Homenagem ao lendário herói ancestral dos ingleses que deu título a um dos considerados "Cem Maiores Livros do Mundo" e tido como o mais antigo escrito em "Old English".

sexta-feira, 30 de setembro de 2011

MIKHAIL BAKUNIN E O ANARQUISMO (Parte 4)

IV - OBSERVAÇÕES E CRÍTICAS AO PENSAMENTO DE BAKUNIN

Bakunin defendia a ideia de que Deus implica na abdicação da razão humana e justiça, considerada a mais decisiva negação da liberdade humana, que culmina com a escravidão da humanidade, na teoria e na prática. E ia ao ponto de inverter o famoso aforismo de Voltaire de que se Deus não existisse, seria necessário inventá-lo, afirmando: "Se Deus realmente existisse, seria necessário aboli-lo."
A disputa entre Mikhail Bakunin e Karl Marx realçou as diferenças entre o anarquismo e o marxismo. Os argumentos de Bakunin, de que nem todas as revoluções precisam ser, necessariamente, violentas, se contrapunham aos ideais defendidos por um número considerável de marxistas. Ele também rejeitou fortemente o conceito marxista de "ditadura do proletariado", que os seguidores de Marx, na atualidade, traduzem em termos modernos por "democracia dos trabalhadores", mas que mantém o poder concentrado no estado até a futura transição ao comunismo, se ela um dia acontecer. Bakunin, que havia abandonado os ideais de uma ditadura revolucionária, insistia que revoluções deveriam ser lideradas pelo povo, diretamente, enquanto que qualquer elite iluminada só deveria exercer influência discreta, sem jamais impor-se, na forma de uma ditadura, a outrem, nem tampouco aproveitar-se de quaisquer direitos oficiais, em termos de benefício. Bakunin defendia a abolição imediata do estado, pois todas as formas de governo levariam, eventualmente, à opressão. Quanto a isso, são palavras de Bakunin, em seu trabalho “Estadismo e Anarquismo”:

“Os marxistas defendem que nada além de uma ditadura - a ditadura deles, é claro - pode criar o desejo das pessoas, enquanto nossa resposta para isso é: nenhuma ditadura pode ter qualquer outro objetivo além de sua autoperpetuação; ela pode apenas levar à escravidão o povo que tolerá-la; a liberdade só pode ser criada através da liberdade, isto é, por uma rebelião universal por pessoas e organizações livres, das multidões de trabalhadores, de baixo para cima.”

Em sua concepção de revolução social, os trabalhadores do campo e da cidade se organizariam em uma base federalista, criando as ideias e os fatos do próprio futuro. Os sindicatos e organizações operárias poderiam tomar posse das ferramentas de produção, bem como dos prédios e recursos. Segundo Bakunin, os camponeses ocupariam a terra, colocando para fora os senhores da terra, que vivem do esforço de outros. Em sua perspectiva, as multidões, as massas de pessoas pobres e exploradas, seriam capazes de inaugurar e levar ao triunfo a Revolução Social, uma vez que estes eram os setores sociais ainda pouco corrompidos pela civilização burguesa.
No âmbito do movimento, Bakunin foi posteriormente criticado pela concepção de revolução violenta que defendia. Alguns de seus críticos afirmam sua defesa da conspiração revolucionária e aprovação da ação direta violenta contra agentes do aparato repressor estatal e a atentados individuais (o que mais tarde, de uma perspectiva legalista, viria a ser chamado de terrorismo), o que serviu como justificativa para a repressão empreendida pelas autoridades constituídas contra os anarquistas. Também com base nesses atos de violência, a oposição, ao final do século XIX, justamente difundiria a ideia de anarquia como sinônimo de caos, desordem e assassinato sem sentido.
Ainda no século XIX, outro grande pensador libertário russo, Piotr Kropotkin apresentou importantes críticas às ideias de Bakunin. Frente à ideia de Bakunin de que a revolução deve acontecer necessariamente de maneira violenta e espontânea, ele escreveu em 1891: "Um edifício baseado em alguns anos de história não se destrói com alguns quilos de explosivo". Em contraposição à revolução violenta, Kropotkin aponta, muito acertadamente, para o papel fundamental que poderia exercer a educação na transformação de uma sociedade. "Nenhuma revolução social pode triunfar se não for precedida de uma revolução nas mentes e nos corações do povo". Estas ideias influenciariam os movimentos de educação libertárias do final do século XIX início do XX entre eles o movimento de Escolas Modernas idealizado pelo pedagogo catalão Francisco Ferrer.
Em 1898 Kropotkin propôs a fundação de um Comitê Pró Ensino, do qual fizeram parte o anarquista cristão Leon Tolstoi, Jean Grave, Charles Malato e os irmãos Réclus, dentre outros grandes pensadores do movimento anarquista da época. Neste contexto, a ideia de revolução pela violência, de Bakunin, foi deixada de lado em prol da transformação através da educação libertária.
Bakunin foi também acusado de ser um autoritário enrustido. Em sua carta para Albert Richard, ele escreveu:

"Existe apenas um poder e uma ditadura que, enquanto organização, é salutar e plausível: é a ditadura coletiva e invisível, daqueles que estão aliados em nome de nosso princípio."
Entretanto, defendido por seus apoiadores, essa "ditadura invisível" não seria uma ditadura no sentido convencional da palavra; esta seria uma linguagem figurativa a rebater as posições defendidas por Richard em ocasiões anteriores. O próprio Bakunin fora cuidadoso em explicitar que os membros desta ditadura não poderiam exercer nenhum poder político institucional, nem contar com quaisquer privilégios.
O historiador anarquista Max Nettlau descreveu o pan-eslavismo de Bakunin como sendo o resultado de uma psicose nacionalista, da qual poucos estavam livres. A publicação de suas "Confissões", de 1851, escritas enquanto Bakunin era prisioneiro do Czar na fortaleza de Pedro e Paulo, foram utilizadas para atacar Bakunin porque nelas ele pedia ao Imperador perdão por seus pecados e implorava a ele que se colocasse a frente dos eslavos como redentor e pai.
Seu eurocentrismo teve como manifestações um apelo seu pela constituição dos Estados Unidos da Europa, seu suporte ao colonialismo russo, em particular como defendido por seu parente e patrono o conde Nikolay Muravyov-Amursky e sua indiferença ao Japão e aos camponeses japoneses durante e depois de sua breve estadia em Yokohama, embora o Japão fosse considerado o país mais proeminente e revolucionário da Ásia durante a Restauração Meiji, de 1866 a 1869. Estes aspectos de seu pensamento, no entanto, datam de antes dele se tornar um anarquista.
Devido a algumas de suas colocações com relação ao judaísmo, Bakunin tem sido considerado um antissemita. Este posicionamento, que nada tem a ver com o anarquismo, tem sido bastante criticado pelos libertários das gerações seguintes, identificando esta característica como uma falha de caráter mais ou menos comum entre parte dos anarquistas e socialistas da Europa do século XIX, que incluíam Proudhon.
Durante algumas discussões com Karl Marx, Bakunin apresentou comentários antissemitas comuns entre os preconceitos europeus com relação aos judeus tratando-os como uma nação sem território. Sobre eles teria dito Bakunin:

“…uma seita de exploradores, um povo de sanguessugas, um único parasita devorador, estreita e intimamente ligado, não só através das fronteiras nacionais, mas também em todas as divergências de opinião política … (judeus) cuja paixão mercantil constitui um dos principais traços de seu caráter nacional.”

Na verdade, pode-se afirmar que Bakunin era contra toda e qualquer forma de autoridade imposta pela religião ou estado, conforme trecho de seu livro "Deus e o Estado". Seria, portanto, muito simplista ou equivocado afirmar que ele era somente contra o povo semita.

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