Homenagem ao lendário herói ancestral dos ingleses que deu título a um dos considerados "Cem Maiores Livros do Mundo" e tido como o mais antigo escrito em "Old English".

sábado, 18 de maio de 2024

A CONTURBADA FRANÇA PÓS-REVOLUÇÃO (Parte 2)

c) Segunda Restauração (1815)

Talleyrand foi novamente influente na segunda restauração dos Bourbon assim como Joseph Fouché, ministro da polícia de Napoleão durante os Cem Dias. Essa segunda restauração viu o início do “Segundo Terror Branco”, principalmente no sul, quando grupos não oficiais, apoiando a monarquia, buscaram revanche contra os que haviam ajudado o retorno de Napoleão, causando a morte de 200 a 300 pessoas e pondo milhares em fuga. Cerca de 70.000 funcionários do governo foram demitidos. Após um período durante o qual as autoridades locais assistiram à violência sem esperança, o Rei e seus ministros enviaram oficiais para restaurar a ordem.
Um novo “Tratado de Paris” foi assinado em novembro de 1815, com mais termos punitivos do que o tratado de 1814. A França foi obrigada a pagar 700 milhões de francos de indenizações e as fronteiras do país foram reduzidas ao seu estado de 1790 ao invés de 1792 como no tratado anterior. Até 1818 a França foi ocupada por 1,2 milhões de soldados estrangeiros que incluíram 200.000 soldados comandados pelo Duke de Wellington, com todas os custos de acomodação e alimentação pagos pela França. Com todas essas despesas, o prometido corte de impostos não foi cumprido, com tudo isso criando a Louis XVIII uma formidável oposição.
Inicialmente, os principais ministros de Louis, como Talleyrand, Duque de Richelieu (descendente do famoso Cardeal de Richelieu, ministro de Louis XIII, século XVII) e Élie, duque de Decazes, foram moderados, com o próprio Rei seguindo uma política cautelosa. A primeira Câmara de Deputados eleita em 1815 na Segunda Restauração Bourbon, cunhada pelo Rei “Câmara Oculta”, pela impossibilidade de cooperação entre as partes, foi dominada por uma maioria ultrarrealista que se recusava a reconhecer a Revolução Francesa e logo ganhou a reputação de ser “mais realista que o próprio rei”. A legislatura demitiu o governo Talleyrand-Fouché e procurou legitimar o “Terror Branco”, julgando inimigos do Estado, demitindo entre 50 e 80 mil funcionários públicos e dispensando 15.000 militares do exército. Richelieu, um emigrado de outubro de 1789, sem nada a ver com a nova França, foi nomeado Primeiro Ministro. A Câmara continuou a manter agressivamente o lugar da monarquia e da Igreja, sempre chamando por mais comemorações para figuras históricas reais. Decazes, talvez o ministro mais moderado, movimentou-se para sustar a politização da Guarda Nacional (criada durante a Revolução Francesa), proibindo demonstrações políticas pela milícia em julho de 1816.
Devido às tensões entre o governo do Rei e a ultrarrealista Câmara dos Deputados, esta começou a reivindicar direitos extraordinários. Após tentar obstruir o orçamento de 1816, o governo concedeu à Câmara o direito de aprovar as despesas do Estado; contudo, não conseguiu do Rei a garantia de que seus gabinetes representariam a maioria no Parlamento.
Em setembro de 1816 a Câmara foi dissolvida por Louis e manipulações eleitorais resultaram numa Câmara mais liberal em 1816. Richelieu serviu até 29 de dezembro de 1818, seguido por Jean-Joseph, Marquês Dessolles, até 19 de novembro de 1919 e então por Decazes (em realidade o ministro dominante de 1818 a 1820) até 20 de fevereiro de 1820. Esta foi a era em que os Doutrinários (grupo de centro-esquerda) dominaram a política, esperando conciliar a monarquia com a Revolução Francesa e o poder com a liberdade. No ano seguinte o governo alterou as leis eleitorais recorrendo a manipulações eleitorais dos limites distritais eleitorais, alterando o direito a voto para permitir que alguns homens ricos do comércio e indústria tivessem direito a voto e assim evitando que os ultrarrealistas vencessem a maioria nas eleições futuras. A censura da imprensa foi relaxada, algumas posições na hierarquia militar foram abertas à competição e escolas comuns foram estabelecidas para invadir o monopólio católico da educação primária pública. Decazes expurgou um bom número de prefeitos e sub-prefeitos ultrarrealistas e nas eleições que ocorriam, uma proporção incomumente alta de Bonapartistas e republicanos foi eleita.
Em 1820 os liberais da oposição – que junto com os ultrarrealistas haviam feito metade da Câmara – mostraram-se intratáveis e Decazes e o Rei buscaram a revisão das leis eleitorais para garantir uma maioria conservadora mais tratável. Em fevereiro de 1820 o assassinato do Duque de Berry, o ultrarreacionário filho do ultrarreacionário irmão e herdeiro presumido de Louis, o futuro Charles X, por um Bonapartista, precipitou a queda de Decazes do poder e o triunfo dos ultrarrealistas.
Richelieu retornou ao poder por um curto intervalo, de 1820 a 1821. A imprensa foi mais fortemente censurada, a prisão sem julgamento foi reintroduzida e os líderes doutrinários foram banidos da docência na Escola Normal Superior. Sob Richelieu, o direito de voto foi alterado para dar aos eleitores mais ricos um voto duplo, a tempo da eleição de novembro de 1820. Após uma vitória retumbante, um novo ministério Ultra foi formado, sob a liderança de Jean-Baptiste de Villèle, que serviu por seis anos, em condições favoráveis. A esposa de Berry, a Duquesa de Berry, deu à luz um “bebê milagroso”, Henry, sete meses após a morte do Duque; Napoleão morreu em Santa Helena em 1821 e seu filho, Duque de Reichstadt, permaneceu internado em mãos austríacas. Figuras literárias, como François-René de Chateaubriand, Victor-Marie Hugo, Alphonse de Lamartine, Alfred Victor, Comte de Vigny e Jean Charles Emmanuel Nodier, juntaram-se à causa dos ultrarrealistas; Hugo e Lamartine tornaram-se republicanos mais tarde e Nodier o fora inicialmente. Logo Villèle provou ser tão cauteloso quanto seu mestre e, até o final da vida de Louis, políticas abertamente reacionárias foram mantidas num mínimo. 
François-René Chateaubriand, o escritor romântico
que teve assento à Câmara dos Pares
Os Ultras ampliaram seu apoio colocando um ponto final numa crescente dissidência militar em 1823, com intervenção na Espanha em favor do rei Bourbon espanhol Ferdinand VII e contra o Governo espanhol liberal que fomentava o fervor popular patriótico. Embora o apoio militar britânico, a intervenção foi largamente vista como uma tentativa de recuperar a influência na Espanha, que havia sido perdida para os britânicos durante o governo de Napoleão. O exército expedicionário francês, chamado “Centena de Milhar de Filhos de São Louis”, foi conduzido pelo duque d’Angoulême, filho do conde d’Artois. As tropas francesas marcharam para Madri e então para Cádiz, desalojando os Liberais com pouca luta (abril a setembro de 1823), permanecendo na Espanha por cinco anos. O apoio aos Ultras entre os votantes ricos foi ainda reforçado pela doação de favores de forma similar à Câmara de 1816 e temores sobre os Carbonários[1]. Na eleição de 1824, outra grande maioria foi assegurada.
Louis XVIII morreu em 16 de setembro de1824, sendo substituído por seu irmão, o Conde d’Artois, que tomou o nome de Charles X.

II.6 – CHARLES X

a) 1824 – 1830: Período Conservador
Charles X, rei da França de setembro de
1824 a agosto de1830, irmão mais novo
dos reis Louis XVI e Louis XVIII

A ascensão ao trono de Charles X, o líder da facção ultrarrealista, coincidiu com o controle do poder pelos Ultra na Câmara dos Deputados, dando prosseguimento ao ministério do Conde de Villèle e sendo removido o controle que Louis havia exercido.
Como o país experimentou um reflorescimento cristão nos anos pós revolucionários, os Ultras trabalharam para elevar, uma vez mais, o status da Igreja Católica Romana. A Concordata de 11 de junho de 1817, entre o Estado e a Igreja, foi estabelecida para substituir a Concordata de 1801, mas embora assinada nunca foi validada. O governo de Villèle, sob pressão dos Cavaleiros da Fé, incluindo vários deputados, votou a favor do Ato Antissacrílego de janeiro de 1825, que punia com pena de morte o ladrão de hóstias consagradas. A lei não foi obrigatória e somente aprovada para finalidades simbólicas, embora a aprovação do ato tenha provocado um tumulto considerável, particularmente entre Doutrinários. Muito mais controversa foi a introdução dos Jesuítas, que estabeleceram uma rede de faculdades para a juventude da elite, fora do sistema universitário oficial. Os Jesuítas foram notados por sua lealdade ao Papa e deram muito menos apoio às tradições Galicanas, a crença de que a autoridade civil pública – muitas vezes representada pela autoridade do Rei ou do Estado – sobre a Igreja Católica, é comparável à autoridade do Papa). Dentro e fora da Igreja eles tinham inimigos e o Rei encerrou seu papel institucional em 1828.
Uma nova legislação, preparada por Louis, mas que teve em Charles importante figura para a sua aprovação, pagou uma indenização a realistas cujas terras haviam sido confiscadas durante a Revolução. Um projeto de lei para financiar essa compensação, pela conversão do débito governamental para bônus de 5% para 3%, proporcionando uma economia ao Estado de 30 milhões de francos em pagamento de juros, foi também encaminhado às câmaras. O governo de Villèle ponderou que os emprestadores haviam tido retornos majorados desproporcionais se comparados ao investimento inicial e que a redistribuição era justa. A lei final alocou fundos do Estado de 988 milhões de francos para compensação, financiados por bônus governamentais a um valor de 600 milhões de francos a juros de 3%, com cerca de 18 milhões de francos pagos por ano. Os beneficiários inesperados da lei foram cerca de um milhão de proprietários das antigas terras confiscadas, cujos direitos de propriedade foram então confirmados pela nova lei, conduzindo a uma forte subida em seu valor.
Em 1826, Villèle introduziu um projeto de lei para restabelecimento da primogenitura (direito, por lei ou costume, do filho primogênito legítimo herdar a principal ou todas as propriedades dos pais), ao menos para proprietários de grandes propriedades, a menos que decidissem contrariamente. Os liberais e a imprensa, bem como alguns dissidentes Ultra, caso de Chateaubriand, se rebelaram. Sua crítica violenta impeliu o governo a introduzir um projeto de lei para restringir a liberdade de imprensa, em dezembro, embora não houvesse praticamente qualquer censura em 1824. Tal foi a reação da oposição que a proposta foi retirada.
O gabinete de Villèle enfrentou crescente pressão da imprensa liberal em 1827, incluindo o “Jornal dos Debates” que patrocinava os artigos de Chateaubriand. O mais proeminente dos Ultra contra Villèle havia combinado com outros oponentes da censura de imprensa (uma nova lei a tinha reimposto em 24 de julho de 1827) formar uma “Sociedade dos Amigos da Liberdade da Imprensa. Outra sociedade influente foi a “Sociedade Ajuda-te que o Céu te Ajudará”, que trabalhou aos confins da legislação interditando encontros sem autorização de mais de 20 membros. O grupo, reforçado pela crescente maré da oposição, era de uma composição mais liberal e incluía membros mais importantes. Panfletos eram divulgados que burlavam as leis da censura e grupo forneceu assistência organizacional a candidatos liberais contra funcionários do estado pró-governo na eleição de novembro de 1827.
Em abril de 1827, o Rei e Villèle foram confrontados por uma Guarda Nacional (força militar e polícia reserva francesa fundada na Revolução em 1789) fora da lei. A guarnição, que Charles inspecionou, com ordens para expressar deferência ao Rei mas de desaprovação ao seu governo, gritava observações antijesuítas aviltantes à sua devota católica sobrinha e nora, Marie Thérèse, Madame a Delfina. Villèle sofreu pior tratamento quando funcionários liberais conduziram tropas para protestar ao seu escritório. Como resposta, a Guarda foi dispersada. Os panfletos continuaram a proliferar e incluíam acusações, em setembro, de que Charles, numa viagem a Saint-Omer, em conluio com o Papa planejava reinstalar o “dízimo” e tinha suspendido a Carta Constitucional sob a proteção de uma guarnição leal do exército. 
Victor Hugo, imortal autor de “Os Miseráveis”,
de Ultrarrealista da Restauração a Republicano
À época da eleição, os realistas moderados (constitucionalistas) começavam também a se virar contra Charles, em parte devido a uma crise financeira em 1825 cuja culpa atribuíam à lei governamental da indenização. Victor Hugo e bom número de outros escritores, descontentes com a realidade da vida sob Charles X, também começaram a criticar o regime. Na preparação para o encerramento de 30 de setembro para as eleições, os comitês de oposição trabalharam furiosamente para conseguir tantos eleitores quantos pudessem, contrariamente às ações dos prefeitos que começaram a remover certos eleitores que não tinham conseguido documentos atualizados desde a eleição de 1824. 18.000 eleitores foram adicionados aos 60.000 da primeira lista; embora os esforços dos prefeitos para registrar os eleitores que conseguiram o direito de voto e eram apoiadores do governo, não conseguiram, fato atribuído à atividade da oposição. A organização foi principalmente dividida entre “Os Amigos de Chateaubriand” e os “Ajuda-te”, que apoiavam os liberais, os constitucionais e a contra oposição (monarquistas constitucionais).
A nova Câmara não resultou numa clara maioria para qualquer lado. O sucessor de Villèle, visconde de Martignac, que começou seu termo em janeiro de 1828, tentou pilotar um curso moderado, acalmando liberais pelo afrouxamento dos controles da imprensa, expulsando jesuítas, modificando o registro eleitoral e restringindo a formação de escolas católicas. Charles descontente com o novo governo, cercou-se de homens dos “Cavaleiros da Fé” e outros Ultra’s conhecidos. Martignac foi deposto quando seu governo foi derrotado numa questão sobre governo local. O Rei Charles e seus conselheiros acreditavam que um novo governo pudesse ser formado com o apoio de Villèle, Chateaubriand e facções monarquistas de Decazes, mas escolheu Polignac para primeiro-ministro, em novembro de 1829, que era repelido pelos liberais e, ainda pior, por Chateaubriand. Embora Charles permanecesse indiferente, o impasse conduziu alguns realistas a clamar por um golpe e proeminentes liberais, por uma greve de impostos.
Na abertura da sessão em março de 1830, o Rei fez um discurso que continha ameaças veladas à oposição; em resposta, 221 deputados (uma maioria absoluta) condenaram o governo e Charles, subsequentemente, suspendeu e então dissolveu o Parlamento. Charles mantinha a crença de que era popular entre a massa não votante e ele e Polignac decidiram persistir numa ambiciosa política externa de colonialismo e expansionismo, com a assistência da Rússia. A França tinha intervindo várias vezes no Mediterrâneo após a resignação de Villèle e expedições eram agora enviadas à Grécia e Madagascar. Polignac iniciou também a conquista francesa da Argélia; a vitória foi anunciada ao Dey (nome dado aos governantes da Argélia, Túnis e Trípoli) de Algiers no início de julho. Planos haviam sido elaborados para a invasão da Bélgica logo após sua própria revolução. Contudo, a política externa provou-se ineficiente para desviar a atenção dos problemas domésticos.
A dissolução da Câmara dos Deputados por Charles, seus decretos de julho, que estabeleceram um rígido controle da imprensa e sua restrição dos eleitores, resultaram na “Revolução de Julho de 1830”. A maior causa da queda do regime, contudo, foi que enquanto ele gerenciava a manutenção do apoio da aristocracia, da Igreja Católica e muito do campesinato, a causa dos Ultras era profundamente impopular fora do parlamento e com aqueles que não possuíam o direito do voto, especialmente os trabalhadores industriais e a burguesia. A maior razão foi uma subida abrupta nos preços dos alimentos, causada por uma série de más colheitas entre 1827 e 1830. Trabalhadores vivendo com o salário-mínimo eram muito pressionados e furiosos com o governo que não dava a menor atenção às suas necessidades urgentes.
Charles abdicou em favor do seu neto, o Conde de Chambord e partiu para a Inglaterra. Contudo, a Câmara dos Deputados, liberal e controlada pelos burgueses, recusou-se a confirmar o Conde de Chambord como Henry V. Numa votação muito boicotada por deputados conservadores, o corpo declarou vago o trono francês, elevando ao poder Louis-Phillipe, Duque de Orléans.

b) 1827 – 1830: Tensões

Há ainda um debate considerável entre os historiadores com relação à real causa da queda de Charles X. Contudo, é geralmente admitido que entre 1820 e 1830, uma série de declínios econômicos, combinados com a ascensão de uma oposição liberal na Câmara dos Deputados, finalmente derrubou os Bourbon conservadores.
Entre 1827 e 1830 a França enfrentou um declínio econômico, industrial e agrícola possivelmente pior do que aquele que havia disparado a Revolução. Uma série de colheitas de grãos progressivamente piores ao final do anos 1820, empurrou para cima os preços em vários alimentos de subsistência e produtos comercializados. Como resposta, o campesinato rural de toda a França uniu-se para tentar o relaxamento das tarifas de proteção dos grãos para baixar os preços e facilitar sua situação econômica. Contudo, Charles X, curvando-se à pressão dos proprietários mais ricos, manteve as tarifas no lugar. Assim agiu baseado na resposta Bourbon ao “Ano Sem Verão” (nome pelo qual ficou conhecido o ano de 1816 pelas baixas temperaturas de verão sem precedentes) em 1816, durante o qual Louis XVIII relaxou as tarifas durante uma série de crises de escassez, causou um declínio dos preços e incorreu na ira de proprietários poderosos, fonte tradicional da legitimidade Bourbon. Com isso, entre 1827 e 1830, os camponeses de toda a França enfrentaram um período de relativa penúria econômica e preços em ascensão.
Ao mesmo tempo, pressões internacionais combinadas com um enfraquecido poder de compra nas províncias, conduziram a uma reduzida atividade econômica nos centros urbanos. Este declínio industrial contribuiu a uma ascensão nos níveis de pobreza entre artesãos parisienses. Assim, por 1830, praticamente todos haviam sofrido pelas políticas econômicas de Charles X.
Enquanto a economia francesa falseava, uma série de eleições trouxe um bloco liberal relativamente poderoso à Câmara de Deputados. O bloco liberal, com 17 membros em 1824, cresceu para 180 em 1827 e para 274 membros em 1830. Essa maioria liberal cresceu cada vez mais insatisfeita com as políticas do centrista Martignac e o ultrarrealista Polignac, que procuravam proteger as já limitadas proteções da Carta de 1814. Esses liberais buscaram a expansão do direito de voto e políticas econômicas mais liberais e exigiram o direito, como bloco majoritário, de indicar o Primeiro Ministro e o Gabinete. O crescimento do bloco liberal dentro da Câmara correspondeu, grosseiramente, à ascensão da imprensa liberal dentro da França. Geralmente centrada em Paris, essa imprensa proporcionava um contraponto aos serviços jornalísticos do governo e aos jornais da direita. Ela tornou-se cada vez mais importante na propagação das opiniões políticas e da situação política ao público parisiense, sendo vista como uma ligação crucial entre a ascensão dos liberais e as massas francesas crescentemente agitadas e economicamente sofredoras.
Por 1830, o governo da Restauração de Charles X encontrou dificuldades de todos os lados. A nova maioria liberal não tinha, claramente, qualquer intenção de mover-se em face das políticas agressivas de Polignac. O crescimento da imprensa liberal em Paris que excedia o jornal oficial do governo, indicava um deslocamento geral na política parisiense para a esquerda, quando a base do poder de Charles era certamente para a direita do espectro político, como eram suas próprias visões. Ele simplesmente não podia ceder às exigências crescentes da Câmara dos Deputados e a situação rapidamente chegaria à crise.

c) 1830: A Revolução de Julho

A Carta de 1814 havia feito da França uma monarquia constitucional. Embora o rei mantivesse poder extensivo para realizar as novas políticas, bem como fosse o único poder executivo, era dependente do Parlamento para aceitar e passar seus decretos legais. A Carta também fixava o método de eleição dos Deputados, seus direitos dentro da Câmara dos Deputados e os direitos do bloco majoritário. Assim, em 1830, Charles X enfrentou um problema importante: ele não podia ultrapassar seus limites constitucionais além de não poder perseguir suas políticas com uma maioria liberal dentro da Câmara dos Deputados. Ele estava pronto para uma ação severa e fez seu movimento após um voto de não-confiança final pela maioria liberal em março de 1830: alterar a Carta de 1814 por Decreto. Esses decretos, conhecidos como “Os Quatro Decretos”, dissolviam a Câmara dos Deputados, suspendiam a liberdade de imprensa, excluíam a classe média mais liberal das futuras eleições e convocava novas eleições. 
Adolphe Thiers, estadista e historiador francês, 
figura-chave na Revolução de Julho de 1830
Em 1º de julho de 1830, antes que o rei tivesse feito suas declarações, um grupo de proprietários de jornais e jornalistas liberais ricos, liderados por Adolphe Thiers, se encontraram em Paris para decidir sobre uma estratégia para conter Charles X. E foi decidido então, três semanas antes da Revolução, que no evento das esperadas proclamações do rei, o estabelecimento jornalístico de Paris publicaria cáusticas críticas às políticas do rei, como tentativa de mobilizar as massas. Assim, quando Charles X fez as suas declarações em 25 de julho, a máquina do jornalismo liberal mobilizou-se, publicando artigos e queixas, publicamente censurando o despotismo das ações reais.
A plebe parisiense também se mobilizou guiada pelo fervor patriótico e pela penúria econômica, montando barricadas e atacando a infraestrutura do rei. Em poucos dias a situação escalou além das habilidades de controle da monarquia. Enquanto a Coroa movimentava-se para fechar os periódicos liberais, as massas radicais parisienses defendiam aquelas publicações e atacavam a imprensa pró-Bourbon, paralisando o aparato coercitivo da monarquia. Aproveitando a oportunidade, os liberais do Parlamento começaram a minutar resoluções, denúncias e censuras contra o Rei, que finalmente abdicou em 30 de julho de 1830, último monarca da Casa dos Bourbon. Vinte minutos mais tarde, seu filho, Louis Antoine, Duque de Angoulême, que o tinha nominalmente sucedido como Louis XIX, também abdicou, partindo ambos para a Inglaterra. A Coroa recairia então nominalmente sobre o filho do irmão mais jovem de Louis Antoine, neto de Charles X, em linha para tornar-se Henry V; contudo, a recém-empossada Câmara dos Deputados declarou o trono vago e, em 9 de agosto, elevou Louis Philippe ao trono, uma monarquia constitucional. Começava assim a Monarquia de Julho.


[1] Os Carbonários eram uma rede informal de sociedades secretas revolucionárias ativa na Itália de 1800 a 1831 que influenciaram outros grupos revolucionários na França, Portugal, Espanha, Brasil, Uruguai e Rússia. Embora seus objetivos muitas vezes tivessem uma base patriótica e liberal, faltava-lhes uma agenda política imediata. Tiveram um importante papel na unificação da Itália, lutando contra a tirania e no estabelecimento de um governo constitucional.

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