Homenagem ao lendário herói ancestral dos ingleses que deu título a um dos considerados "Cem Maiores Livros do Mundo" e tido como o mais antigo escrito em "Old English".

segunda-feira, 9 de novembro de 2009

O FAMOSO RUBICÃO

Muitos, com certeza, lembrar-se-ão das suas aulas de História Geral do segundo grau, quando o professor emocionado, literalmente declamava a célebre frase de Júlio César, ao atravessar o rio Rubicão: “Alea Jacta Est!”. Estas foram três coisas que, de fato, pelo menos eu, nunca esqueci: Júlio César, a frase e o Rubicão. Mas o que eu não entendi, na época, foi o real significado do fato, a sua importância e também porque nunca mais se falou do Rubicão e nem ao menos mostrou-se a região por onde ele corria. Aliás, até aí, nenhuma novidade; na minha experiência pessoal, nunca os professores de história daquele tempo ensinavam as coisas que realmente importavam no estudo da História. Na mentalidade dos professores da época, apenas datas e nomes eram as coisas importantes; as origens dos fatos, suas causas e conseqüências eram raramente mencionadas. Entretanto, no caso em particular, há pelo menos duas grandes e boas razões para que o Rubicão fosse, posteriormente ao fato, tão desprezado, senão totalmente esquecido.



A pequena cidade que aparece no centro da primeira foto chama-se “Savignano sul Rubicone”. Na verdade, “Comune de Savignano sul Rubicone”, situada na região nordeste da Itália, próximo de San Marino, Rimini e Cesena. Savignano é uma Comuna (municipalidade) que faz parte da Província de Forli-Cesena, na região italiana de Emilia-Romagna, localizada a cerca de 90 km de Bolonha e 30 km a sudeste de Forli, às margens do Mar Adriático.



Um pouco a esquerda do centro da foto, dentro do pequeno retângulo, pode-se enxergar uma pequena ponte sobre um rio. A foto seguinte, ampliação da foto anterior, mostra com mais clareza a antiga ponte romana que justamente atravessa sobre o pequeno “fiume Rubicone”; seu curso encontra-se materializado e pode ser acompanhado, na foto seguinte, pela linha negra, até a sua foz no Mar Adriático, em Forli, próximo à cidade mais importante de Rimini. Suas nascentes, que não são vistas na foto, localizadas nos montes Apeninos, situam-se a cerca de 30 km da sua foz. A próxima foto mostra em detalhe a ponte romana e o Rio Rubicão na atualidade.


A cidade tomou o seu nome do Rubicão, rio que se tornou famoso pela histórica travessia de Júlio Cesar, quando retornava a Roma, vindo da Gália Cisalpina. Desde então, uma combinação de modificações naturais e criadas pelo homem fizeram com que o Rubicão alterasse o seu curso repetidas vezes. Por séculos, a exata localização do curso original ficou desconhecida. Em 1933, o Fiumicino, um rio que atravessa a cidade de Savignano Sul Rubicone, foi identificado como a mais provável localização do Rubicão original. Antes disso a região se chamava Savignano di Romagna.



À época de Júlio César, o rio era considerado como a materialização do limite sul da Província da Gallia Cisalpina ao norte, separando-a da Itália, propriamente dita, ao sul. O rio tornou-se notável uma vez que a lei romana proibia que o rio Rubicão fosse atravessado por qualquer legião do exército romano; dessa forma, a lei assim protegia a República de ameaça militar interna. Quando Júlio César atravessou o Rubicão com o seu exército em 49 AC, supostamente em 10 de janeiro do calendário romano, para prosseguir em seu caminha para Roma, ele quebrou a lei romana e armou um conflito inevitável. Nessa ocasião, segundo o historiador Suetonius, Júlio César teria lançado a famosa frase latina “alea jacta est”, significando: a sorte está lançada! De uma certa forma, foi a travessia deste rio, por Júlio César, com suas legiões, que precipitou uma guerra civil na República Romana, finalmente conduzindo ao estabelecimento do Império Romano.



A Gallia Cisalpina (Gallia deste lado dos Alpes, lado de Roma) era o nome romano dado a uma área geográfica (mais tarde uma província da República Romana) no território do norte da Itália dos dias modernos (incluindo a Emilia-Romagna, Friuli-Venezia Giulia, Liguria, Lombardia, Piedmont, Trentino-Alto Adige/ Sudtirol e Veneto), habitada pelos Celtas. Em oposição, encontrava-se a Gallia Transalpina, região correspondente, do outro lado dos Alpes (sempre com relação a Roma). A província da Gallia Cisalpina foi anexada à Itália no ano 42 AC, como parte do programa de “italização” de Otávio (Imperador Augustus) durante o Segundo Triunvirato. A partir desse momento desapareceu a importância do Rubicão como acidente geográfico, pois deixava de representar a linha de fronteira do extremo norte da Itália. A decisão de Augustus fez com que o Rubicão perdesse muito de sua importância e, enquanto as memórias desvaneciam, o nome “Rubicão” gradualmente desapareceu da toponímia local.



Para completo azar do Rubicão, após a queda do Império Romano e durante os primeiros séculos da Idade Média, a planície costeira entre Ravenna e Rimini foi inundada várias vezes e durante esses períodos, como é natural ocorrer, este e vários outros pequenos rios da região tiveram seus cursos alterados. Por esta razão e também para possibilitar a regularização dos cursos d’água e a irrigação dos campos ribeirinhos, com o renascimento da agricultura após a Idade Média, durante os séculos XIV e XV, várias obras hidráulicas foram implantadas; o resultado final foi, muitas vezes, a completa retificação dos rios, como ainda hoje é feito com freqüência. Com o passar dos séculos, vários rios da costa italiana do Adriático entre Ravenna e Rimini foram considerados como sendo o antigo Rubicão. Em 1933, após vários séculos de esforços, como já mencionado, o rio chamado Fiumicino (por acaso, “pequeno rio” em italiano), que atravessava a cidade de Savignano di Romagna (atualmente Savignano Sul Rubicone), foi oficialmente identificado como o Rubicão original.



Hoje, muito pouca evidência existe da passagem histórica de César. Savignano Sul Rubicone é uma cidade industrial e o rio tornou-se um dos mais poluídos da região de Emilia-Romagna. A intensa exploração das águas subterrâneas no curso superior do Rubicão, junto com o natural esgotamento de suas nascentes, tem reduzido consideravelmente suas descargas. E o velho Rubicão acabou perdendo, além da sua fama, o seu próprio curso natural, a não ser em seu curso superior entre colinas baixas, ainda vegetadas e agora tristes. A foto ao lado mostra a foz do rio Rubicão, no Mar Adriático.


Hoje, a sua antiga fama permanece apenas na consagrada frase “Atravessar o Rubicão”, uma expressão popular consagrada com o significado de ultrapassar o ponto sem retorno, referindo-se à travessia do rio por Júlio César no ano 49 AC, considerada na época um ato de guerra.

3 comentários:

Gilda Souto disse...

Maravihoso!!!!!!!!!!!!!!!

Nelson Azambuja disse...

Obrigadinho pela bondade. Feliz que gostaste.

professor josemberg carvalho disse...

Ótimo texto. Uma verdadeira aula de história.