Homenagem ao lendário herói ancestral dos ingleses que deu título a um dos considerados "Cem Maiores Livros do Mundo" e tido como o mais antigo escrito em "Old English".

terça-feira, 23 de fevereiro de 2010

BREVE HISTÓRIA DAS ORIGENS DE PORTUGAL - PARTE I

Pois, de repente, enquanto eu realizava uma pesquisa para descobrir as origens do nome da minha família paterna, Azambuja, sabendo que nascera em Portugal, comecei a meditar sobre as origens do país que acabou descobrindo este nosso Brasil. O que mais aguçava a minha curiosidade era conhecer as razões pelas quais Portugal e Espanha, repartindo a antiga Península Ibérica e falando línguas tão semelhantes, não constituíam um só país. Espero que esse artigo possa ajudar os leitores a entender as razões que fizeram de Portugal o que ele é hoje, principalmente no que se refere ao seu espaço físico, língua e etnia. Para que se tenha o quadro completo, a figura que segue mostra, à esquerda, a Península Ibérica nos dias atuais, com a localização de Portugal e Espanha, no contexto da Europa e limitando-se com a África, através do Estrito de Gibraltar. 
Dada a extensão do artigo, que foi de todas as formas reduzido, sem prejudicar a essência do que pretende o autor esclarecer, faremos a sua publicação em  três capítulos, dos quais este é o primeiro. Mas vamos à história.

BEM NO INÍCIO
Pensa-se que a Península Ibérica foi habitada, primordialmente, por povos autóctones – oriundo da própria terra onde se encontra, sem resultar de imigração ou importação - que vieram a ser conhecidos como Iberos. Entre eles estão os Tartessos, considerados pelos gregos como a primeira civilização do Ocidente.
Cerca de 1.000 AC, mas provavelmente ainda antes, a região passou a ser habitada por povos Indo-Europeus, de origem Celta que coexistiram com os povos Iberos, habitando regiões distintas da Península Ibérica. Na zona Leste da meseta Central, os povos Celtas mesclaram-se com os povos Iberos dando origem aos Celtiberos, que não se devem confundir com os Celtas Ibéricos (Celtas da Península Ibérica) que em Inglês se denominam de Celtiberians. Em vista disso, vários povos habitavam a Península Ibérica, divididos em três ramos étnico-culturais primordiais: Os Celtas Indo-Europeus, os Iberos de origem desconhecida e os Celtiberos que viviam na Meseta Central. Influências mínimas exerceram os Gregos e os Fenícios-Cartagineses com as suas pequenas colônias-feitorias comerciais costeiras semi-permanentes de grande importância estratégica. Estes últimos dois povos não contribuiram virtualmente para a ascendência dos povos da Península.

ROMANIZAÇÃO
Cartago é uma antiga cidade, originariamente uma colônia fenícia no norte da África, situada a leste do lago de Túnis, perto do centro de Túnis, na Tunísia. A figura ao lado mostra um mapa do Mar Mediterrâneo Ocidental, no ano 279 AC, indicando as posições relativas de Roma, Cartago (Cartagine) no Norte da África e da Ilha da Sicília (Siracusa), bem como da Península Ibérica.
Fundada por colonizadores fenícios de Tiro, que a substituiu no ocidente, foi uma potência na Antigüidade, disputando com Roma o controle do mar Mediterrâneo. Dessa disputa originaram-se as três Guerras Púnicas, após as quais Cartago foi destruída. A antiga capital púnica é hoje um bairro de Túnis e uma estação arqueológica e turística importante, tendo sido classificado patrimônio mundial pela UNESCO em 1979 (abaixo, ruínas de Cartago).
Entre os séculos V e III AC Cartago envolveu-se em freqüentes hostilidades com a Grécia e a Sicília. Foi nesta última que Cartago teve seu primeiro choque com Roma. A meio caminho entre estas duas antigas cidades e capitais de império encontra-se a Sicília. O controle desta ilha foi determinante no decorrer das Guerras Púnicas porque a Sicília era o "celeiro" do mundo antigo.
A invasão romana da península Ibérica iniciou-se no contexto da Segunda Guerra Púnica (218 AC-201 AC), quando as legiões romanas, sob o comando do cônsul Cneio Cornélio Cipião, para ali se movimentaram taticamente, a fim de atacar pela retaguarda os domínios de Cartago na região. De facto, a influência cartaginesa na península Ibérica permitia um expressivo reforço, tanto de suprimentos quanto de homens, a Cartago. A estratégia do Senado Romano visava, desse modo, enfraquecer as forças cartaginesas, afastando os seus exércitos da Península Itálica.
Vários combates cruentos foram travados entre Roma e Cartago, com altos e baixos até o ano de 205 AC quando, apesar de todos os seus esforços, Aníbal foi obrigado a pedir paz aos romanos comandados por Cipião, o Africano e Roma tornou-se a senhora de todo o sul da Hispânia, dos Pirineus a Algarve, na costa e, no interior, de Huesca ao sul até o rio Ebro; a partir daí iniciou-se a administração romana da península, inicialmente com o caráter de ocupação militar, com o fim de manutenção da ordem e de exploração dos recursos naturais das regiões ocupadas, doravante integradas ao território controlado pela República.
Ao final da Terceira Guerra Púnica, Cartago foi finalmente destruída por Cipião Emiliano, em 146 AC, sendo arrasada até os seus alicerces e seu solo salgado para que nele nada mais crescesse, tal o ódio que se havia criado entre as duas nações.

A RESISTÊNCIA
A derrota dos cartagineses, entretanto, não garantiu a ocupação pacífica da península, pelos romanos. A partir de 194 AC, registraram-se choques com tribos de nativos, denominados genericamente como Lusitanos, conflitos que se estenderam até 138 a.C., denominados por alguns autores como guerra lusitana. A disputa foi mais acesa pelos territórios mais prósperos, especialmente na região da atual Andaluzia.
Ao se iniciar a fase imperial romana, a pacificação de Augusto também se fez sentir na península Ibérica: a partir de 19 AC, as suas legiões ocuparam a região norte peninsular, mais inóspita. Com esta ocupação, asseguravam-se as fronteiras naturais e pacificava-se essa região mais atrasada, de modo a que não constituísse ameaça para as populações do vale do rio Ebro e da chamada Meseta, já em plena fase de Romanização.
Na península Ibérica a Romanização ocorreu concomitantemente com a conquista, tendo progredido desde a costa mediterrânica até ao interior e à costa do Oceano Atlântico. Para esse processo de aculturação foram determinantes a expansão do latim e a fundação de inúmeras cidades, tendo como agentes, em princípio, os legionários e os comerciantes.
Os primeiros, ao se miscigenarem com as populações nativas, constituíam famílias, fixando os seus usos e costumes, ao passo que os segundos iam condicionando a vida econômica, em termos de produção e consumo. Embora não se tenha constituído uma sociedade homogênea na península, durante os seis séculos de romanização registraram-se momentos de desenvolvimento mais ou menos acentuado, atenuando, sem dúvida, as diferenças étnicas do primitivo povoamento.
A língua latina acabou por se impor como língua oficial, funcionando como factor de ligação e de comunicação entre os vários povos. As povoações, até aí predominantemente nas montanhas, passaram a surgir nos vales ou planícies, habitando casas de tijolo cobertas com telhas. Como exemplo de cidades que surgiram com os Romanos, temos Braga (Bracara Augusta), Beja (Pax Julia), Conímbriga e Chaves (Aquae Flaviae).
A indústria desenvolveu-se, sobretudo a olaria, as minas, a tecelagem, as pedreiras, o que ajudou a desenvolver também o comércio, surgindo feiras e mercados, com a circulação da moeda e apoiado numa extensa rede viária (as famosas "calçadas romanas", de que ainda há muitos vestígios no presente) que ligava os principais centros de todo o Império. A influência romana fez-se sentir também na religião e nas manifestações artísticas. Tratou-se, pois, de uma influência profunda, sobretudo a sul, zona primeiramente conquistada. Finalizado o processo de conquista, a província foi integrada ao Império, dividida em três partes, administrativamente:
  • Tarraconense, ao norte e nordeste, até os Pirineus;
  • Bética, ao sul; e
  • Lusitânia, com capital em Emerita Augusta (atual Mérida), que se estendia entre os rios Douro e Guadiana.
Nesse artigo, descreveremos apenas a região da Lusitânia, pois que foi dela que, no que se refere à etnia e geograficamente, originou-se o povo e o país de Portugal. Entretanto, é bom que se frise, ao longo da história da Península Ibérica muitas novas e diferentes divisões ainda ocorrerriam antes da completa definição dos países que hoje a compõem.

A LUSITÂNIA
Lusitânia (em latim Lusitania) é o nome dado, na Antiguidade, ao território onde viveram os lusitanos. O nome passou a designar, após a conquista romana, uma província da Hispânia Ulterior.
O historiador e geógrafo grego Estrabão (entre 63 AC e 24 DC) descreveu a Lusitânia pré-romana, numa primeira análise, como indo desde o Tejo à costa cantábrica, tendo a Ocidente o Atlântico e a Oriente as terras de tribos célticas. Quando em 29 AC foi criada por Augusto a província Lusitânia, o limite ao norte passou a ser o rio Douro e ao sul ultrapassou o Tejo, anexando a Extremadura espanhola, Alentejo e Algarve; e a oriente ocupou parte das terras dos célticos.
Apesar de as fronteiras da Lusitânia não coincidirem perfeitamente com as de Portugal de hoje, os povos que aqui habitaram são uma das bases etnológicas dos portugueses do centro e sul e também dos extremenhos da Extremadura espanhola.
Muitos dos povos antigos que entraram na Península Ibérica deixaram no território da Lusitânia vestígios bem marcados dos contactos comerciais e de influência cultural. Nomeadamente e perfeitamente acentuados e reveladores de uma assimilação mais profunda, são os vestígios da ocupação romana e também os das invasões dos visigodos e dos árabes.
Viriato foi o grande líder lusitano que conseguiu conter a expansão romana durante alguns anos, fazendo com que fosse dos últimos territórios a resistir à ocupação romana da Península Ibérica. Não obstante, seria morto à traição (140 AC) por três companheiros de armas comprados pelos romanos. A partir daí, a romanização do território que viria a ser português prosseguiu sem maiores dificuldades para Roma.
Os Romanos deixaram um importante legado cultural naquilo que é hoje Portugal, nos costumes, na arte, na arquitetura, na rede viária e nas pontes, algumas das quais servem até aos nossos dias, como a de Trajano sobre o rio Tâmega em Chaves (Aquae Flaviae) ou a de Vila Formosa (Alter do Chão). Uma variante do Latim (Latim Vulgar) passou a ser o idioma dominante da região. Surgiram novas cidades e desenvolveram-se outras, segundo o modelo habitual de colonização romana. Em 74 DC o imperador Vespasiano concedeu o "direito latino" (equiparação aos municípios da Itália) a grande parte dos municípios da Lusitânia, datando dessa época um importante surto urbano. Difundiu-se também a cidadania romana, que viria a ser atribuída a todos os súditos (livres) do império pela chamada Constituição Antoniniana, ou édito de Caracala (212 DC). Durante o Império Romano o Cristianismo difundiu-se em toda a Hispânia, pelo menos a partir do século III.

5 comentários:

Gilda Souto disse...

Vamos por parte.Cartago disputava com Roma o controle do Mar Mediterrâneo.Tres guerras e Cartago foi derrotada, logo, ao desenrolar das conquistas até toda a península Ibérica ser de posse do Império Romanos.Entendi que a destruição de Cartago se deu depois da tomada da Península Ibérica, esta tomada da Península promoveu a queda de Cartago.Com o tempo houve a divisão da península ,e foco na região Lusitânia,do Império Romano até 212DC .Isto eu não sabia...vamos a outra parte!

Nelson Azambuja disse...

Cartago foi destruída por Roma, no ano 146 AC, ao final da terceira Guerra Púnica. Com isso apenas se encerraram os problemas entre Roma e Cartago, mas não entre Roma e os habitantes da Península Ibérica, que nunca fora totalmente conquistada por Cartago e não seria por Roma. A Península Ibérica nunca foi toda dos romanos.
Não é a tomada da Península Ibérica, por Roma, que decreta a destruição de Cartago. Cartago era um império ao norte da costa Africana, onde hoje é Tunis, na Tunísia. Cartago é que foi destruída, arrasada por Roma sem que sobrasse pedra sobre pedra. Aí, Roma, já que estava por lá, na Península Ibérica, foi continuar a conquista daquele território. Conquista, naquela época, era algo diferente. Roma conquistava porque era forte, tinha poderio militar; mas não tinha gente para povoar todo o território, da mesma forma como não tinha para povoar todos os territórios que conquistou no mundo todo. O que significa que passou a sofrer, permanentemente, reação por parte dos povos originais. Apenas os romanos eram ótimos conquistadores: eles mantinham a cultura original e facilmente conseguiam a miscigenação com os povos locais. Por isso, a língua que acabou predominando foi o latim, falada pelos romanos e a religião, após o século III DC, foi o cristianismo, adotado por Roma.
Entretanto, o norte da Península, aquilo que chamavam de Reino das Astúrias, nunca foi conquistado por romanos nem por ninguém, porque era território que só se comunicava com o mar; estrategicamente, não era necessário conquistar porque outros povos também não conquistariam.
Posteriormente, ainda ao tempo dos romanos, os imperadores romanos trataram de fazer uma enorme pacificação, concedendo até mesmo a cidadania romana aos povos da Península Ibérica. Quer dizer, os romanos foram realmente derrotados pelas tribos germânicas (a famosa queda do Império Romano, início do Século V DC) - e não pelos habitantes da Península -, que passaram a lutar em todos os territórios onde havia romanos (Península Ibérica incluída).
A divisão da Península em regiões, sempre existiu, como em qualquer grande território. Mas começou a ter as suas próprias especificidades, mais ou menos acentuadas, com a reconquista dos territórios aos muçulmanos, sempre a partir do norte da Península Ibérica.
Espero ter esclarecido a tua dúvida, mas se não tiver sido claro, por favor, pode retornar quando quiser.

Gilda Souto disse...

Sim acertado meu entendimento.Também acertado que o reino das Astúrias, que seria dividido com a morte de AfonsoIII, ,foi onde começou a Reconquista ...e Portugal, separada do resto da península?

Nelson Azambuja disse...

Na verdade, a região física onde hoje é Portugal, só separou-se do resto da Península Ibérica, como nação independente, no ano de 1139 DC, com D. Afonso Henriques, depois Afonso I de Borgonha.
Até então a Península Ibérica era constituída por vários pequenos reinos, todos subordinados a um poder central que, numa certa época, pertenceu ao Rei das Astúrias (logo dividido em Galízia, Castela, Leon etc...), Afonso III, porque aquela foi a única região não tomada pelos mouros. Foi aí que surgiu Vímara Peres, enviado para a região estratégica de Portucale para expulsar os mouros, o que ele conseguiu em 868 DC, constituindo o Condado de Portucale, ainda subordinado ao poder central de Afonso III. A luta contra os mouros persistiu, sem lutas internas de independência. Apenas em 1139, em luta contra sua própria mãe e seus aliados, que dominavam o então Condado Portucalense (diferente do Condado de Portucale, mas praticamente a mesma região física), D. Afonso Henriques faz a independência da região e surge o País Portugal, independente de qualquer outro poder central da Península. A Reconquista da Península, entretanto, prosseguiu até 1492, mas daí em diante, como um país (Portugal), de um lado, e o resto da Península Ibérica (vários reinos até se consolidar como a nação Espanha), de outro. Portugal, como se sabe, foi, de todos os pequenos reinos existentes na Península Ibércia, o único que se transformou num país independente. Daí, a língua diferente dos demais e todo o resto.
Espero ter ajudado. Fique à vontade para novos questionamentos.

Gilda Souto disse...

Maravilha, conduziu meu entendimento. Realmente clareou com aquela explicação, e com esta conclui o que teria entendido.
Realmente fica mais enxuto se pergunto.Algumas palavras busquei na internet e foi bem prazeiroso...acho, que agora, estou de parabéns pois consegui ...dominar o passeio histórico do texto.Obrigado