Homenagem ao lendário herói ancestral dos ingleses que deu título a um dos considerados "Cem Maiores Livros do Mundo" e tido como o mais antigo escrito em "Old English".

domingo, 3 de novembro de 2013

HISTÓRIA DOS REIS DA INGLATERRA A PARTIR DE 1066 (PARTE 4)

O REINADO DO KING JOHN (1199 – 1216)

O Rei John (Sem Terras)
Durante o seu reinado, a guerra com a França foi reiniciada, por conta do segundo casamento de John. Solicitado a mediar as famílias rivais de Lusignan e Angoulâme, ele acabou casando com a herdeira Isabella Angoulâme, que havia sido prometida a Hugh de Lusignan. Uma revolta eclodiu e John foi instado a comparecer perante seu senhor, Philip II da França; com sua negativa ao “convite”, a guerra foi declarada.
Para aumentar os seus problemas, a morte de Hubert Walter, arcebispo de Canterbury, em julho de 1205, iniciou uma disputa entre o rei e os monges de Canterbury, sobre quem deveria nomear o seu sucessor. O Papa interveio e decidiu contra John, provocando uma série de trocas que resultaram na excomunhão de John em 1209. Posteriormente ele declarou seu reino como feudo papal e foi readmitido aos favores do papado.
Por 1206, John já havia perdido a Normandia, Anjou, Maine e partes de Poitou. Essas perdas foram um danoso golpe ao seu prestígio, sofrendo a indignidade de receber o apelido de “John Sem Terras”, pelo qual ficou muito tempo conhecido; determinou-se a recuperá-lo a custa de muito dinheiro, tornando seu governo crescentemente inescrupuloso e eficiente na administração financeira; os impostos foram aumentados e ele reduziu os direitos feudais cada vez mais cruelmente, causando o crescente descontentamento dos seus barões. As negociações entre John e eles falharam e uma guerra civil irrompeu em maio de 1215. Quando os rebeldes tomaram Londres, John foi pressionado a ceder mais e, em 19 de junho, aceitou os termos dos barões, consubstanciados na “Carta Magna”, que limitava o poder real, assegurava os direitos feudais e restabelecia a lei inglesa. Foi o primeiro documento formal estabelecendo que o monarca devia obedecer à lei tanto quanto o seu povo e que os direitos dos indivíduos deveriam ser preservados mesmo se contra os desejos do soberano.
Na verdade, esse acordo logo tornou-se impraticável quando John alegou que ele havia sido assinado sob coação. O Papa Inocêncio ficou ao seu lado e na guerra civil que se seguiu John devastou os condados do norte e a fronteira escocesa. O príncipe Louis da França, a pedido dos barões, invadiu a Inglaterra. John persistiu vigorosamente na guerra, mas sua morte, em outubro de 1216, fez com que os barões reconsiderassem, permitissem um compromisso de paz com a reedição da Magna Carta e aceitassem a sua sucessão por seu filho Henry III. Os franceses se retiraram em 1217 após grave derrota em Lincoln e Sandwich e o pagamento de pesadas multas.

O REINADO DE HENRY III (1216 – 1272)

Rei Henry III
Henry, o filho do Rei John e Isabella de Angoulême, nasceu em 1o de outubro de 1207, em Winchester, e tinha 9 anos de idade quando seu pai morreu e ele tornou-se rei. O país foi administrado por várias regências até 1234 quando Henry III finalmente tomou posse.
Ele não era um rei militar e seus problemas já iniciaram em 1237, quando seus barões reclamaram da influência dos seus parentes da Savoia(1). O casamento arranjado entre a irmã de Henry, Eleanor of England, e o nobre inglês de modesta linhagem, Simon de Montfort, piorou as relações de Henry com seus líderes nobres. Em 1242 os meio-irmãos de Henry III o envolveram numa desastrosa aventura militar na França, o que motivou o Parlamento a exigir sangue novo no conselho que agisse como “conservadores das liberdades” e que revisse as finanças reais; entretanto, o rei soube explorar as diferenças entre os seus oponentes e pouco aconteceu. Finalmente, em 1258, um acordo mal feito com o Papa o ameaçou de excomunhão. Tudo isso junto, mais as derrotas no País de Gales e crises locais, conduziu à crise principal do seu reino. As “Provisões de Oxford”, de 1258, criaram um conselho privado de 15 membros, selecionado pelos barões, para aconselhar o rei e supervisionar toda a administração; o Parlamento deveria se reunir três vezes por ano e as moradias do rei e sua família deveriam ser também reformadas.
Gasconha entre França e Espanha
Ao final de 1259, sob os termos do “Tratado de Paris”, Henry III concordou em desistir das terras que seu pai John havia perdido ao norte da França. A Normandia, Anjou, Maine, Touraine e Poitou foram entregues para que pudesse manter o controle das ilhas do Canal da Mancha e da Gasconha(2); em troca, o rei Louis IX da França suspendeu seu apoio aos barões ingleses revoltosos.
O acordo começou a romper em 1260, quando as querelas entre o conde de Gloucester e o ambicioso Simon de Montfort tornavam inevitável uma guerra civil. Em maio de 1264 Simon de Montfort teve uma retumbante vitória na batalha de Lewes, capturou Henry III e seu filho mais velho Edward, estabelecendo um novo governo. No controle da Inglaterra, Monfort reuniu uma assembleia que incluía dois cavalheiros de cada condado e dois representantes eleitos por cada burgo – precursor da moderna democracia parlamentar. Em maio de 1265, o príncipe Edward escapou da prisão e convocou as forças reais, derrotando e matando Montfort, em Evesham, assim passando o controle do reino ao seu enfraquecido pai.
O resto do seu governo foi ocupado na solução dos problemas criados pela rebelião. Henry III confiscou as terras dos partidários de Monfort, mas os “deserdados” reagiram até um acordo realizado em 1266 para que os rebeldes comprassem de volta suas terras. Por 1270 o país estava suficientemente calmo para Edward partir em uma Cruzada. Henry III morreu em 16 de novembro de 1272 antes da volta de Edward e foi enterrado na Abadia de Westminster, que ele tinha reconstruído, em sua maior parte, em estilo gótico. Seu filho Edward foi coroado em agosto de 1274.

O REINADO DE EDWARD I (1272-1307)

Edward I "Longshanks"
Edward I, apelidado "Longshanks" (longas canelas) devido à sua grande estatura, foi talvez o monarca de maior sucesso dos medievais. Os primeiros anos do seu reino marcaram um alto ponto de cooperação entre a coroa e a comunidade. Nesses anos, Edward realizou grandes avanços na reforma do governo, na consolidação do território e na definição da política externa. Possuía a força que faltou ao seu pai e reafirmou a prerrogativa real. Foi pai de muitos filhos: dezesseis de Eleanor de Castille, até a sua morte em 1290, e mais três de Margaret.
Edward apegou-se ao conceito de comunidade e embora fosse, às vezes, inescrupulosamente agressivo, governou sempre com o bem estar dos seus súditos em mente. Ele entendeu a coroa como juiz do curso de ação adequado e principal legislador do reino; a autoridade era garantido por lei e deveria ser plenamente utilizada para o bem público, mas a mesma lei também garantia proteção aos súditos do rei.
Edward I expandiu a administração em quatro setores principais: a Chancelaria – para pesquisar e criar os documentos legais -, o Erário Público – para receber e emitir moeda, inspecionar as contas dos funcionários e manter os registros financeiros -, a Moradia – uma corte móvel de funcionários e conselheiros para viajar com o rei -, e o Conselho – formado pelos seus ministros principais, juízes e clérigos mais confiáveis, um seleto grupo de magnatas, que também seguiam o rei e tratava das matérias mais importantes do reino, agindo também como corte para os casos de importância nacional. 
Em uma atmosfera de crescente antissemitismo, Edward I voltou-se contra os judeus, proibindo-os, em 1275, de realizar empréstimos a juros, sem meio de vida primário. Em 1278 ele aprisionou e sequestrou, sob pedido de resgate, 3.000 judeus; tais resgates foram pagos, mas em 1290 publicou um édito pelo qual expulsava todos os judeus da Inglaterra.
As medidas de Edward no refinamento da lei e da justiça tiveram importantes consequências na redução da prática feudal. O Estatuto de Gloucester (1278) refreou a expansão de grandes fazendas privadas e estabeleceu o princípio de que todas as concessões privadas fossem delegadas pela e subordinadas à Coroa. A jurisdição real tornou-se suprema: o erário público desenvolveu uma corte para as disputas financeiras, a Corte dos Apelos Comum surgiu para ouvir disputas de propriedades e a Corte de Justiça do Rei dedicou-se a casos criminais em que o rei tivesse um interesse conferido. Outros estatutos proibiam os vassalos de dar suas terras à Igreja, encorajavam a primogenitura e estabeleciam o rei como a única pessoa que poderia tornar um homem seu vassalo feudal. Em síntese, Edward preparou o cenário para tornar a terra um artigo de comércio.
Edward concentrou-se numa agressiva política externa. Em 1277 iniciou uma campanha contra o País de Gales que só encerrou em 1282 com a morte de Llywelyn ap Gruffydd, último príncipe do país independente. O País de Gales foi dividido em distritos, a lei civil inglesa foi introduzida e a região foi administrada por magistrados designados. Como os monarcas anteriores, Edward construiu muitos castelos para proteger sua vitória. Em 1301, o primogênito do rei foi nomeado Príncipe de Gales, um título que ainda perdura para todos os herdeiros mais velhos da coroa.
Na Irlanda, Edward teve sucesso limitado ao tentar estender a influência inglesa: introduziu um parlamento em Dublin e aumentou o comércio com pequenas cidades costeiras, mas a maioria do país era controlado por barões independentes ou chefes de tribos celtas. Manteve seus domínios na França pela diplomacia, mas foi forçado à Guerra pelas incursões de Philip IV na Gasconha; negociou uma paz em 1303 e manteve as áreas que a Inglaterra possuía antes da guerra.
Em 1292, uma disputada sucessão ao trono escocês, após a morte do rei Alexander III, permitiu a Edward I forçar os escoceses a aceitar sua soberania como “lorde supremo” da Escócia, nomeando John Baliol como rei, que lhe prestou reverência como seu lorde. Entretanto, os escoceses resistiram às exigências de Edward para o serviço militar e, em 1295 pediram ajuda aos franceses, primeira evidência documentada da “Velha Aliança”. Em 1296 Edward invadiu a Escócia e derrotou fragorosamente os escoceses sob Baliol, forçado a abdicar, e os barões escoceses reverenciaram Edward como seu rei.
Estátua deWilliam Wallace
no Castelo de Edinburgh
William Wallace (magistralmente interpretado por Mel Gibson no filme Braveheart – “Coração Valente”) incitou uma rebelião em 1297, derrotou o exército inglês em Stirling e fustigou os condados do norte da Inglaterra. No ano seguinte, Edward derrotou Wallace, na batalha de Falkirk, mas enfrentou pertinaz resistência até a captura e execução de Wallace, em 1304. Em 1306, Robert Bruce, neto de um reclamante ao trono em 1290, instigou nova rebelião desafiando Edward I, que morreu no caminho do norte para reafirmar a sua autoridade, sendo substituído, no poder, por seu filho Edward II. As campanhas de Edward na Escócia foram cruéis, provocando nos escoceses um ódio contra a Inglaterra que perduraria por gerações.
Os esforços de Edward para financiar suas guerras na França e Escócia, extenuaram as suas relações com a nobreza, ao instituir impostos sobre a renda e propriedade pessoal. Os encontros do Grande Conselho do Rei, agora referidos como Parlamento, intermitentemente incluíam membros da classe média e começaram a reduzir a autoridade real. O Parlamento reafirmou a Magna Carta e o Título da Floresta em 1297, 1299, 1300, e 1301, concluindo que nenhum imposto deveria ser arrecadado sem o consentimento do reino como um todo (como representado pelo Parlamento).

O REINADO DE EDWARD II – (1307-1327)

Edward II não possuía a dignidade de seu pai e falhou miseravelmente como rei, mais interessado em diversões do que na arte da guerra e dependente de seus favoritos. Casou com Isabella, filha do rei francês, dois anos após ascender ao trono.
Edward II da Inglaterra
Tendo herdado de seu pai a guerra com os escoceses, desde cedo demonstrou sua inépcia como soldado. Barões descontentes, sempre precavidos de Edward como Príncipe de Gales, procuraram sondar o seu poder desde o início de seu reinado. Excitou a ira da nobreza por desperdiçar os recursos da coroa com seus favoritos, criando uma impopularidade que acabaria por custar-lhe a vida.
O sonho de Edward I, de uma nação britânica unificada, desintegrou-se sob seu fraco filho. Uma rebelião dos barões abriu o caminho para Robert Bruce reconquistar grande parte da Escócia. Em 1314 Bruce derrotou as forças inglesas na Batalha de Bannockburn, sendo coroado rei da Escócia e garantindo a independência escocesa até a união da Inglaterra com a Escócia em 1707.
As preferências de Edward II por rodear-se de estrangeiros, reportavam-se ao conturbado reino de Henry III. O mais notável destes foi Piers Gaveston, um jovem gascão exilado por seu pai, por sua indevida influência sobre o então Príncipe de Gales e, muito provavelmente, amante do rei. O arrogante e devasso Gaveston exerceu considerável poder após ser chamado de volta por Edward II. Os magnatas, indispostos por tal relação, uniram-se em oposição atrás do primo do Rei, Thomas, Conde de Lancaster, conseguindo impor, através dos Parlamentos de 1310 e 1311, restrições ao poder de Edward e o exílio de Gaveston. Em 1312 os barões revoltaram-se e Gaveston foi assassinado, evitando-se uma rebelião completa apenas porque Edward aceitou restrições adicionais. Embora Lancaster tenha repartido as responsabilidades do governo com Edward, o rei caiu sob a influência de outro vil favorito, Hugh Dispenser. Em 1322 Edward, mostrando uma rara disposição para ação, reuniu um exército e, na batalha de Boroughbridge, venceu e executou Lancaster. Com Dispenser, Edward conduziu o governo, mas criaram novos inimigos, quando 28 cavalheiros e barões foram executados por rebelião e outros exilados.
Aqui faz-se necessário um parênteses para lembrar que, por esta época, a fome eclodiu na Europa como produto de um clima mais frio e úmido, combinado com a medieval inabilidade em efetivamente secar e armazenar grãos. Invernos mais frios e verões mais úmidos severamente afetaram a colheita, causando a morte, pela fome, de milhões; o canibalismo foi amplamente divulgado, da Polônia à Irlanda, e muitos morreram esmagados nas filas de pão de Londres.
Entrementes, Edward enviou sua rainha, Isabella, para negociar com seu irmão, o rei francês Charles IV, os problemas da Gasconha. Ela caiu em um aberto romance com Roger Mortimer, um dos barões desafetos de Edward, persuadindo-o a enviar seu jovem filho para a França. O par revoltoso invadiu a Inglaterra em 1326, tomou o trono em nome de Edward III, então com 14 anos e aprisionou Edward, seu pai. O rei foi deposto em 1327 e assassinado em setembro, no castelo de Berkeley.


(1) A Savoia é uma histórica região e, antes, ducado do sudeste da França, oeste da Suíça e noroeste da Itália.
(2) A Gasconha era um principado ao sudoeste da França, até 1063. Nessa época, ela desapareceu como entidade política quando o Conde de Gasconha, Bernard II Tumapaler, foi obrigado a abandonar a Gasconha para a Aquitaine, após a sua derrota para o conde da Aquitaine William VIII, na batalha de La Castelle. Após o tratado de Paris, de 1259, o ducado da Aquitaine tomou o nome de ducado da Guyenne, um termo que designava o conjunto das possessões francesas do rei da Inglaterra. A Gasconha era também a terra de Charles Ogier de Batz de Castelmore, Conde d'Artagnan (1611 – 1673) que serviu Louis XIV como capitão dos Mosquiteiros da Guarda e morreu no cerco de Maastricht na guerra França – Holanda, que inspirou o personagem d’Artagnan, de Alexandre Dumas nos “Três Mosquiteiros”. Ela é também o lar do herói da peça “Cyrano de Bergerac”, embora esse personagem tenha pouco a ver com o Cyrano real, que era parisiense.

PROSSEGUE NA PARTE 5

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