Homenagem ao lendário herói ancestral dos ingleses que deu título a um dos considerados "Cem Maiores Livros do Mundo" e tido como o mais antigo escrito em "Old English".

terça-feira, 10 de janeiro de 2012

OS BORGIA (Parte 3)

A segunda parte desta plotagem encerrou com a apreciação do legado do Papa Alexandre VI, entre os quais incluiremos o "Tratado de Tordesilhas, que iniciará essa terceira parte.

O TRATADO DE TORDESILHAS
 
O original Tratado de Tordesilhas
Um dos primeiros atos públicos do Papa Alexandre VI foi evitar a colisão entre Espanha e Portugal por suas terras recém descobertas, através do estabelecimento de uma linha de demarcação: o Meridiano de Tordesilhas. Dizem os bens intencionados, que constituindo um ato de real importância pacífica, e não de ambição ou usurpação. O Tratado de Tordesilhas, assinado em Tordesilhas, atualmente na Província de Valladolid, Espanha, em 7 de junho de 1494, dividiu as terras recém descobertas, fora da Europa, entre Espanha e Portugal, ao longo do Meridiano que passava a 370 léguas (aproximadamente 2.193 km) a oeste das ilhas Cabo Verde (fora da costa oeste da África). Esta ilha de demarcação ficava, aproximadamente, a meio caminho entre as Ilhas Cabo Verde (já portuguesas) e as ilhas recém descobertas por Cristóvão Colombo, em sua primeira viagem (reclamadas pela Espanha). As terras a leste da linha pertenceriam a Portugal e as terras a oeste, à Espanha. O Tratado foi ratificado pela Espanha (à época Coroas de Castilha e Aragão) em 2 de julho de 1494 e por Portugal em 5 de setembro do mesmo ano. O outro lado do mundo seria dividido poucas décadas após, pelo Tratado de Zaragoza, assinado em 22 de abril de 1529, que especificou o antemeridiano à linha de demarcação especificada no Tratado de Tordesilhas.
Os vários meridianos relacionados
Na verdade, a ação do Papa Alexandre VI teria sido a edição da Bula “Inter Coetera”, que fixava a linha a apenas 100 léguas das Ilhas Cabo Verde, sem mencionar Portugal ou suas terras. O Tratado de Tordesilhas resultou do esforço do rei português João II que, não satisfeito com a determinação do Papa, abriu negociações com os reis Ferdinando e Isabel de Espanha, visando mover a linha para oeste, permitindo-lhe reclamar novas terras a serem descobertas a leste da linha, sem consulta e contrariando a bula de Alexandre VI. O Tratado acabou não sendo estritamente cumprido, pois os espanhóis não resistiram à expansão dos portugueses no Brasil, através do meridiano. Ele foi ultrapassado pelo Tratado de Madri, de 1750, que garantiu a Portugal o controle das terras que ocupava na América do Sul, imediatamente repudiado pela Espanha. Outros tratados se seguiram para resolver, definitivamente, o impasse.
O papel do Papa nas negociações do Tratado, combinado com outras ações, provocou hostilidades contra o papado em toda a Europa e acabou ajudando a disparar o gatilho da Reforma Protestante do século XVI, em que a maioria dos estados do norte da Europa rompeu seus laços com a Igreja de Roma.

CORTESÃS E FAMÍLIA

Dentre as várias cortesãs do Papa Alexandre VI, aquela por quem sua paixão mais durou foi, sem dúvida, uma certa Vannozza (Giovanna) dei Cattanei, nascida em 1442 e esposa de três sucessivos maridos. A relação iniciou em 1470 e Vannozza lhe deu quatro filhos que ele abertamente reconheceu como seus: Giovanni, posteriormente duque de Gandia (nascido em 1474), Cesare (nascido em 1476), Lucrezia (nascida em 1480) e Goffredo ou Giuffre (nascido em 1481 ou 1482). Seus outros filhos, Girolama, Isabella e Pedro Luiz eram de origem incerta. Antes de sua elevação ao Papado, a paixão do Cardeal Borgia por Vannozza arrefeceu um tanto, o que a fez, subsequentemente, levar uma vida muito retirada. Seu lugar nas afeições do Papa foi preenchido pela bela Giulia Farnese, esposa de um dos Orsini, mas o seu amor por seus filhos de Vannozza permaneceu tão forte como nunca e provou ser, de fato, o fator determinante de toda a sua carreira. Ele distribuiu vastas somas de dinheiro a eles, bem como títulos de toda a honra. A atmosfera do ambiente do Papa Alexandre VI foi tipificada pelo fato de que sua filha Lucrezia viveu com sua cortesã Giulia, que ainda lhe deu mais uma filha, Laura, em 1492. Fontes bem intencionadas com relação ao Papa Alexandre VI, dizem que há evidências de que ele assumiu o Papado determinado a manter  seus filhos longe da Corte. Uma delas é que a sua filha Lucrezia teria sido prometida em casamento a um nobre espanhol; entretanto, tal casamento nunca se realizou. Possivelmente, o abandono dessas boas intenções podem ser creditadas aos maus conselhos de Ascanio Sforza, a quem Borgia havia premiado com a vice-chancelaria e que era, virtualmente, seu primeiro ministro.
De todos os seus filhos, sem qualquer dúvida, os que mais se distinguiram nos acontecimentos da nobreza da época, foram Cesare e Lucrezia e sobre eles escreveremos algumas linhas.

CESARE BORGIA
Cesare Borgia, filho do Papa Alexandre VI

Cesare Borgia nasceu em 13 de setembro de 1475 e morreu em 12 de março de 1507, antes de completar seus trinta e dois anos. Foi um condottiero(4)  italiano, nobre, político e cardeal.
Cesare foi, inicialmente, preparado para uma carreira na Igreja, tornando-se Bispo de Pamplona à idade de 15 anos. Após as escolas em Perugia e Pisa onde Cesare estudou leis, com a elevação de seu pai a Papa, foi feito Cardeal com a idade de 18 anos. Alexandre VI havia apostado as esperanças da família Borgia em seu irmão mais velho, Giovanni, feito capitão geral das forças militares do papado. Com o seu assassinato, em 1497, em misteriosas circunstâncias, vários contemporâneos sugeriram que Cesare poderia ter sido o seu assassino, por duas razões: o desaparecimento de Giovanni lhe abriria a tão esperada carreira militar e o livraria do concorrente aos amores de Sancha de Aragon, esposa do seu outro irmão Gioffre e sua amante e de Giovanni. Em agosto de 1498, Cesare tornou-se a primeira pessoa na história a renunciar ao Cardinalato, no mesmo dia em que o rei francês Luís XII o nomeava Duque de Valentinois título que, junto com a sua posição anterior de Cardeal de Valência, explicava o seu apelido de “Valentino”.
A primeiro de outubro de 1498, Cesare viaja a Roma para trazer ao Rei Luís XII um chapéu de Cardeal ao seu ministro, d’Amboise, e buscar uma esposa de alta estirpe para si próprio. Ele ainda aspirava à mão de Carlotta de Aragão e Nápoles, que residia na França, mas como aquela princesa persistia em sua recusa, ele conformou-se com a mão de uma sobrinha de Luis XII, a irmã do rei João III, de Navarra, Charlotte d’Albret. Em 10 de maio de 1499, Cesare casa-se com ela e tem uma filha, Louise Borgia, Duquesa de Valentinois, que casa-se, incialmente, com Louis II de la Tremouille, Governador de Burgundy e, posteriormente, com Philippe de Bourbon, Senhor de Busset. Cesare foi também pai de, pelo menos, onze filhos ilegítimos, entre eles, Girolamo Borgia, casado com Isabella Condessa de Capri e Lucrezia Borgia que, após a sua morte, mudou-se para Ferrara, à corte de sua famosa tia Lucrezia Borgia. 
A carreira de Cesar foi fundada na habilidade de seu pai em distribuir benesses e por força de sua aliança com a França (reforçada por seu casamento com Charlotte d’Albret), durante as "Guerras Italianas"(5). Durante a invasão da Itália pela França, em 1499, por Luis XII, Alexandre VI decidiu lucrar com a situação favorável, cavando para Cesare, um estado próprio ao norte da Itália, para isso depondo todos os seus vigários. Como os cidadãos os viam sempre como cruéis e mesquinhos, a tomada de poder por Cesare foi vista como progresso.
Cesare foi nomeado comandante dos exércitos papais com um grande número de mercenários italianos, apoiados por 300 cavaleiros e 4.000 infantes suíços enviados pelo rei da França e, violento e vingativo, tornou-se o mais poderoso homem de Roma, fazendo tremer, inclusive, seu próprio pai. Sua primeira vítima foi Caterina Sforza, monarca de Imola e Forli; após conquistar as duas cidades Cesare retornou a Roma para celebrar o triunfo e receber, de seu pai, o título de Gonfalonier Papal – posto militar e político dos Estados Papais. Giovanni Sforza, primeiro marido de Lucrezia, logo foi despejado de Pesaro; Pandolfo Malatesta perdeu Rimini; Faenza rendeu-se, seu jovem senhor Astorre III Manfredi tendo sido encontrado afogado no rio Tibre por ordem de Cesare.
Em julho de 1500, o Duque de Bisceglie, marido de Lucrezia, cuja existência não trazia mais qualquer vantagem aos Borgia, é assassinado por ordem de Cesare, praticamente na Presença de Alexandre VI, assim deixando sua irmã livre para outro casamento. O Papa, sempre em necessidades financeiras, criou 12 novos cardinais dos quais recebeu 120.000 ducados  e considerou novas conquistas para Cesare. Falou-se mesmo em uma nova Cruzada, mas o objetivo real seria a Itália Central; e, no outono, apoiado pela França e Veneza, movimentou-se com 10.000 homens para completar seu trabalho interrompido na Romagna. Os déspotas locais foram grosseiramente destituídos e uma administração foi estabelecida que, se tirânica e cruel, pelo menos foi forte e ordenada.
Em seu retorno a Roma, em junho de 1501, foi nomeado Duque da Romagna e, contratado por Florença, em seguida juntou o domínio de Piombino às suas novas terras. Enquanto seus condottieri iniciavam o cerco de Piombino, que encerrou em 1502, Cesare comandava as tropas francesas nos cercos de Nápoles e Capua, defendidas por Prospero e Fabrizio Colonna. Em junho de 1501suas tropas atacaram o último, causando o colapso do poder aragonês no sul da Itália. Em junho de 1502 ele lançou-se a Marche, onde conseguiu capturar Urbino e Camerino, usando de acordos e traições. O passo seguinte seria Bologna, mas seus condottiere, mormente Vitellozzo Vitelli e os irmãos Orsini, temendo a crueldade de Cesare, preparam uma trama contra ele. Seus oponentes foram derrotados, ele clamou por reconciliação, mas prendeu-os em Seningallia e, posteriormente, executou-os. O Cardeal Orsini, alma da conspiração, foi preso no Castelo Santo Ângelo e doze dias depois era um cadáver, sem que se possa provar se ele morreu de causas naturais ou se foi executado.

(4) O condottiero era um mercenário que controlava uma milícia, sobre a qual tinha comando ilimitado e estabelecia contratos com qualquer Estado interessado em seus serviços. O nome condottiero vem de condotta (termo derivado do latim conducere, "conduzir"), que era o contrato estabelecido com um determinado governo, de modo que essas milícias servissem como suas tropas mercenárias. Os condottieri surgiram em razão das rivalidades e constantes conflitos entre as cidades italianas. A partir da Idade Média até os séculos XIV e XV, eram frequentes os contratos com governos das cidades-estados, especialmente na Toscana, na Romagna, no Veneto e na Úmbria. Como muitas dessas cidades proibiam seus cidadãos de pegar em armas, a solução era recorrer a mercenários que, a despeito dos contratos firmados, não hesitavam em trocar de lado, se o inimigo oferecesse maior soldo. A maioria dos condottieri era italiana, mas não faltaram exemplos alemães, ingleses e de outros países europeus.
(5) As “Guerras Italianas” foram uma série de conflitos entre 1494 e 1559, envolvendo, em várias épocas, a maioria das cidades-estados da Itália, os Estados Papais, a maioria dos estados da Europa Ocidental (França, Espanha, o Santo Império Romano, Inglaterra e Escócia), bem como o Império Otomano. Originárias de uma disputa dinástica sobre o Ducado de Milão e o Reino de Nápoles, as Guerras rapidamente transformaram-se num conflito geral entre os vários participantes, marcado por um crescente grau de alianças regulares, contra-alianças e traições.
(6) O Ducado foi uma moeda de ouro utilizada no comércio até antes da Primeira Grande Guerra. É possível que a primeira emissão dessa moeda tenha ocorrido sob Rogério II da Sicília que, em 1140, cunhou ducados portando a figura de Cristo e a inscrição, em latim: “Deixai, oh Cristo, esse ducado que governas, ser-te dedicado”.

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