para fazer parte do Templo de Karnak. Seus sucessores, os dois últimos reis da 17ª Dinastia, Segenenre Tao II e Kamose conseguiram derrotar os núbios ao sul do Egito e os hicsos ao norte, durante as guerras de libertação. Ahmose I (também chamado de Amosis I), filho de Segenenre Tao II e irmão de Kamose, permanentemente erradicou a presença dos hicsos do Egito, fundando a nova 18ª Dinastia. Com a criação da 18ª Dinastia, o período do Novo Reino da história egípcia começa com Ahmose I, seu primeiro faraó.
No Novo Reino que se seguiu, novamente com o controle administrativo centralizado, o exército tornou-se uma prioridade central para os faraós que procuraram expandir as fronteiras do Egito, tentando ganhar o domínio do Oriente Próximo.

[1] Wadi Hammamat (Vale dos Muitos Banhos) é um leito fluvial seco no deserto oriental egípcio, a meio caminho entre Quena, no rio Nilo, e QAuseer, no Mar Vermelho. Era uma antiga região de mineração e rota de comércio a leste do vale do rio Nilo em tempos antigos; três mil anos de escultura e pintura em rocha a tornaram um importante local científico e turístico atualmente. 
[2] A Lista dos Reis de Turim, também conhecida como o Canon Real de Turim, é um papiro egípcio que data do reino do faraó Ramsés II, agora no Museu Egípcio, em Turim. O papiro é a mais extensa lista disponível de reis compilada pelos egípcios, sendo a base para a maioria da cronologia antes do reino de Ramsés II.

Continuação na próxima postagem: PARTE 04

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