Homenagem ao lendário herói ancestral dos ingleses que deu título a um dos considerados "Cem Maiores Livros do Mundo" e tido como o mais antigo escrito em "Old English".

quarta-feira, 1 de julho de 2015

AS TRÊS PRIMEIRAS GRANDES CIVILIZAÇÕES MUNDIAIS: VALE DO INDO OU HARAPPIANA (PARTE 04 -FINAL)

VI – COLAPSO E HARAPPIANA FINAL

Em torno de 1800 AC, sinais de um declínio gradual começaram a surgir e cerca de 1700 AC, a maioria das cidades foi abandonada. A escrita começou a desaparecer, pesos e medidas padronizadas, usadas no comércio e para fins de taxação caíram em desuso e a conexão com o Oriente Médio foi interrompida. As razões para tal declínio não são totalmente claras.
Localização das Montanhas Hindu Kush, entrada dos "arianos"
Em 1953 surgiu a teoria de que o declínio da CVI fora causado pela invasão de uma tribo Indo-Europeia da Ásia Central, os “arianos”, criadores de gado, iniciada cerca de 1500 AC. Os arianos teriam atravessado as montanhas Hindu Kush – cadeia de montanhas do Paquistão com 800 km de comprimento entre o Afeganistão Central e o norte do Paquistão - e entrado em contato com a civilização do Vale do Indo, numa grande migração, vista como uma invasão, razão maior para o seu colapso. Como evidência, foi citado um grupo de 37 esqueletos encontrados em várias partes de Mohenjo-Daro, e passagens nos Vedas que fazem referência a batalhas e fortes. Contudo, estudiosos logo começaram a rejeitar tal teoria, já que os esqueletos pertenciam a um período posterior ao abandono das cidades e nenhum foi achado próximo da cidadela. Além disso, as marcas nos crânios foram causadas por erosão e não por agressão violenta.
Uma mudança climática pode ter causado um declínio da CVI, também indicado para as áreas vizinhas do Oriente Médio. O clima do vale do Indo esfriou e secou significativamente a partir de 1800 AC, por um enfraquecimento geral das monções àquela época. Alternativamente, um fator crucial pode ter sido o desaparecimento de porções substanciais do sistema fluvial do rio Ghaggar Hakra. Um evento tectônico pode também ter desviado as fontes do sistema para a Planície do Ganges, embora a total incerteza quanto à data desse acontecimento, pois a maioria dos povoamentos nos leitos do rio Ghaggar Hakra não foi ainda datada. Hoje a maioria dos estudiosos acredita que o colapso da CVI foi causada pela seca e declínio do comércio com o Egito e a Mesopotâmia, bem como pela migração de outros povos, desmatamento, cheias e alterações no curso do rio. Finalmente, a última razão para o declínio da Civilização do Vale do Indo pode ter sido uma combinação de todos os fatores antes apontados.
Qualquer que tenha sido a razão, a CVI chegou a um fim. Durante vários séculos os arianos gradualmente se estabeleceram e implantaram a agricultura. Sua linguagem ganhou a supremacia sobre as línguas locais. A origem das línguas mais faladas hoje, no sul da Ásia, retroage aos arianos, que introduziram as línguas Indo-Europeia no subcontinente indiano. Outras características da moderna sociedade indiana, como práticas religiosas e divisão em castas, podem ser rastreadas até o tempo das migrações arianas e ainda antes delas.
Anteriormente, acreditava-se que o declínio da Civilização Harappiana tivesse conduzido a uma interrupção na vida urbana do subcontinente indiano. Contudo, a CVI não desapareceu subitamente e muitos dos seus elementos podem ser encontrados em culturas posteriores, como por exemplo, pelo menos parte da religião védica.
Dados arqueológicos atuais sugerem que a cultura classificada como Harappiana Final pode ter persistido até pelo menos 1000 a 900 AC e foi parcialmente contemporânea com a cultura da “Cerâmica Pintada Cinza”. Arqueólogos de Harvard apontam para Pirak, povoamento do “Harappiano Final”, que floresceu continuamente, de 1800 AC até a invasão de Alexandre, o Grande, em 325 AC. Recentes escavações arqueológicas indicam que o declínio de Harappa impeliu o povo para leste. Após 1900 AC, o número de locais investigados na Índia cresceu de 211 para 853. Escavações na Planície do Ganges mostram que os aglomerados urbanos começaram cerca de 1200 AC, somente poucos séculos após o declínio de Harappa e muito antes do que previamente esperado. Os arqueólogos têm enfatizado que, como na maioria das áreas mundiais, houve uma série de desenvolvimentos culturais, que ligam as duas maiores fases de urbanização do sul da Ásia.
Como consequência do colapso da Civilização do Indo, culturas regionais emergiram, em graus variáveis, mostrando a influência daquela civilização. Na antiga grande cidade de Harappa, foram encontrados sepultamentos que correspondem a uma cultura regional chamada “Cemitério H”. Ao mesmo tempo, a “Cultura da Cerâmica Pintada Ocre” expandiu-se de Rajasthan para a Planície do Ganges.

VII – A CIVILIZAÇÃO DO VALE DO INDO NO CONTEXTO MUNDIAL

A CVI tem sido às vezes identificada com a toponímia Meluhha, conhecida dos registros sumérios, que chamavam seus habitantes de meluhhaitas. Ela tem sido comparada, em particular, com as civilizações do Elam e com a Creta Minoana, por paralelos culturais isolados. A fase Harappiana Madura da CVI é contemporânea à Idade do Bronze Média no antigo Oriente Próximo, em particular com o período Elamita Antigo, o Dinástico Inicial ao Ur III da Mesopotâmia, o pré-palaciano da Creta Minoana e do Antigo Reino ao Primeiro Período Intermediário do Egito.
Após a descoberta da CVI, na década de 1920, ela foi imediatamente associada aos indígenas de Dasyu, inimigos das tribos Rigvédicas, mencionadas nos numerosos hinos do Rigveda[1]. A presença de muitos corpos não enterrados encontrados nas montanhas de Mohenjo-Daro, foi interpretada como de vítimas de uma guerra de conquista. A associação da CVI com a cidade de Dasyus permanece tentadora porque o arcabouço temporal admitido da primeira migração Indo-Ariana na Índia corresponde claramente ao período de declínio da CVI, do registro arqueológico. A descoberta da avançada e urbana CVI, contudo, alterou a visão do século XIX, de uma migração Indo-Ariana primitiva como uma invasão de uma cultura avançada às custas de uma população aborígene primitiva, para uma aculturação gradual de bárbaros nômades sobre uma avançada civilização urbana, comparável às migrações germânicas após a queda de Roma. Essa mudança de cenários simplistas de invasões, paralela desenvolvimentos similares quando se fala de transferência de linguagem e movimento de população em geral, como no caso da migração dos primeiros falantes gregos para a Grécia, ou a Indo-Europeização da Europa Ocidental.

VIII – CONCLUSÕES E DÚVIDAS

Como já dissemos e repetimos, muitas dúvidas pairam sobre a Civilização do Vale do Indo, a maior delas, certamente, referindo-se ao relativamente rápido colapso de civilização tão importante.
Por que esta civilização, considerado seu alto grau de sofisticação, não se espalhou além do Vale do Indo? Em geral, a área onde as cidades do Vale do Indo se desenvolveram, era árida e as pessoas podem conjeturar sobre as razões que motivaram um desenvolvimento urbano ao longo de um rio que escoava através de um virtual deserto. Os povos da área não desenvolveram a agricultura de larga escala e, consequentemente, não tiveram necessidade de desmatar grandes áreas de florestas. Nem possuíam tecnologia para tanto, visto que estavam restritos ao uso de implementos de pedra ou bronze.
Um outro ponto de debate repousa sobre a natureza das relações entre as cidades mais importantes. Não se sabe ainda se elas eram cidades-estados independentes ou parte de um reino maior. Houve alguma vez um Império Indo? Um império é um grande país ou grupo de países, com povos diferentes, governados por um rei ou imperador. A Civilização do Indo era enorme, mas não sabemos se ela tinha reis e nada parece ter mudado muito por centenas de anos. Novas casas eram construídas sobre as antigas e os planos urbanos das cidades permaneciam inalterados, com a vida prosseguindo por gerações. Isso podia significar que os governantes Indo controlavam tudo ou apenas que as pessoas eram felizes do jeito que a vida fluía. O que parece ser uma coroa, foi encontrada em um local chamado Kunal. Será que essa coroa pertencia a um rei Indo? Será que cada cidade teria o seu próprio rei?
As cidades do Vale do Indo possuíam fortes muralhas, possivelmente para manter afastados os seus inimigos. Como castelos, possuíam torres e pesados portões, mas não há indícios de que tenham possuído soldados. Funcionários da cidade podiam fiscalizar comerciantes entrando e saindo e talvez houvesse também guardas, em caso de problemas mais sérios. Outras civilizações antigas, como o Egito, possuíam grandes exércitos que os reis usavam para travar batalhas contra os seus inimigos. Os povos do Indo, entretanto, parecem ter vivido em paz pela maior parte da sua história.
"Swastika" antiga, sinal de bondade
Apenas a título de curiosidade, gostaríamos de fazer menção à famosa cruz suástica que todos tão bem conhecem. Essa cruz de dois braços curvados em ângulos retos, ou no sentido horário ou anti-horário, na cor negra tornou-se, no século XX, o odiado símbolo nazista da Alemanha de Hitler. Entretanto, a suástica (swastika) é, de fato, um antigo símbolo de bondade e aparece em selos encontrados nas cidades do Vale do Indo. O nome “swastika” vem de uma antiga língua, chamada “Sânscrito”, e significa “bem para ser”. Era um sinal de boa sorte para os hindus e para o Budismo significa “renascimento”. Antigas cruzes suásticas têm sido encontradas na arquitetura hindu, moedas da Mesopotâmia, nas ruínas da cidade de Troia (Turquia) e em outras culturas da Ásia, Europa e até mesmo na América Nativa.
Mais significativamente, sob que circunstâncias as cidades do Vale do Indo entraram em declínio? Os primeiros ataques em povoamentos mais afastados, pelos arianos, parecem ter ocorrido cerca de 2000 AC, próximo de Baluchistan e, entre as cidades mais importantes, pelo menos Harappa foi, muito provavelmente, destruída pelos arianos. No “Rigveda” há menção de um deus da guerra védico, Indra, destruindo alguns fortes e cidadelas, que podem ter incluído Harappa e algumas outras cidades do Vale do Indo. Falou-se, também, de uma calamidade cataclísmica que teria atingido a CVI, cerca de 1600 AC, mas isso não explica porque povoamentos localizados várias centenas de quilômetros, uns dos outros, foram totalmente erradicados.
O grande presente do povo do Vale do Indo ao mundo, foi a demonstração de como viver pacificamente em cidades. Seu modo de vida foi baseado no comércio, sem a figura do dinheiro. Com poucos inimigos, não possuíam grandes exércitos. Certamente nem todos eram ricos, mas mesmo os pobres possuíam o suficiente para comer. Em suas cidades limpas e bem planejadas, o povo da CVI usufruiu de coisas tão belas quanto úteis, construindo igualmente brinquedos, joias e sistemas de drenagem.
Cerca de 1500 AC a Civilização do Vale do Indo havia terminado. Os agricultores continuaram a viver em suas vilas, mas as cidades acabaram em ruínas. Com o tempo, mesmo os tijolos de argila foram carregados pelos ventos, chuvas e enchentes. Ela durou mais de mil anos e manteve o seu auge durante 500 a 700 anos.

[1] Conforme vimos antes, o Rigveda é um dos quatro textos sagrados canônicos do Vedas. É um dos mais antigos textos existentes em qualquer língua indo-europeia, compostos na região noroeste do subcontinente indiano, mais provavelmente entre 1500 e 1200 AC. O Rigveda contém várias descrições poéticas e mitológicas da origem do mundo, hinos louvando aos deuses, e orações antigas para a vida, prosperidade etc...

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